A madrugada do dia 28 de março de 2004 foi longa para quem atuou no socorro às vítimas do Furacão Catarina. O policial Cosme Manique Barreto era comandante da Polícia Militar de Sombrio e lembra até hoje da “muralha negra” que se formou sobre o mar na tarde daquele dia. Era o sinal de que algo pior estava por vir. 

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— Eu botei na cabeça: “se isso aí chegar aqui na costa, vai ser grave” — recorda.

— Mas foi passando a tarde e a gente foi buscando notícias. No início da noite, assistindo alguns telejornais, lembro de uma entrevista de um instituto nacional dizendo que teriam ventos de 70, 90 km/h, que era para as pessoas estarem tranquilas.

Os ventos, na verdade, atingiram 180 km/h. Lá pelas 23h30, ligações de pessoas em perigo começaram a tocar na delegacia de Sombrio. Os policiais então saíram em viaturas para resgatar as vítimas e levá-las a um ginásio municipal — a prefeitura chegou a disponibilizar um micro-ônibus, mas o veículo logo teve que parar de ser usado, pois havia risco de que ele tombasse com o vento. 

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Cosme Manique Barreto era comandante da Polícia Militar de Sombrio na época do Furacão Catarina (Foto: Lucas Amorelli, DC)

O comandante Cosme saiu em uma dessas viaturas, mas acabou ficando preso em uma rua de Balneário Gaivota que havia sido bloqueada com a queda de árvores. Ele passou a madrugada dentro do carro, abrigado na lateral de um trator. Naquele momento, já não havia sinal de rádio e nem de telefone, e as ligações cessaram.

—  Da 1h e pouco da manhã em diante, nós só ficamos aguardando o amanhecer do dia. A visão posterior era muito trágica. Casas que tiveram dificuldades de ser consertadas novamente… Em Balneário Gaivota e Passo de Torres, a gente conseguiu ver in loco a devastação.

Cenário de guerra 

Henrique Silveira, atual tenente-coronel do 4º Batalhão de Bombeiros Militar, era soldado em Criciúma na época do furacão. Ele recorda que o comando fez uma reunião com todo o efetivo, no fim da tarde do dia 27, avisando que eles deveriam deixar o material de socorro preparado. Alguns, como Henrique e seu pai, que também era bombeiro, foram dispensados. Eles ficaram de sobreaviso para voltar ao quartel caso houvesse necessidade.

Por volta da meia-noite, o telefone tocou na casa de Henrique..

— O trajeto de casa até o quartel foi bem marcante, porque nós viemos desviando de galhos do meio do caminho, de placas, de telhas que passavam — recorda. — E foi um momento tenso porque eu, meu pai, minha mãe e minha avó morávamos todos na mesma casa. E aí naquele momento os dois bombeiros saíram e deixaram a família lá, contando com a sorte.

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Naquela madrugada, o Corpo de Bombeiros local atuou socorrendo famílias que haviam perdido a casa, ou cujas casas estavam destelhadas. Havia um abrigo no Ginásio Municipal de Criciúma para 300 pessoas. 

— Na manhã seguinte, o que se via na cidade era um cenário de guerra. E aí o nosso serviço foi retirar placas, retirar árvores de cima de residências e de veículos, distribuir lonas. A gente recebeu reforço também de Tubarão e Florianópolis. 

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Hoje, enquanto comandante do batalhão, Henrique avalia que o furacão serviu como um marco para a evolução das estratégias de resposta a desastres naturais na região.

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— A partir dali as defesas começaram a se estruturar melhor. O corpo de bombeiros evoluiu e hoje nós temos forças-tarefas, com equipes treinadas para agir de maneira imediata em diferentes cenários. Temos mais equipamentos, mais viaturas 4×4. Os avisos meteorológicos a gente já tem com certa antecedência. Então eu acho que esse aprendizado vem lá de trás.

Reportagens especiais relembram Furacão Catarina

Na semana que marca os 20 anos da passagem do Furacão Catarina pelo Estado, uma série de reportagens especiais relembra como foi o evento único no país que afetou cidades do Sul catarinense em 2004, e trazem os aprendizados deixados pelo furacão, que mudou a vida de milhares de catarinenses. 

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