Algumas marcas estão mortas mesmo que o gerente delas não saiba. É o que afirma Fernando Leira, gerente geral da agência global de branding Landor Associates. Antes de assumir o comando pelo desenvolvimento de negócios da Landor no Brasil, Leira foi diretor regional de marketing da Johnnie Walker na América Latina e Caribe e trabalhou na Diageo, em Londres, e em Leo Burnett, em Madrid. Nesta entrevista, o especialista explica que aceitar a realidade é um bom começo no processo de reconstrução da marca.
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A Notícia – Como podemos definir a reputação de uma marca?
Fernando Leira – A reputação de uma marca é um conceito bem abrangente. Para as empresas que consideram a marca como um elemento de marketing, a reputação inclui aspectos tradicionais do marketing mix, como a qualidade do produto, a comunicação e até a experiência do cliente. Nesses casos, o dano de uma crise de reputação é limitado, assim como os benefícios que geram uma boa reputação. Quando a marca é considerada uma plataforma para a ação, sua reputação se eleva além da área de marketing, tornando-se elemento transformador da companhia. A marca passa a ser propriedade de todas as áreas da empresa e a reputação é formada por todas e cada uma das atividades externas e internas da corporação. A complexidade é maior, mas os benefícios de tomar esse caminho são incomparáveis.
AN – Que fatores mais ameaçam as marcas?
Leira – Atualmente, há um processo de destruição das marcas que permanecem estáticas ou daquelas que continuam olhando apenas para os sucessos do passado. Por isso, digo que algumas marcas já estão mortas mesmo que o gerente delas ainda não saiba. As marcas que mais prosperam são aquelas consideradas ágeis, ou seja, que enxergam oportunidades nas adversidades, que permanecem fiéis ao que representam e nunca ficam paradas. A globalização e a tecnologia geram novos clientes, novas expectativas e novos mercados. O ritmo dessas mudanças cria oportunidades para as marcas que sabem aproveitá-las e condena ao desaparecimento daquelas que não conseguem se mexer.
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AN – O que não pode faltar no processo de reconstrução da marca?
Leira – Do ponto de vista da marca, o primeiro passo é entender o que está provocando a crise. A natureza do problema pode variar, mas escutar os clientes e colaboradores, por exemplo, e fazer um bom diagnóstico da situação permitirá grande chance de sucesso na reconstrução de imagem. O próximo passo é aceitar a realidade, mesmo que o melhor caminho seja pedir desculpas publicamente. Um bom diagnóstico é completamente inútil se não aceitarmos o que a realidade mostra. Porém, esse processo tem de ter o máximo de honestidade e transparência. Hoje, o engano é identificado tão rápido quanto tuitar uma foto. Qualquer que seja a linha de ação decidida, precisa ser honesta, afinal, não queremos jogar gasolina na fogueira em uma crise de marca.
AN – Que erros costumam ser cometidos na tentativa de melhorar a reputação?
Leira – Os erros mais comuns estão relacionados à ausência de um processo, um bom diagnóstico, à falta de aceitação da realidade e de honestidade. Nos últimos anos, vimos no Brasil algumas marcas que entraram em crise de reputação e, além de não aceitarem o problema, fizeram um diagnóstico ruim e tentaram se defender com os mesmos argumentos que criaram o problema. Outro erro comum: a ausência de pessoas certas na gestão de crise. Talvez um funcionário jovem seja a pessoa certa para atender as mídias sociais, mas não para responder à uma situação de crise pelo fato de não ter autoridade e conhecimento dentro da empresa para entender as implicações de uma situação delicada. Por isso, toda marca precisa ter definido um comitê de crise com pessoas experientes. Uma dica: respostas automáticas ou de robôs não caem bem, especialmente em momentos de crise. Evite-as. Warren Buffet diz que “leva 20 anos para construir uma reputação e cinco minutos para arruiná-la”. Se você pensar sobre isso, vai fazer as coisas de forma diferente.
AN – Em que situações é melhor mudar a marca ou até mesmo se desfazer da empresa?
Leira – Enquanto houver vida, há esperança. Algumas estrelas de Hollywood conseguiram se reconstruir. Quem poderia imaginar que, há 10 anos, Robert Downey Jr. se tornaria o ator mais bem pago da indústria cinematográfica? Sempre há uma solução, uma oportunidade, mas isso passa por um processo de reposicionamento que tem de começar com uma profunda revisão da essência da marca e dos valores que sustentam esse posicionamento. A partir disso, será preciso desenvolver todos e cada um dos pilares que vão sustentar essa reconstrução, por meio de ações concretas de ativação que têm de ser analisadas de um ponto de vista abrangente, incluindo as plataformas-chave, não só de comunicação, mas de ativação nos pontos de contato com os clientes e stakeholders principais. Não é simples, rápido e barato, mas sempre tem solução.