Com o exemplar de “A Notícia” do último final de semana em uma mão (e uma taça de vinho na outra), a reflexão foi inevitável: que destino foi dado ao meu antigo Álbum de Recados? Provavelmente, não teve a mesma sorte que o de Waltrudes Hardt, redescoberto depois de uma longa trajetória de descaminhos. Uma parte do meu, quase irreconhecível, ainda deve jazer em uma camada profunda de algum aterro a centenas de quilômetros daqui.
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Mesmo sem sua presença física, no entanto, a lembrança destas páginas mágicas às quais destinávamos uma parte importante de nossas energias e expectativas não tinha como passar incólume depois daquela reportagem. O texto foi um convite para voltar muitos anos no tempo e reviver momentos da escola primária, como chamávamos os quatro anos iniciais do ensino fundamental em que a função dos álbuns de recados costumava tomar conta dos minutos que antecediam o início das aulas e se estender depois para o recreio.
Entregar o álbum para que um colega deixasse por escrito sua mensagem era sempre um ato de coragem, pois o acompanhava um pedido, velado, de atenção, por meio de palavras de estima, amizade e reconhecimento. Guardávamos os textos sempre por perto, como tesouros, para nos cercarmos da autoconfiança que proporcionavam quando nos encontrávamos em situações de insegurança ou de desconforto.
A ação de solicitar recados no álbum envolvia, também, um gesto de confiança – abrir para alguém (por quem muitas vezes tínhamos mais admiração do que intimidade) as manifestações de carinho e os desejos registrados por aqueles que escreveram antes.
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Como não poderia deixar de ser, a prioridade dada aos escrevinhadores também tinha lá os seus significados. Por que outro alguém foi escolhido para abrir o álbum de minha melhor amiga? E se éramos o primeiro, quanta responsabilidade recebíamos em dar o tom para as lembranças de quem tanto nos estimava? Em saber que seríamos lidos (e avaliados) por todos aqueles que escreveriam depois de nós?
O wi-fi volta a funcionar e o WhatsApp interrompe a reflexão anunciando mais uma meia dúzia de conversas de pouca relevância. E eu sinto uma falta danada de quando tínhamos algum tipo de preocupação e cuidado ao emitir as palavras.