Quase não existem segredos entre nós — eu e as corporações de tecnologia que oferecem facilidades de conexão e relacionamento em troca do acesso irrestrito a tudo que me vincula ao ambiente digital. Elas conhecem todos os meus hábitos. A hora de pegar no sono — quando programo o celular para o dia seguinte — a de acordar (e a média de sonecas ativadas para adiar em alguns minutos o penoso momento de colocar os pés para fora da cama). Os locais por onde passo durante o dia, os trajetos que me levam a cada um deles, o horário mais provável dos deslocamentos (e a velocidade em que costumo trafegar).
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Sabem onde faço as refeições, o tíquete médio que consumo e a forma de pagamento. Conhecem meus amigos e contatos profissionais, as ferramentas que utilizo para me comunicar com eles, a frequência e o tipo de assunto de que tratamos (são capazes, inclusive, de me indicar seus endereços eletrônicos quando não os tenho em mãos, cruzando dados da agenda telefônica com a caixa de entrada dos e-mails).
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Registram meus compromissos, me fazem recordar a data dos aniversários, têm ciência dos assuntos que despertam meu interesse nos jornais digitais e, provavelmente, são capazes de listar minhas leituras mais recentes (já que a compra de um livro é precedida por uma longa pesquisa virtual com referências sobre o título). Em muitos aspectos, elas sabem inclusive de coisas que me dizem respeito, mas sobre as quais não tenho qualquer domínio. Como as palavras mais frequentes que utilizo (ou os vícios de linguagem que cometo).
Sei, no entanto, que esta condição não é uma exclusividade minha (e, mais do que isso, que pouco interessa a estas corporações aquilo que faz de mim um indivíduo). Sou útil enquanto potencial de consumo. Ou como a ínfima parte de uma estatística que reúne alguns bilhões de seres humanos conectados em rede.
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Tenho a convicção de que todos nós, mesmo tendo a vida devassada como um livro aberto, ainda nos beneficiamos mais com o que estas empresas de tecnologia nos proporcionam do que elas são capazes de tirar proveito do que sabem de nós. Pelo menos por enquanto.