Estar com as contas em dia não é mais garantia de portas abertas no comércio. O consumidor pode não saber, mas empresários e lojistas estão analisando a combinação de 900 dados ligados ao CPF para decidir se, mesmo com o nome limpo, o cliente pode ou não comprar a prazo ou conseguir um financiamento.
Continua depois da publicidade
A Serasa Experian, empresa que, entre outros serviços, identifica os consumidores inadimplentes, criou um sistema que pontua o cliente. O concentre scoring, como é chamado o produto, classifica o consumidor como bom ou mau pagador.
Conforme a empresa, o serviço combina informações positivas e negativas sobre o consumidor como endereço, telefone, filiação, emissão de cheques sem fundos, dívidas com credores e instituições financeiras e hábitos de pagamento. A partir do perfil traçado, o software estabelece uma nota entre zero e 1000, sendo zero para o consumidor com maior probabilidade de não pagar a dívida dentro de um ano (veja o quadro).
Em um ano, o Juizado Especial Cível (antigo Juizado das Pequenas Causas) de Florianópolis recebeu 23 mil ações contra o sistema de pontuação. A quantia foi considerada uma enxurrada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina, somente comparável à onda de ações contra as empresas de telefonia móvel, há cinco anos.
Continua depois da publicidade
A resposta da Justiça aos processos tem seguido duas linhas diferentes, mas ambas a favor do consumidor. Há casos em que os juízes determinam a retirada do nome do autor da ação do sistema e outros em que o pedido de indenização, de até 20 salários mínimos (R$ 13,6 mil), é aceito. De acordo com o Tribunal, a indenização só é determinada caso o consumidor prove ter passado por algum constrangimento em razão da má avaliação no sistema da Serasa.
O advogado Fernando Costa, de Florianópolis, que trabalha hoje com 40 ações contra a Serasa, afirmou que encontrou informações erradas em seu próprio cadastro no site Consultas Express – não vinculado à Serasa.
– Minha renda presumida no sistema é de R$ 1 mil, com direito a um crédito de R$ 300. Mas meus rendimentos comprovados são maiores do que isso. Ou seja, cria-se uma análise de crédito totalmente inconsistente e pouco confiável, que afronta a legislação nacional – disse.
Continua depois da publicidade
Os magistrados de Florianópolis estão entendendo que os consumidores têm o direito de ter acesso às informações do banco para que possam também contestá-las.
Informações são presumidas
Os juízes de SC têm decidido a favor do consumidor nas ações contra a Serasa não por considerarem a ferramenta de pontuação ilegal, mas por entenderem que ela fere o Código de Defesa do Consumidor ao tornar as informações sigilosas.
Nesse sentido, a empresa, por meio da assessoria, afirma que as informações positivas dos consumidores (aquelas que mostram, por exemplo, o pagamento em dia das parcelas de um financiamento) são incluídos no cadastro apenas mediante solicitação do consumidor. O pedido, segundo a Serasa, poderá ser feito a uma instituição bancária, que irá repassar os dados à empresa.
Continua depois da publicidade
No caso das informações negativas (dívidas não honradas), a empresa ou loja credora informa a Serasa da inadimplência. Quando isso ocorre, o consumidor recebe uma carta, com um prazo estabelecido para negociar a dívida em questão. Ou seja, ele é informado sobre os dados relacionados a seu CPF.
A Serasa também reforçou que qualquer pessoa pode, gratuitamente, ter acesso a um resumo das informações pessoais por meio de um posto de atendimento da empresa.
A empresa confirmou ainda que nem pelo posto de atendimento ou pelo serviço pago que acompanha os CPFs (oferecido no site da empresa), o consumidor consegue, por exemplo, saber qual é o salário descrito no cadastro. De acordo com a Serasa, muitas informações, como a renda mensal, são presumidas.
Continua depois da publicidade
Sobre as ações judiciais, a Serasa disse que tem recorrido das decisões. Segundo o diretor jurídico da empresa, Silvânio Covas, o concentre scoring é uma ferramenta positiva para a economia brasileira e para os próprios consumidores, porque combate o superendividamento.