Há sete décadas, a bordo do navio General Mann, mais de 5 mil brasileiros desembarcavam em Nápoles, onde sentiriam na pele o horror do maior conflito bélico da história. Chefiado pelo general Zenóbio da Costa, o primeiro escalão da Força Expedicionária Brasileira (FEB) partiu em 2 de julho de 1944 do Rio de Janeiro, então capital federal, em direção a uma Europa já devastada por quase cinco anos de guerra. Continua depois da publicidade Depois da longa e tensa viagem, na qual alternavam-se entre os soldados o tédio pelos dias intermináveis e o medo dos submarinos alemães, os brasileiros tiveram um choque de realidade em 16 de julho ao pisarem no porto italiano, completamente destruído por anos de bombardeio. Se no Brasil dizia-se que era mais fácil uma cobra fumar do que o país enviar soldados ao front, a chegada do contingente ao sul da Itália sepultava qualquer dúvida: sim, a cobra iria fumar. O medo enfrentado na viagem fora justificável. Em 1942, dois anos antes do embarque dos brasileiros para o front, um único submarino alemão, o U-507, havia espalhado o terror no litoral do país ao torpedear cinco navios mercantes nacionais em um intervalo de três dias. A morte de mais de 600 patrícios causou tamanha comoção e revolta que dias depois o presidente Getúlio Vargas viu-se obrigado a abandonar a neutralidade e declarar guerra à Alemanha e à Itália, também responsável pelo afundamento de vapores brasileiros.
Avestruz brasileira sobrevoou os céus europeus Continua depois da publicidade Dois meses depois do primeiro escalão chegar a Nápoles, outros dois grupos pisariam em solo italiano, comandados pelos generais Osvaldo Cordeiro de Farias e Olímpio Falconiere da Cunha. Por fim, no ano seguinte, mais dois escalões juntariam-se aos anteriores, perfazendo uma força superior a 25 mil soldados, pequena diante dos milhões de homens que se debatiam por toda a Europa, mas grande para um país pobre e inexpressivo do ponto de vista militar. Sob o comando geral do general João Batista Mascarenhas de Morais, a FEB obteve suas primeiras vitórias em setembro de 1944, com a conquista das cidades de Massarosa, Camaiore e Monte Prano. As passagens mais marcantes, porém, estavam guardadas para o último ano de guerra. Em 1945, os pracinhas – diminutivo carinhoso para “praças”, como são conhecidos os militares sem graduação – participariam da tomada de Monte Castelo, Castelnuovo e Montese. Em Monte Castelo, a vitória só veio em 22 de fevereiro, depois de três tentativas frustradas sob o gélido inverno europeu, no fim do ano anterior.
Pracinha gaúcho conta: “Fomos caçados como animais” Já em Montese, entre os dias 14 e 16 de abril, a FEB encarou um tipo de combate diferente do que enfrentara até então, em meio a casas e sobrados fortificados. A situação favorecia os defensores, guarnecidos por armadilhas e equipados com suas “lurdinhas” – apelido dado pelos brasileiros às metralhadoras MG.42, que disparavam tiros com a mesma rapidez e fúria com que a noiva ciumenta de um dos soldados costumava lhe xingar. Em Montese, cada lugar a ser tomado exigiu enormes sacrifícios dos brasileiros, que ali totalizaram o seu maior número de baixas no conflito: 430, incluindo mortos, feridos e prisioneiros. Das cerca de 1,1 mil casas da cidade, mais de 800 acabaram destruídas. O historiador e especialista em II Guerra Mundial Luis Eduardo Amaral Rocha avalia que, apesar das importantes vitórias obtidas na Itália, a FEB foi injustamente tratada com desdém nas sete décadas que se seguiram à guerra: Continua depois da publicidade – Após a volta, devido ao curto tempo de ação no teatro de guerra, e por não ter tomado nenhum bastião de valor incontestável para mudar drasticamente o rumo do conflito, acabou-se jocosamente associando a participação brasileira a um passeio. Apesar da falta de reconhecimento da população em relação aos seus heróis, porém, um resumo da atuação da FEB não deixa dúvidas sobre a sua importância para o esforço de guerra aliado na Itália. Em sete meses e 19 dias no front, os brasileiros enfrentaram nove divisões nazistas e três italianas, obtendo vitórias relevantes como a captura da 148º Divisão de Infantaria alemã e da 90º Divisão Panzer, em um total de 14,7 mil prisioneiros, entre eles dois generais e cerca de 800 oficiais. Dos mais de 25 mil soldados da FEB, 465 morreram em combate e foram enterrados no cemitério de Pistoia, na Itália. Outros cerca de 3 mil ficaram feridos. Em 1960, os restos mortais dos combatentes foram transferidos para o Monumento Nacional aos Mortos da II Guerra Mundial, no Rio. As cinzas de um dos mortos permaneceram, simbolicamente, em Pistoia.
Conheça a história do ex-pracinha e da italiana que se conheceram durante o conflito e estão casados há quase sete décadas:
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