Vinte e sete anos depois de iniciar uma disputa judicial que viria a ser histórica, Santa Catarina começa a enfrentar nesta quarta-feira a última batalha em busca dos royalties do petróleo explorado área até 200 quilômetros do litoral catarinense. Nove dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) julgam a partir das 9h o pedido do governo do Estado protocolado em 1991. A Ação Cível Originária (ACO) 444 foi colocada à disposição da pauta pelo ministro relator, Luis Roberto Barroso, somente em fevereiro deste ano, e a presidente Carmen Lúcia decidiu incluir para julgamento no final de maio. Diante de uma vitória jurídica, a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) estima até R$ 800 milhões em retorno financeiro. Parte desse valor seria repassado a municípios do litoral ainda não definidos.
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A discussão começou internamente no governo do Estado na década de 1980, quando o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) desenhou um triângulo demarcando o território paranaense. Abaixo ficaram as águas de Santa Catarina e acima, as águas paulistas, onde fica o campo de Baúna, o único dos seis questionados na ação que ainda tem petróleo a ser explorado. Em maio, produziu perto de 30 mil barris e 300 metros cúbicos de gás por dia no navio-plataforma Cidade de Itajaí. Em uma linha reta, a partir de Baúna, o trajeto vai dar em São Francisco do Sul. Mesmo assim, o território é considerado de São Paulo pelo desenho estabelecido no IBGE. A Petrobras opera no local há cinco anos, e os royalties do petróleo e compensações de exploração vão para os paulistas. Em 2014, o governo de SP calculou ter recebido dali R$ 250 milhões. A estatal tem intenção em vender a estrutura. Uma empresa de exploração da australiana já demonstrou interesse em comprar a área, o que poderia incluir os outros cinco campos desativados.
Caso a tese de Santa Catarina seja aceita no STF ao fim da sessão que começa nesta quarta-feira, os valores devem ser divididos entre catarinenses, paranaenses e paulistas. Mas, além de Baúna, atual área explorada, o que deu origem ao processo judicial foram dois campos então recém-descobertos pela Petrobras: Coral e Caravela. Em linha reta, ficavam na altura de Itajaí, mas, pela linha do IBGE, Coral ficou apenas nas águas do Paraná. E Caravela, só 8,43% em águas de Santa Catarina. A Petrobras explorou os campos entre dezembro de 1993 e dezembro de 2008. Um relatório do governo paranaense diz que o Estado arrecadou mais de R$ 43 milhões. A Secretaria da Fazenda de Santa Catarina disse que não encontrou nenhum registro de pagamentos nos cofres catarinenses. Depois passaram a ser explorados também os campos de Tubarão, Estrela do mar e Caravela do Sul. Todos são alvo da ação de SC.
— A questão dos royalties demanda de muitas décadas. Por Justiça, SC tem que ter reconhecido que esses royalties devam vir para o nosso Estado, e não para PR e SP. Por isso que essa decisão que o STF tomará servirá com certeza de um ganho financeiro importante para o nosso Estado. Esperamos que a Justiça seja feita. Permitirá que a gente tenha mais recursos para atender as necessidades básicas da população — ambiciona o governador de Santa Catarina, Eduardo Pinho Moreira (MDB).
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Com uma decisão favorável para o Estado, a Secretaria da Fazenda já tem planos para os recursos futuros. Segundo o secretário Paulo Eli, o valor referente ao recebimento dos royalties de exploração dos campos de petróleo poderá ser utilizado para cobrir parte do déficit da Previdência, que hoje é de aproximadamente R$ 4 bilhões.
