Um dos alvos da CPI dos Táxis instaurada há quase 30 dias na Câmara de Florianópolis, Isaías Gomes dos Santos quebra o silêncio e fala pela primeira vez sobre as suspeitas de que administra 60 placas na Capital. Em entrevista ao Diário Catarinense, conta que tem apenas a placa 0138 no nome dele, mas reconhece que outras pessoas da família também tem licenças e exploram o serviço na Capital. Ele nega ter arrendado outras placas ou mesmo manter contratos de gaveta. Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista.
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Diário Catarinense – Quantos táxis o senhor tem hoje?
Isaías Gomes dos Santos – Um táxi, a placa 138.
DC – Alguém mais da sua família tem táxi?
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Isaías – Minha esposa e meu irmão.
DC – Como o senhor conseguiu essa placa? Participou de licitação?
Isaías – Consegui em 2004. Trabalhava com uma pessoa que não quis mais administrar o táxi e passou pra mim. Paguei 2 mil UFIRs, comprei o carro e transferi pra mim. E tudo dentro da legalidade, tudo certinho.
DC – Mas a lei 85/2001 só autoriza transferências para herdeiros ou em casos de invalidez…
Isaías – Ou casos específicos, como foi esse caso. O motorista não tinha mais condições de dirigir.
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DC – Mas é discutível…
Isaías – Não sou eu que devo dizer se é certo ou errado. Isso cabe ao órgão gestor, que na época aceitou e fez a transferência. E não é só o meu caso. Parece que são 16 casos como o meu.
DC – Essa é a única placa que o senhor comprou?
Isaías – Não, não comprei a placa, a placa foi cedida pra mim. Eu comprei o carro e paguei 2 mil UFIRs para a prefeitura na transferência.
DC – O senhor não pagou nada pela placa?
Isaías – Não. Eu trabalhei cinco anos como motorista auxiliar dele. E depois comprei o carro e paguei 2 mil UFIRs pela transferência.
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DC – Essa pessoa não tinha herdeiro?
Isaías – Não. Me deu pelo tempo que eu trabalhei, como gratificação pelo tempo de serviço.
DC – Mas o senhor recebia normalmente pelo seu trabalho…
Isaías – Sim, normalmente, ganhava 30% do total, como funciona hoje com qualquer taxista.
DC – O senhor já negociou alguma placa?
Isaías – Não. Nem pode. A lei diz que só pode ter um táxi.
DC – Mas há oferta de venda e compra de placas no mercado paralelo?
Isaías – Não, não. Nunca me ofereceram.
DC – O senhor nunca ouviu falar do mercado paralelo de placas de táxi?
Isaías – Isso até tem. Como uma senhora de 80 anos vai tocar um táxi? É óbvio que essa senhora vai passar para um neto, um sobrinho ou até um terceiro administrar…
DC – Então o mercado paralelo existe?
Isaías – Existe.
DC – O senhor conhece quem vende ou quem compra?
Isaías – Não. Não conheço e também não estou aqui para cuidar da vida dos outros. Cuidar da minha já é um trabalho…
DC – O senhor tem placas arrendadas?
Isaías – Não, não tenho.
DC – O senhor não administra outros táxis?
Isaías – Não. Eu tenho uma oficina que oferece manutenção para táxi.
DC – E o senhor nunca foi procurado por ninguém que lhe pediu para administrar uma placa?
Isaías – Não. Fui procurado por uma senhora de uns 80 anos, que estava com dificuldade para administrar o táxi e me disse que queria arrendá-lo. Fizemos um contrato que durou três dias. Depois, vimos que era irregular, tanto que cancelamos tudo. Esse contrato hoje está no Ministério Público. Está em segredo de Justiça. Os filhos querem tirar o táxi dela, uma senhora de 80 anos que vive disso há 50 anos. E querem interditá-la.
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DC – É um contrato de gaveta?
Isaías – É, mas foi cancelado três dias, um mês depois, não me lembro.
DC – Mas há outros casos de contrato de gaveta?
Isaías – Comigo não.
DC – O senhor dirige táxi?
Isaías – Não, hoje não. Mas se precisar, dirijo. A lei hoje me garante ter dois motoristas.
DC – Quantas empresas o senhor tem?
Isaías – Eu tenho duas: a oficina e a empresa de turismo. A minha esposa tem a mecânica e a empresa de turismo é minha. Mas sou casado, então é tudo a mesma coisa. Só que a empresa de turismo hoje está parada, até porque carro de turismo hoje em Florianópolis não compensa. Cheguei a ter dois, mas pra mim não deu retorno, não compensou.
DC – Por que a Oficina 1.0 é tão conhecida entre os taxistas?
Isaías – Porque ofereço manutenção para todos os táxis. Inclusive, quero ressaltar, perdi 60% da minha clientela depois dessas denúncias vazias. Tenho mecânicos que trocam embreagem em 45 minutos. Pastilha de freio, em 10 minutos. Óleo, em 5 minutos. Em uma outra oficina, para trocar embreagem é meio dia de trabalho, no mínimo. E táxi parado não ganha frete. Trabalho sábado, domingo e feriado. É a única oficina que trabalha a partir das 6 horas da manhã.
