O ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu desmembrar, nesta terça-feira, o inquérito que apura o suposto esquema de formação de cartel em licitações do sistema de trens e metrô de São Paulo. Com a decisão, apenas os acusados que têm foro privilegiado vão responder às acusações no Supremo.

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Marco Aurélio também determinou que parte do sigilo de investigação seja liberada. Somente dados pessoais relacionados aos investigados ficarão mantidos em segredo de Justiça. No entanto, o ministro rejeitou pedido para que os envolvidos tenham acesso aos acordos de delação premiada das pessoas que denunciaram o suposto esquema.

De acordo com a decisão do ministro, serão processados no STF o deputado federal Arnaldo Jardim (PPS-SP) e os secretários de Estado Edson Aparecido (PSDB-SP), José Aníbal (PSDB-SP) e Rodrigo Garcia (DEM-SP). Os três também são deputados federais, mas estão em licença para atuar no governo Geraldo Alckmin (PSDB).

A parte do processo que envolve investigados que eram ligados à Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) ficará sob a responsabilidade da Justiça Federal de São Paulo. Nessa parte, são citados os nomes de João Roberto Zaniboni, Ademir Venâncio de Araújo e Oliver Hossepian Salles de Lima. Duas pessoas ligadas a Zaniboni também tiveram o nome incluído, assim como Arthur Gomes Teixeira.

No processo, são apurados os crimes de corrupção, evasão de divisas e lavagem de dinheiro. As investigações indicam que as empresas que concorriam nas licitações do transporte público paulista combinavam os preços, formando um cartel para elevar os valores cobrados, com a anuência de agentes públicos. Há suspeita de pagamento de propina.

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Em novembro, atendendo a uma solicitação da Polícia Federal, a Justiça Federal determinou o bloqueio de cerca de R$ 60 milhões em bens de suspeitos de participar do esquema, como forma de garantir o ressarcimento dos valores desviados. Foram afetadas pela decisão três pessoas jurídicas e cinco pessoas físicas, incluindo três ex-diretores da CPTM. A solicitação foi feita após a Polícia Federal após tomar conhecimento de que autoridades suíças, que também investigam as suspeitas de corrupção, encaminharam um pedido de cooperação internacional ao Brasil.

A combinação de preços entre as empresas que participaram de licitações para obras, fornecimento de carros e manutenção de trens e do metrô também é alvo de investigação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), do Ministério Público Federal e do Ministério Público Estadual.

O cartel é investigado pela Operação Linha Cruzada, feita pelo Cade em conjunto com a Polícia Federal. A investigação teve início após acordo de leniência da Siemens com o conselho, que permitiu à empresa denunciar as ilegalidades. Documentos e cópias de e-mails trocados entre funcionários da Siemens estão sendo analisados pelo Cade e pela Justiça.

Entenda o caso

A ORIGEM

– Em julho de 2013, veio à tona um acordo de leniência (espécie de delação premiada) entre a Siemens e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão de combate a práticas prejudiciais à livre concorrência. Em troca de punição menor, a multinacional alemã confessou ter participado de cartel para fraudar licitações do governo de São Paulo, entre 1998 e 2008. Cartel é um acordo ilegal entre companhias concorrentes para elevar os preços de seus produtos e serviços e obter maiores lucros.

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O ESQUEMA

– As fraudes teriam acontecido em licitações do Metrô de São Paulo e da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), nos governos Mario Covas, José Serra e Geraldo Alckmin, todos do PSDB. Multinacionais combinavam entre si quem ganharia e quem perderia as concorrências, forçando preços superfaturados. Os contratos envolviam fornecimento de trens e equipamentos e manutenção de linhas. O esquema teria causado prejuízo de R$ 577 milhões e também teria ocorrido no governo do Distrito Federal.

VERTENTE ALSTOM

– Autoridades suíças e brasileiras investigam a multinacional francesa Alstom, também acusada de integrar o cartel. Há suspeitas de que a empresa recorreu a lobistas e pagou propina para obter contratos. A direção da empresa nega participação em fraudes.

– Em outubro, a imprensa revelou que os procuradores suíços passaram dois anos esperando a ajuda do MPF brasileiro para investigar a Alstom. Segundo o procurador Rodrigo de Grandis, houve uma “falha” e o pedido da Suíça foi arquivado em uma pasta errada.

– Um dos nomes envolvidos no caso é o de João Roberto Zaniboni, ex-diretor da CPTM. Ele foi condenado na Suíça por lavagem de dinheiro. Segundo as investigações, uma conta bancária em seu nome no Credit Suisse, de Zurique, recebeu US$ 255,8 mil. O valor foi depositado pela Procint e seria propina.

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– A Suíça bloqueou uma conta que seria de Robson Marinho, ex-chefe da Casa Civil de Covas. Ele é suspeito de ter recebido propina para ajudar a Alstom a conseguir um contrato de R$ 110 milhões, em 1998. A conta recebeu US$ 1 milhão (cerca de R$ 2 milhões).

VERTENTE SIEMENS

– A Siemens subcontrataria empresas ou usaria contas em paraísos fiscais para pagar propinas a políticos e diretores de estatais. Nos últimos dias, veio à tona um relatório de um ex-diretor da Siemens. No texto, Everton Rheinheimer diz que o esquema tinha como objetivo o abastecimento do caixa 2 do PSDB e do DEM. Rheinheimer afirma que os políticos tinham ligação com a Procint Projetos e Consultoria, de Arthur Teixeira, suspeita de intermediar a propina.

– Entre os políticos citados no relatório, estão o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), o chefe da Casa Civil do governo Alckmin, Edson Aparecido (PSDB), o deputado federal Arnaldo Jardim (PPS-SP) e os secretários estaduais José Aníbal (Energia), Jurandir Fernandes (Transportes Metropolitanos) e Rodrigo Garcia (Desenvolvimento Econômico). Garcia é do DEM. Os demais secretários, do PSDB. Todos negaram envolvimento no esquema.