Uma CPI aberta pelos vereadores de Garopaba, no Litoral Sul de Santa Catarina, investiga o suposto desaparecimento de 1.489 cestas básicas da prefeitura às vésperas das eleições de 2022. A gestão municipal também conduz, já desde o ano passado, um procedimento administrativo próprio para apurar o sumiço, que é ainda acompanhado por dois inquéritos civis do Ministério Público estadual (MPSC).

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As suspeitas sobre o caso tiveram início em agosto do ano passado, quando moradores carentes cadastrados pela Secretaria de Assistência Social do município como beneficiários das cestas básicas passaram a relatar a falta delas, o que se seguiu até outubro daquele ano.

Naquele mesmo mês, a Controladoria-Geral do município, sob administração direta do prefeito Junior Abreu (PP), realizou uma auditoria para, a princípio, identificar possíveis falhas na informatização de dados da secretaria e, se necessário, propor melhorias.

A partir disso, o órgão percebeu que o programa de fornecimento de cestas básicas tinha “uma grande falha quanto aos procedimentos e armazenamento de informações”, conforme registra em ofício, quando decidiu aprofundar a investigação.

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A Controladoria-Geral concluiu então que, de maio a outubro de 2022, a secretaria comprou 2.928 cestas básicas da empresa Elo Comércio e Serviços, ao custo de R$ 282.934,00, mas só existe comprovação de ter distribuído 1.439 delas para as famílias carentes beneficiárias.

As outras 1.489 cestas têm paradeiro desconhecido desde então, o que fez a Controladoria-Geral levantar a suspeita de irregularidades e abrir um processo administrativo, ainda em andamento. O órgão ainda comunicou o fato ao prefeito para que formalizasse uma denúncia ao Ministério Público, o que foi feito.

O MPSC instaurou dois inquéritos neste ano. São investigados hoje a regularização dos serviços, o que já ocorre, conforme a 1ª Promotoria de Justiça da cidade informou à reportagem, e a eventual responsabilização de agentes públicos por possíveis irregularidades.

O que diz a prefeitura de Garopaba

Antes da abertura dos inquéritos, ainda no fim do ano passado, a prefeitura exonerou a então secretária de Assistência Social, Saionara Santos, e a diretora-executiva da pasta, Daiana Araújo da Silva.

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“As exonerações das servidoras, que estavam a frente da pasta e responsáveis pelas compras e entregas de cestas básicas, foram realizadas para que o julgamento ocorresse da melhor forma e para que não houvessem interferências ocorridas por ainda estarem ocupando os cargos”, escreveu a assessoria de imprensa da prefeitura, em nota ao NSC Total.

A gestão Junior Abreu também comunicou ter mudado o setor administrativo da pasta para solucionar os problemas. Afirmou ainda que as cestas que chegam à prefeitura por doação, e não por compra, têm controle regular da distribuição e não estão inclusas no sumiço.

“As cestas que recebemos em forma de doação são entregues às entidades do município, como APAE, Rede Feminina de Combate ao Câncer, Centro Espírita, já as adquiridas pela prefeitura são entregues às famílias cadastradas na Secretaria. Isso acontece pois as cestas recebidas em doação são cestas básicas simples, já as que são adquiridas pelo município são mais completas, contendo mais itens. E para não ter distinção de famílias, foi organizado dessa maneira”, comunicou.

O que diz a CPI

Apesar da normalização do serviço, o paradeiro das cestas básicas ainda é desconhecido. Diante disso, a Câmara dos Vereadores decidiu abrir uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) em março.

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— Até o momento nós já ouvimos mais de 18 pessoas, entre as assistentes sociais do município, funcionárias da Secretaria de Assistência Social, o dono da empresa, que estamos investigando também, a ex-secretária e a ex-diretora — diz o vereador Nilton Batista Raupp (MDB), que preside a CPI.

— Com os depoimentos das assistentes sociais, percebe-se que existiu sempre um mal gerenciamento, mas nós também ficamos sempre com o pé atrás porque é bem no período eleitoral que houve isso, de campanha eleitoral, onde pode ser que alguém usou [indevidamente as cestas] para as suas bases [de eleitores], mas não há nada concreto ainda — afirma o parlamentar.

Os membros da CPI têm como principal linha de investigação a hipótese de desvio.

O que diz o prefeito

O prefeito Junior Abreu afirmou ver a CPI da Câmara como um processo político, embora reconheça o papel de fiscalização dos vereadores, e reforçou que a investigação do caso partiu de sua gestão.

— Quando eles finalizarem o processo, vão entregar ao Ministério Público tudo aquilo que o Executivo já entregou. Nós respeitamos o papel dos vereadores, eles têm que fazer, mas, infelizmente, está sendo levado para uma esfera totalmente política, visto que essa denúncia partiu do Executivo. Não é uma coisa que a gente jogou para debaixo do tapete, que a gente prevaricou, pelo contrário — disse o prefeito.

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— Estão levantando sumiço de cesta básica como se alguém tivesse pego ou vendido. Só que pode ter sido um problema administrativo, que o sistema não foi abastecido. Pode ter sido uma situação de notas duplicadas, o que está sendo levantado também. Pode ser que tenham sido assinadas notas sem o recebimento do produto. Então estamos levantando tudo isso no processo — afirmou, ponderando, ainda assim, que, se confirmado ato de corrupção, espera a punição dos responsáveis.

— Não compactuamos com corrupção. Então, se a pessoa errou, vai ter que pagar.

O que diz a empresa que vendeu as cestas

À CPI, o dono da Elo, Leonardo Camilo Inácio, afirmou que todas as cestas compradas pela prefeitura foram entregues por sua empresa. Ao NSC Total, a assessoria jurídica da empresa reforçou isso.

“Todas as informações foram repassadas diretamente à CPI, todos os documentos relacionados às entregas e aos pagamentos foram encaminhados à CPI mediante solicitação formal da comissão. A empresa entregou efetivamente todas as cestas básicas que faturou, essas informações foram corroboradas com o depoimento das servidoras na CPI”, escreveu.

O que dizem ex-servidoras exoneradas da Secretaria

Em testemunho à CPI, a ex-diretora da Assistência Social afirmou considerar o suposto sumiço das cestas básicas um absurdo. Ela disse ter sido surpreendida com a exoneração do cargo e não saber o que pode explicar a diferença nos registros entre o que foi comprado e o que consta como entregue.

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Daiana Araújo da Silva disse ainda não participar da entrega das cestas e que, em algumas ocasiões, houve atrasos e falta de itens pela empresa fornecedora.

O NSC Total tentou contato com ela por telefone e WhatsApp, mas não obteve retorno. O espaço segue aberto para eventual manifestação.

Também à CPI, a ex-secretária de Garopaba disse que o acompanhamento das compras de cestas ficava a cargo de Daiana, a quem não atribuiu culpa, e que se recorda de terem ocorrido atrasos da empresa fornecedora por cerca de 15 dias durante sua gestão, em ocasião em que a Elo teria alegado luto.

Saionara Santos afirmou considerar vexatória a situação a que foi exposta com o suposto sumiço e negou ter ciência sobre qualquer irregularidade. Ela reafirmou isso em contato com a reportagem.

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“Na minha gestão frente à Secretaria de Assistência Social, penso não terem ocorrido irregularidades! A CPI instaurada tem por finalidade apurar a verdade dos fatos, razão pela qual entendo que somente no final, poder-se-á concluir o ocorrido. Maiores esclarecimentos poderão ser obtidos através do presidente da CPI. Sou a maior interessada em apurar a verdade dos fatos!”, escreveu, à reportagem.

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