DC – O senhor diria que é um taxista ou um empresário?
Isaías – Os dois, né? A lei não diz que não posso ter um táxi só porque tenho empresa. Tem advogado, tem médico, tem dentista, funcionário público que tem táxi.
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DC – Então o senhor se considera um taxista?
Isaías – Sim, um taxista. E um empresário. Só com um táxi não consigo ter uma renda e sustentar dois filhos num padrão que merecem.
DC – A informação é de que o senhor tem 60 placas de táxi hoje em Florianópolis. Algumas arrendadas e outras compradas com contratos de gaveta. O que é verdade?
Isaías – O que é verdade é que tenho um táxi, o 138, e a minha esposa tem um táxi, o 007. E tenho uma oficina que dá manutenção para mais de 100 táxis. Inclusive de Santo Amaro, Biguaçu, Palhoça. Até em Rancho Queimado eu tenho cliente. Agora, depois dessas denúncias vazias, perdi 60% dos meus clientes.
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DC – Mas então de onde vieram essas denúncias?
Isaías – Não sei.
DC – Mas o que o senhor atribui essas denúncias?
Isaías – Eu tenho a oficina e o movimento de táxis lá é grande. E as pessoas passaram a dizer que são todos meus. E não são. É muito fácil espalhar mentiras. Disseram que eu tinha um apartamento de R$ 2,5 milhões no Cacupé. Disseram que eu era casado com uma servidora pública. Sou casado com a Tatiane, linda e maravilhosa. E tenho dois filhos.
DC – Mas se isso é boato, quem está espalhando boatos?
Isaías – É a indignação dos motoristas em torno dessas placas novas (da licitação). Quem conseguiu foi médico, advogado, dentista, funcionário público. Hoje, se eu quiser dar a minha placa para você, não posso.
DC – E por que em 2004 o senhor conseguiu a transferência?
Isaías – Porque, em 2004, o secretário teve uma interpretação diferente.
DC – Quem era o secretário?
Isaías – Não lembro, mas não tive privilégio nenhum.
DC – Há motivos para a instalação dessa CPI dos Táxis na Câmara de Florianópolis?
Isaías – Da minha parte, não. Não sou funcionário público. Nunca dei dinheiro para ninguém. Não devo nada. Se há (motivos), desconheço.
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DC – Mas o senhor não acredita que o sistema tem problemas?
Isaías – Deveria é ter outra licitação. Essa antiga não atendeu os taxistas que tem baixa instrução. Olha a minha situação. Só tenho até a sexta série, como vou concorrer com um advogado? Apesar de nem posso participar porque já tenho um táxi.
DC – Então, para o senhor, a CPI não tem razão de existir?
Isaías – Não sou eu que tenho que dizer isso. Sou apenas um taxista.
DC – Qual sua relação com o ex-secretário Norberto Stroisch Filho?
Isaías – Eu o conheço como conheço o atual secretário: nunca dei dinheiro para ele nem para nenhum servidor.
DC – Mas o senhor conhece de onde?
Isaías – Do Táxi. Da Secretaria de Transportes. Já até participei de reuniões do sindicato com ele para discutir benefícios para a categoria. Nunca fui na casa dele nem ele na minha casa.
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DC – E qual sua relação com o ex-secretário João Batista Nunes?
Isaías – Não tenho nada contra nem a favor.
DC – Mas o senhor ia à secretaria na gestão dele?
Isaías – Eu vou a secretaria a cada seis meses para pegar o selo de vistoria e uma vez ao ano para pegar a licença de trânsito.
DC – O senhor já colaborou financeiramente com doações para campanhas de políticos, candidatos a vereador, prefeito, deputado?
Isaías – Nunca, não. Já teve festa na minha oficina, onde esteve gente lá, não vou citar nomes agora. Mas nada político.
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DC – O vereador Deglaber Goulart apresentou recentemente um projeto sugerindo a regulamenta das transferências de placas de táxi de condutor para condutor. O senhor concorda com essa proposta?
Isaías – É interessante. Quem sabe paravam com essa discussão.
DC – Acabaria com o mercado paralelo?
Isaías – Até acabaria. E ainda a prefeitura poderia arrecadar algum dinheiro com as transferências. Poderia até abrir a oportunidade para outras pessoas. Mercado paralelo supostamente tem: só falo o que posso provar, digo que o 138 é meu, o 007 é da minha mulher.
DC – O senhor se manteve em silêncio durante tanto tempo: por que decidiu falar?
Isaías – Eu não vivo de mídia, não preciso de voto. Meu negócio é a minha oficina e o meu táxi. Não queria ir a público para não me expor, mas da maneira como estão falando, parece que sou um bandido. Sou um trabalhador.
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DC – Se a CPI o convocar, o senhor vai depor?
Isaías – Vou. Quem não deve, não teme.