* Colaboraram Gisele Willaim e Julio Ettore
Fórum Parlamentar vai acompanhar sessão no STF
Deputados federais catarinenses estarão no STF nesta quarta-feira para acompanhar a sessão de votação. O processo de Santa Catarina é o segundo da pauta, mas pode haver um pedido de mudança para que a ação catarinense tenha prioridade. Representantes do Fórum Parlamentar Catarinense no Congresso Nacional vão estar no tribunal. O coordenador do grupo, deputado federal Jorginho Mello (PR), lembra que no ano passado foi, junto com outros parlamentares, fazer uma visita ao relator do caso, ministro Luis Roberto Barroso, para pedir que ela colocasse o tema em pauta para votação. Mello será um dos deputados presentes hoje.
— Os postos (de extração de petróleo) estão dentro do território catarinense. Se acontecer um desastre ambiental, os prejuízos serão totalmente nossos. Então é uma injustiça a gente não estar recebendo absolutamente nada por uma coisa que temos direito — disse o coordenador do Fórum Catarinense.
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Dois dos 11 ministros não vão votar na sessão desta quarta-feira. Celso de Mello e Luiz Edson Fachin se declararam impedidos por terem alguma relação com o processo. Como há jogo do Brasil às 15h, a sessão deve ir até as 13h, o que vai motivar o adiamento da decisão para quinta-feira. Caso haja um pedido de vista de algum dos ministros, o processo ficará suspenso até definição do magistrado.
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Especialista vê necessidade de outra ação para recebimento de valores
A intenção da PGE é, ao fim do julgamento, pedir o pagamento imediato dos valores devidos a Santa Catarina, inclusive com retroatividade. Uma das opções seria fazer o PR e SP abrirem mão dos royalties a receber no futuro com o campo de Baúna para que o valor seja pago em compensação para os cofres catarinenses. Para o advogado especialista em direito administrativo Joel de Menezes Niebuhr, será necessária outra ação na Justiça para discutir a questão financeira:
— Essa ação visa desconstituir a demarcação realizada de forma equivocada. O IBGE teria que formalizar a nova demarcação para num segundo momento o Estado tomar as providências cabíveis que seriam devidos.
Nieburh ainda traz um aspecto importante para a votação. Segundo ele, há uma repercussão política a ser analisada. Com milhões de reais envolvidos na disputa, a força de Estados como o Paraná e São Paulo pode pesar no momento da decisão, além de repercutir no interesse de outros Estados.
— Nesse momento Santa Catarina tem que se mobilizar. Isso tudo aconteceu por falta de representatividade e força política. Então é muito importante que o Estado, o governo, a indústria e a população tenham ciência e saibam da importância dessa ação.
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O QUE DIZEM AS OUTRAS PARTES
IBGE
Na ação do STF, alega que seguiu o inciso I do artigo nono da Lei 7,525/1986 para “prolongar as linhas de projeção até o ponto de sua interseção com os limites da plataforma continental”. Além disso, pelo Decreto-Legislativo número 5, o instituto diz que é levado a interpretar que para os efetivos das lei 7453/85, a plataforma continental se estende até 200 milhas marítimas na costa no sentido jurídico”. Afirma que “os caprichos da natureza ao modelar o litoral brasileiro, criando singularidades na costa, que impossibilitariam ou, na melhor hipótese, criariam grandes dificuldades para o traçado das linhas geodésicas projetantes dos limites territoriais, ficaram generalizadas por retas de tendência, segundo a redação do artigo 3º do Decreto nº 93.189/86”.
ESTADO DO PARANÁ
Dentre outras contestações legais, sustenta que compete ao IBGE “realizar o traçado das projeções dos Estados-membros em relação à plataforma submarina, atribuição essa que se exerce adstrita aos limites da lei e não ao alvedrio da Fundação, como equivocadamente quer fazer parecer a inicial. E nessa perspectiva, o IBGE, no exercício da competência que lhe é legalmente deferida, promoveu o traçado”.
ESTADO DE SÃO PAULO
Em contestação, o Estado de São Paulo subscreve as alegações do Paraná, “chamando a atenção para a indefinição que surgiria se a projeção da linha divisória SC/PR pudesse quebrar a divisa PR/SP”.
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