Herdeiro do bacharelismo ibérico, que venera os bibelôs retóricos e abomina a objetividade, o Brasil construiu, ao longo de séculos, um carrascal de leis e regimentos que fizeram e fazem a alegria dos transgressores da lei.
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Está provado que o país não consegue materializar esta coisa chã e singela que é a conclusão, ao seu tempo e hora, de um processo criminal.
Ao cair da tarde de hoje saberemos se o país consegue aplicar ao rumoroso processo do Mensalão uma sentença terminativa ou se permanecerá como eterna fronteira aspirante a uma democracia madura, na qual prevaleçam o “espírito das leis” e o equilíbrio institucional, como os concebeu Montesquieu – os três poderes harmônicos e independentes entre si.
Quando luminares do Direito, magistrados da mais alta corte de Justiça do país – o “Pretório Excelso” -, transformam em tema de alta indagação jurídica a validade de uma alínea do seu regimento interno, para aplicar norma extinta por lei federal, o gongorismo bacharelesco chega ao seu desvario.
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Embargos infringentes só subsistem nos ácaros e no bolor de mentes que cultivam mais o adjetivo do processo do que a substância da lei.
O direito processual brasileiro é um granítico monumento à impunidade e à inobjetividade. Há nos códigos brasileiros mais “embargos” do que vírgulas. Eles podem ser embargos de nulidade ou infringentes; declaratórios ou de declaração; à execução ou do executado; à sentença ou à remição. Só não existem os embargos à falta de bom senso.
A justiça precisa ser feita ao seu tempo e à sua hora. “Justiça extemporânea é injustiça” – ensinava meu professor de “Introdução à Ciência do Direito”, o saudoso desembargador Marcílio João da Silva Medeiros. Ensinou-nos coisas simples e eternas, por exemplo: “A justiça é o equilíbrio entre a moral e o direito”.
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Lições que poderiam pautar o julgamento de hoje à tarde e o voto de minerva do ministro Celso de Mello. Caberá à Suprema Corte decidir entre preservar um alfarrábio subordinado e inexistente na hierarquia das leis ou subordinar a justiça do Brasil ao mais lamentável descrédito.
Se há algo a “infringir” na decisão de hoje é a credibilidade daquele que deveria ser o mais insuspeito dos poderes do Estado.