À espera de uma vacina contra Covid-19 já aprovada pela Anvisa e ainda não liberada pelo Ministério da Saúde, um grupo de famílias de todo o país segue em distanciamento social para proteger crianças de seis meses a três anos. A escolha de ficar em casa e manter os cuidados sanitários por medo das marcas deixadas pelo coronavírus envolvem abrir mão de um cotidiano social e do convívio com familiares e amigos há quase três anos.
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— É um preço bem alto que se paga por essa escolha, eu não tive momentos com meu filho de passear na rua com carrinho, fazer uma festa de aniversário, de levar ele para brincar com outras crianças. Tem, claro, toda a questão de saúde, mas também tem a renúncia de todos esses momentos, que são simples, mas que a gente perdeu. E esse tempo não vai voltar — conta Cecília Velloso, moradora de Florianópolis e mãe de um menino de dois anos.
A paranaense, moradora da Capital de Santa Catarina há mais de sete anos, viu o filho nascer poucos dias antes da pandemia se instaurar no país. Quando o Estado decretou o lockdown, em 17 de março de 2020, Nico tinha menos de 20 dias, e toda a família que estava em Florianópolis para auxiliar Cecília e o marido no início do processo de maternidade precisou voltar às pressas para a cidade natal. Desde então, Nico, que em 2022 comemorou dois anos de vida, viu os avós pouquíssimas e escolhidas vezes.
— Ficamos sozinhos, eu, o José [marido] e o bebê. Foi muito solitário porque éramos pais sem experiência. Naquela época não tinha máscaras ainda, não tinha álcool gel, nem teste de Covid. Então a gente não sabia o que iria ser, passamos a fazer tudo online e até hoje mantemos isso. O Nico não conhece os nossos familiares e amigos, apenas os avós, que com muito cuidado a gente liberou depois de um tempo, com todos os cuidados — conta.
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Desde 2020, 687 mil pessoas morreram em decorrência da Covid-19 no Brasil. Segundo estudo da Fiocruz, nos dois primeiros anos da pandemia, 1.439 crianças menores de cinco anos morreram após serem contaminadas pelo vírus, o que representa uma média de duas mortes por dia.
A análise do órgão em relação aos dois primeiros anos da pandemia no Brasil mostra que bebês de 29 dias a 1 ano de vida são os mais vulneráveis e correspondem a metade dos óbitos registrados no grupo analisado – menores de 5 anos.
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Apesar de Cecília e José terem tomado as três doses da vacina contra a doença, a escolha de ficarem quarentenados pelo filho exige cuidados sanitários com chegadas e saídas externas para feitos essenciais. Nico frequenta uma creche de Florianópolis, escolhida com muito critério pelos pais, desde abril deste ano, e o pai trabalha presencialmente, diferente de Cecília que consegue trabalhar de casa.
As saídas da residência são mantidas apenas para o essencial: trabalho e saúde. A compra de comida, geralmente, é feita de forma online e quando não, a família escolhe horários de menor movimento para ir ao mercado.
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— Pra gente é como se estivéssemos em 2020 ainda, nada mudou — disse.
Grupo de isolamento em todo o país
Junto com Cecília estão outras quase 150 famílias, que seguem também as medidas de isolamento desde o início da pandemia no Brasil e fazem parte de um grupo nacional na espera de vacinas para crianças de seis meses a três anos. Nas redes sociais, o grupo é acompanhado por aproximadamente 1,3 mil pessoas.
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Entre as famílias que participam do movimento, está Tatiane Coimbra, que foi quem começou o movimento na internet. Conforme o que conta, desde que iniciou os pedidos pelo imunizante, no início de 2022, muitas pessoas aderiram ao movimento de forma natural.
— A nossa primeira ação foi na luta pela aprovação da vacina para três a cinco anos. Aí foram chegando os pais com filhos menores e que ajudaram neste movimento. Essas famílias caminham para três anos de um isolamento severo, ainda sem vacina para essa população — diz.
Entre as famílias que compõem o grupo, algumas mantêm isolamento total sem sair de casa, outras saem apenas para atividades essenciais. As ações do movimento são discutidas por WhatsApp e feitas no Twitter e Instagram.
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Mais um ano em isolamento
Além da segurança do filho, Cecília também teme em pegar a doença, assim como o marido. Ele tem asma e ela utiliza remédio frequente para o coração. Apesar disso, e com tudo o que envolve a escolha de manter distanciamento social, a família passa ainda por julgamento contínuo de pessoas que a rodeiam.
— Por enquanto não estamos encontrando ninguém. E tá muito difícil! Eu perdi um tio pra Covid, é muito desesperador pensar que eu to privando a minha família de conhecer meu filho e privando meu filho também de conhecer essas pessoas que eu não sei até quando vão estar aqui, principalmente as mais velhas. As pessoas julgam como se fosse fácil, mas eu entendo que é pra segurança do Nico — conta.
— As pessoas não param para tentar refletir o que é necessidade. Eu estou tentando proteger a minha família e pagando o meu preço por isso — completou.
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Segundo Tatiane Coimbra, uma das criadoras do grupo de mães, a filha de quatro anos voltou para a escola apenas em setembro, há cerca de um mês, depois de tomar duas doses da vacina. A decisão da família, juntamente com a pediatra, aconteceu devido a um problema respiratório da filha não identificada pelos médicos, e a manteve em distanciamento social desde o início da pandemia.
— Meu marido deixou o trabalho que estava de forma presencial e ficou só com a empresa para estar em casa com ela. Quando voltou às aulas de crianças, no “boom” de casos da Ômicron, a gente conversou com a pediatra e decidimos que ela não iria para a escola antes de ser imunizada — diz.
— Eu estou indo trabalhar, sou professora, mas uso máscara o dia todo e não tiro ela na escola nem para beber água — conta.
Vacinação do grupo no país
A vacinação de adultos no Brasil começou em janeiro de 2021 e foi dividida por faixas etárias. Atualmente, o imunizante está disponível para pessoas a partir dos quatro anos e o único grupo ainda não incluído na campanha, apesar de ter sido liberado para receber a vacina, é o de crianças de seis meses a três anos.
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O imunizante para o grupo foi aprovado pela Anvisa em 16 de setembro, mas não liberado pelo Ministério da Saúde até a última semana, quando a pasta aprovou a compra das doses. Atualmente, apenas crianças acima de 3 anos podem se vacinar.
Na terça-feira (18), o Ministério da Saúde afirmou que as vacinas para crianças de seis meses a três anos devem chegar ao Brasil na próxima semana, dia 26 de outubro. Apesar disso, ainda não há data definida para a chegada das doses nos Estados e nem do início da imunização dessa faixa etária
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