Quando o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, encerrou a sessão de quinta-feira, todos se voltaram para Celso de Mello, em cujas mãos ficou a decisão sobre novo julgamento a 11 réus do mensalão.

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Sereno, o decano da Corte diz já ter voto definido. Mas um dia depois de a votação terminar empatada em 5 a 5, a pressão cresce sem parar, em uma espécie de cabo de guerra pelo desfecho do histórico processo. Até mesmo no Congresso já há movimentos com o objetivo de influenciar o ministro.

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Nos bastidores do julgamento, circularam informações de que antes da sessão de quinta-feira Mello já vinha sendo procurado por interlocutores dos colegas contrários aos embargos infringentes – recurso que garante novo julgamento para réus que tiveram pelo menos quatro votos pela absolvição em um dos crimes – para convencê-lo a mudar seu entendimento.

Entre os argumentos usados por quem defende a rejeição do recurso, estava justamente a possibilidade de prescrição de alguns crimes e a chance de réus como o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu livrarem-se da condenação em regime fechado. Do outro lado, o conceito-chave é o direito dos condenados à ampla defesa.

Após a sessão de quinta-feira, Mello resolveu manter-se isolado. Mas há um receio entre interlocutores do Supremo de que ele mude seu voto justamente para evitar o desgaste com a opinião pública diante da possibilidade da reanálise de mérito de crimes como formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse acreditar que, qualquer que seja a decisão do Supremo, a “essência” do julgamento não será alterada:

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– Na essência, houve uma condenação por atos malfeitos. Imagino que isso continuará pesando no futuro.

Dentro do governo, a presidente Dilma Rousseff não se manifesta. O ministro da Educação, Aloizio Mercadante, já defendeu um segundo julgamento. O titular das Comunicações, Paulo Bernardo, fez o mesmo:

– Vamos acatar o resultado. Não sou jurista, mas a regra democrática diz que todos têm direito a um segundo julgamento.

No Congresso, senadores “independentes” e da oposição pediram ontem que Mello rejeite os embargos infringentes. O grupo usou a sessão do plenário em sucessivos discursos para pressionar o ministro.

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Presidente do DEM, o senador José Agripino Maia (RN) disse que o Supremo colocará em jogo a “credibilidade” do Poder Judiciário se determinar o recomeço do julgamento. Já o senador Pedro Simon (PMDB-RS) afirmou que a aceitação dos embargos demonstrará discrepância na aplicação do Código Penal:

– Imagina o banho, a catarata de água que cairá em cima da gente, o desânimo, o ridículo que vai ser o ano que vem, um ano eleitoral.

Entre os réus, nenhuma manifestação ontem. Na quinta, o criminalista José Luís Oliveira Lima, defensor de Dirceu, disse que o julgamento ” está aberto” e que não faria especulação pelo voto de Mello.

Voto decisivo pela segunda vez

Ter nas mãos o peso de desempatar uma decisão do STF não é novidade para Mello, que já sentiu a pressão no próprio processo do mensalão. Foi em dezembro de 2012, após empate em 4 a 4 no debate sobre a perda de mandato de deputados condenados.

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Na ocasião, Mello deu o voto de minerva pelo afastamento automático dos três parlamentares – João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT) -, dizendo caber à Câmara apenas declarar a perda do cargo, o que desencadeou uma crise entre Judiciário e Legislativo.

Mello, que foi pressionado e ouviu do então presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), ameaça de não cumprir a decisão, destacou ser “inadmissível” o não cumprimento de determinações feitas pelo STF.

“Não há nenhuma pressão. E quanto à responsabilidade, ela é inerente ao cargo e às funções. É preciso decidir e decidir com absoluta independência e independentemente do que pensa a opinião pública. Me pauto pelo respeito e pela reverência que sempre prestei à autoridade da Constituição” – Celso de Mello, decano do STF

Bafo na nuca

Além de réus e partidos, ministro virou alvo de colegas favoráveis e contrários à validade dos embargos infringentes

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Pela rejeição – Gilmar Mendes

Na quinta-feira, o ministro citou o voto dado por Celso de Mello no julgamento do ano passado para justificar que não há dúvidas em relação às condutas dos réus. Ao citar Mello, afirmou que “formou-se na cúpula do poder um estranho e pernicioso poder constituído para cometer crimes”.

Pela aceitação – Ricardo Lewandowski

O ministro conversou com Celso de Mello antes da sessão de quinta-feira e pediu sua autorização para usar, durante explanação no plenário, argumentos do decano a favor dos embargos infringentes. Mello autorizou e, durante a sessão, ouviu atentamente Lewandowski sem se manifestar.

Peso nos ombros – Marco Aurélio Mello

Responsável por empatar a disputa ao votar contra os embargos, referiu-se “ao peso descomunal” nos ombros do decano, que terá de desempatar a questão. Na sessão, olhou para o colega e disse: “Que responsabilidade, hein, ministro Celso de Mello?”.

Entenda o impasse

– A possibilidade de aceitar os embargos infringentes – recurso que garante novo julgamento para 11 condenados que tiveram quatro votos favoráveis à absolvição em algum crime – dividiu o STF.

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– Enquanto cinco ministros votaram a favor da validade dos recursos, outros cinco foram contrários. Com isso, a decisão ficou na mão do último a votar, Celso de Mello. Mais antigo integrante da Corte, ele anunciará a sua decisão na próxima quarta-feira.

– Se os embargos forem aceitos, poderão pedir novo julgamento, entre outros, ex-integrantes da cúpula do PT condenados por organizar o esquema de compra de apoio parlamentar no governo Lula.

– Entre os beneficiados, estão o ex-ministro José Dirceu, Marcos Valério e os deputados petistas José Genoino (SP) e João Paulo Cunha (SP). O novo julgamento, porém, não garante que eles serão absolvidos, pois o crime em questão será reavaliado.