Aqui em Passa Passa Quatro, olhando a imensidão à minha volta, penso na finitude da vida. A morte não me é assustadora. Tantas vezes nos encontramos e tanto negaceamos que, a essa altura, até um trato existe entre nós.

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Importante é o tanto que a vida me ofereceu e eu não soube aproveitar. Ela passava diante de meus olhos com seus carros alegóricos, sua comissão de frente, seus tamborins, suas mulatas, e eu ali, à beira do palco, o coração ansiando por entrar na festa, mas a coragem não me vinha. Foi preciso me isolar neste rancho entre as paredes da biblioteca; foi preciso aprender com Dom Luís, o Mancha e os meus fantasmas; foi preciso atingir esta idade, para compreender que, sim, eu tinha direito ao que ela me ofertava.

Importante é o quanto eu fui amado e quanto receei me entregar a estes amores. Como se a todo tempo houvesse uma barreira tênue, invisível, que impedisse a exposição dos meus sentimentos. Vergonha de me mostrar fraco, quando esta fraqueza revelaria a força que eu carregava. Até hoje há um grito cravado em minha garganta insistindo em ser ouvido.

Importante não foi o mundo que eu moldei onde o quase e o talvez não permitiam que enfrentasse precipícios. Mas descobrir que saltar, livre e descompromissado, sem medo dos arranhões e fraturas, era o que a minha alma pedia. E eu perdi o meu tempo sem escutá-la.

De muita importância é do que me dou conta hoje: mais cobrei do que fui cobrado. O freio de mão puxado. A melancolia preenchendo o vazio dos dias. As noites cruzadas em ruminâncias e ansiedades. A impaciência queimando etapas. Foi imperioso que eu amasse para descobrir a dor e seu apetite.

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A imensidão à minha frente é a vida que teima em se revelar diante de meus olhos. E foi ela quem me ensinou o mais importante de tudo: cada ano que se desenha diante de nós é menos um ano que vivemos. Por isso, devemos aproveitá-lo ao máximo, sugando-lhe, até o bagaço, o último resto de sumo existente.

É para isto que somos feitos. Não para chorar pitangas.