A Psico BR e a Moshi Moshi Produtora montaram parceria para o relançamento em CD daquela que é considerada uma das mais importantes obras do rock progressivo brasileiro: Snegs, liberado originalmente em 1974 pelo Som Nosso de Cada Dia.
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Se nesse período gringos como Yes, Emerson Lake And Palmer e King Crimson já estavam começando a pavimentar a história, o progressivo ainda engatinhava nos centros urbanos do Brasil. Nossos representantes eram poucos e inexpressivos, mas a forte musicalidade tupiniquim fatalmente possibilitou que algumas obras se tornassem clássicos por aqui.
Um dos nomes emblemáticos desta safra foi o Som Nosso de Cada Dia, que surgiu na São Paulo de 1971 como um trio meio atípico, cuja presença da guitarra estava longe de ser constante (assim como os britânicos do Emerson, Lake & Palmer). O núcleo criativo da banda tinha em Manito, um espanhol de nascimento e multi-instrumentista que assumiu sintetizadores, teclados, pianos, além dos violinos, saxofones e flautas. Pedrinho assumiu o kit de bateria e voz, e Pedro Baldanza teve a guitarra e baixo aos seus cuidados.
Após alguns meses ingerindo cogumelos, montam o repertório sabendo que a chance de sair do anonimato estava nos festivais. E foi nestes shows que os olheiros aconselharam a gravadora Continental a assinar com o Som Nosso de Cada Dia para a gravação do primeiro disco. As seções no estúdio foram problemáticas, enfrentando até problemas na mesa de som que impediam a utilização do Pam (recurso que permite, no estéreo, o áudio passar de um canal para outro). Entre os reveses, o trio teve apenas uma mísera semana para gravar e mixar as oito faixas e, como se não bastasse, no final de 1973 a indecisa Continental optou em deixar Snegs na geladeira.
Apesar das incertezas, o Som Nosso de Cada Dia seguia em frente, tendo como grande motivação ser selecionado para abrir a turnê que o norte-americano Alice Cooper faria por São Paulo e Rio de Janeiro. O primeiro evento internacional de rock do Brasil, com o Som Nosso de Cada Dia sendo exposto a mais de 130 mil pessoas (o maior público que o Alice Cooper obteve até então) nas cinco datas em julho de 1974.
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A plateia teve acesso direto à viagem musical e dizem que os teclados lisérgicos na canção Massavilha deixou o público embasbacado. Foi diante desta reação que os engravatados da gravadora perceberam que tinham algo diferenciado em mãos e, depois de quase um ano engavetado, Snegs é lançado.
A realidade é que o áudio original do vinil continuava a não ser grande coisa, ofuscando o brilho dos instrumentos, mas a força intuitiva e bom gosto nos arranjos se faziam presentes para equilibrar a equação. Ok, as vozes, incluindo as de fundo, poderiam ser melhores, mas os arranjos são tão bem trabalhados – especialmente os sintetizadores, teclados e pianos – que minimizam os problemas. Sinal da Paranóia, Bicho do Mato, Massavilha e Dirección de Aquarius se destacam e refletem todo o experimentalismo que a banda perseguia.
Por diversas razões, mesmo com a boa fase, em 1975 Manito optou por ocupar o lugar de Arnaldo Baptista no Os Mutantes, o que não durou muito.
Consequentemente, o Som Nosso de Cada Dia encarou várias formações até 1977, quando lançou pela CBS um sucessor batizado simplesmente como Som Nosso, cujo repertório foi influenciado pela nova gravadora. Esse segundo disco se tornou conhecido como Sábado / Domingo, pois o lado A do vinil (Sábado) era preenchido por funks, enquanto o lado B (Domingo) tinha o progressivo. Mas estas são histórias para serem relembradas em outra ocasião – basta dizer que a carreira do Som Nosso de Cada Dia não chegou ao ano seguinte¿ lml
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Som Nosso de Cada Dia: Snegs
1974 / Continental Records – 2017 / Psico BR e a Moshi Moshi Produtora
01. Sinal Da Paranóia
02. Bicho do Mato
03. O Som Nosso de Cada Dia
04. Snegs de Biufrais
05. Massavilha
06. Direccion de Aquarius
07. A Outra Face
08. O Guarani
*Ben Ami Scopinho está há mais tempo em Floripa do que passou em sua terra natal, São Paulo. Ilustrador e designer no DC, tem como hobby colecionar vinis e CDs de hard rock e heavy metal. E vez ou outra também escreve sobre o assunto.