Após uma intensa pressão nos bastidores, o projeto de lei complementar que define novas regras para a criação de municípios foi aprovado pelo Senado. A proposta abre a possibilidade de criação de pelo menos novos 180 municípios, que poderão se juntar às atuais 5.578 prefeituras e Câmara de Vereadores existentes no país. Já analisada pela Câmara dos Deputados, após ter tido um apoio quase unânime dos senadores, a matéria segue agora para sanção da presidente Dilma Rousseff.
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A proposta não define o valor a ser gasto para a adoção das novas estruturas administrativas, que vão abrigar prefeitos, vereadores e servidores municipais. Estimativas não oficiais, contudo, apontam cerca de R$ 9 bilhões em novos gastos. Isso tem preocupado o Palácio do Planalto, segundo admitem reservadamente parlamentares governistas. O Executivo não tentou barrar a proposta, já de olho nas eleições de 2014 e na necessidade de agradar as bases.
A votação às vésperas do ano eleitoral também influenciou o posicionamento dos senadores. Apenas o tucano Aloysio Nunes (SP), líder do partido na Casa, se declarou abertamente contra a proposta.
– Hoje há um número de municípios que já estão com seus limites de gastos absolutamente ultrapassados. Portanto, a situação do país não é a melhor nesse momento. Em outras circunstâncias de temperatura e pressão, poderia ser aceito – disse.
Ciente da falta de consenso na bancada, ele não orientou os senadores do partido a votarem contra, liberando a votação.
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Embora não tenha se manifestado contra a proposta, o presidente do DEM, senador José Agripino (RN), disse que o Senado vai arcar com o ônus de ter facilitado a “proliferação de municípios”. Inácio Arruda (PCdoB-CE) afirmou que a proposta cria regras mais rígidas para quem tem condições de se emancipar.
– Quem quiser fazer leitura equivocada, que faça.
Para o senador Valdir Raupp (PMDB-RO), relator do projeto, só quem nunca morou em distrito é contrário a essa proposta.
– Eu morei num distrito que depois virou cidade. Não vai prejudicar ninguém. Pelo contrário, vai favorecer. Não votar esse projeto é deixar relegada a população à própria sorte.
Até o senador Jader Barbalho (PMDB-PA), num raro pronunciamento, defendeu a aprovação da matéria, que, na opinião dele, ajuda as localidades desassistidas pelo poder público.
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Jader citou o exemplo de um município do Pará em que para chegar a um cartório de registro de nascimento ou imobiliário era preciso “praticamente dar a volta ao mundo”.
– Quem conhece este país, principalmente quem conhece a região Norte e Centro-Oeste deste país, tem a exata dimensão da necessidade da criação de novos municípios e quero mais, senhor presidente, dar o meu testemunho de que nestes municípios que foram criados as populações passaram a ter melhor assistência.
O peemedebista disse que não gostaria de encerrar o debate sobre o assunto sem dar o seu “testemunho” quanto à necessidade das populações que precisam “da presença do poder público neste país de dimensão continental”. Pelos registros do Senado, o senador paraense jamais fez um discurso da tribuna da Casa desde que tomou posse, em dezembro de 2011. A intervenção desta tarde, entretanto, foi feita de um dos microfones no plenário.
Novas regras
A proposta estipula novas regras para criação, desmembramento, fusão e incorporação dos municípios. A matéria foi apresentada em 2002 com o objetivo de regulamentar uma emenda constitucional que havia sido aprovada pelo Congresso seis anos antes. Para acabar com a farra na criação de municípios – aproximadamente 1,5 mil entre a Constituição de 1988 e 1996 -, a emenda tirou da esfera estadual a autonomia para estabelecer os critérios para o nascimento das novas unidades. A proposta de Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) objetiva estipular esses critérios.
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O texto define como “indispensável” a apresentação de um Estudo de Viabilidade Municipal (EVM), contendo análises de viabilidade econômico-financeira, político-administrativa e socioambiental e urbana da nova unidade, para prosseguir com o processo.
– De fato, este projeto é moralizador. Se esta lei já existisse há uns 15 anos atrás, cerca de 2,8 mil municípios não seriam criados – afirmou Cavalcanti.
Segundo ele, não há qualquer investimento da União ou dos Estados para criação desses novos municípios, uma vez que as unidades recém-criadas terão de ser autossustentáveis e contarão com o rateio dos recursos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) oriundo da divisão da antiga unidade.
O texto prevê todo um rito para se chegar à criação de um município. Primeiro, o pedido terá de ser encaminhado para a Assembleia Legislativa do respectivo Estado com o apoio de pelo menos 20% do eleitorado da área envolvida. Outra exigência é que cada localidade tem de ter uma população mínima para criar o município – na região Sudeste, por exemplo, mais de 12 mil habitantes.
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A ideia, segundo o autor, é impedir a criação de cidades como Borá, em São Paulo, que, segundo o censo do IBGE, tinha 980 habitantes em 2010. Em seguida, é preciso fazer o Estudo de Viabilidade Municipal (EVM) e comprovar, entre outras questões, que o novo município é capaz de cumprir as exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal. Após a conclusão dessa etapa, será realizado um plebiscito para consultar a população acerca das mudanças.