Quando uma palavra passa a se destacar por alguma circunstância, agrega certos significados que não lhe pertencem. Pelo menos nas definições que constam nos dicionários.

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Nestes tempos de delação premiada, em que a teoria das probabilidades inverteu a lógica de que as pessoas são consideradas inocentes até prova em contrário, o verbo alegar passou a soar como uma espécie de “desculpa esfarrapada”. Ou a última tentativa (vã, é claro) de evitar que se efetive a condenação de alguém que parece não ter outra saída a não ser culpado.

Você já reparou como todos os dias, nos noticiários, dezenas de pessoas fazem algum tipo de alegação em relação a acusações de que foram alvo? Embora alegar seja apenas apresentar fatos, motivos ou fatores em defesa de algo, depois de atribuído tantas vezes a lideranças políticas e empresariais de ética mais do que duvidosa, ficou muito malvisto.

Se alegar fosse substituído por alguns de seus sinônimos mais intensos – argumentar, ponderar, defender, justificar ou sustentar -, não traria tal carga negativa. Se fosse trocado por outros ainda mais isentos – como dizer, afirmar, declarar, mencionar, expor ou apontar -, o indivíduo ainda teria alguma chance de provar ser vítima de um equívoco.

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A questão é que a escolha do verbo que vai acompanhar a declaração entre aspas de um acusado nunca é feita pelo próprio autor, mas por um terceiro que relata sua história para outras pessoas. E quando o locutor do rádio, o apresentador da televisão, o repórter do jornal, da revista ou do portal – ou o amigo do bar – associa a frase do acusado ao verbo alegar, a suposta isenção de quem ainda mereceria o sagrado direito de defesa se esvai.

Aliás, nos dias de hoje, para qualquer tipo de citação em resposta a uma suspeita, vale o provérbio atribuído à mulher do romano Júlio César: não basta ser honesta, é preciso parecer honesta. E é aí que a coisa pega. Em qualquer explicação antecedida ou seguida pela alegação, a pretensa honestidade não orna.

A solução à vista, se não é das melhores, é o que temos para o momento: definir “alegar” como um termo politicamente incorreto. Pelo menos até que se concluam os processos da Lava-jato e similares e as pessoas possam voltar a fazer alegações sem que isso signifique a assinatura de um atestado de culpa.