Os mais de 42 mil alunos da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) retornam às aulas nesta segunda-feira para o segundo semestre letivo. Mas o reencontro de professores, servidores e acadêmicos ocorre em um clima de completa incerteza. Desde o início do ano, a UFSC, como as demais instituições federais de ensino superior do país, convive com um cenário de cortes e contingenciamentos de recursos.

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As alterações orçamentárias anunciadas em maio obrigaram a UFSC a adequar as contas para conseguir manter as atividades normalmente. O diretor-geral do gabinete do reitor, Alvaro Rojas Lezana, explica que até aqui a intenção foi poupar ao máximo os alunos dos impactos dos cortes no orçamento.

— A intenção foi prejudicar o mínimo possível. Temos muitas despesas com bolsas, por exemplo, mas não quisemos impactar nisso porque os alunos se mantêm com esse dinheiro e o impacto social seria muito grande. Isso para não falar no impacto acadêmico — pontua Lezana.

Com essa estratégia, a universidade optou por outras medidas, como a revisão dos contratos mais altos e a redução de editais de pesquisa e extensão.

Somente a revisão dos contratos resultou em redução de R$ 500 mil nas despesas do mês. Mas a economia está longe de resolver o problema causado pelos cortes. Com a corda já esticada e mais cinco meses pela frente, a universidade já não descarta consequências mais graves caso não receba ao menos parte dos valores bloqueados. Com isso, a previsão dada desde maio, de que agosto seria o prazo limite para manter as atividades com o orçamento reduzido, pode se confirmar.

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De agora para a frente, não sabemos. Nossa estimativa é de que, se o governo não liberar dinheiro, nós não passamos de agosto. Podemos até passar, mas em condições precárias. O que significa isso? Que eu posso deixar de pagar a energia elétrica três meses. Começam a ficar em risco questões básicas — projeta o diretor-geral da reitoria, Alvaro Rojas Lezana.

Nesta sexta-feira, o reitor da UFSC concedeu entrevistas em que garantiu o início do semestre, mas disse não saber como ficará a situação se o governo federal não liberar recursos. Em outros estados como o Mato Grosso, universidades federais já tiveram a energia elétrica cortada no mês passado por falta de pagamento.

A UFSC ainda não criou um plano de emergência para o caso de não receber os recursos bloqueados a partir deste mês, mas o diretor-geral mostra alguma confiança na possibilidade de que parte dos valores possa ser liberada. Na última semana, o secretário de Planejamento da universidade viajou a Brasília, onde teve reunião para tentar articular alguma liberação de valores, mas saiu da agenda sem qualquer previsão de liberação.

— Acreditamos que agora, com uma visão melhor da receita, o governo comece a liberar a partir deste mês alguma parcela. O governo não pode ser tão insensível à situação, a essa quantidade de gente que pode ser prejudicada — cobra.

Medidas já adotadas pela UFSC no primeiro semestre deste ano

– Fechamento do Restaurante Universitário aos fins de semana

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ATUALIZAÇÃO: o fechamento do Restaurante Universitário (RU) aos finais de semana é uma medida estudada pela reitoria, mas ainda não foi executada. Até as 18h25min de 5/8/2019, esta reportagem informava que a medida já havia sido adotada pela universidade. A informação inicial havia sido repassada pela diretoria da Reitoria da UFSC e foi corrigida.

– Redução de editais com bolsas para extensão e pesquisa

A universidade diminuiu o número de projetos em que os alunos desenvolvem pesquisas e recebem valores de ajuda de custo para equilibrar o orçamento.

– Renegociação de contratos

Os fornecedores que tinham contratos acima de R$ 500 mil ao ano foram chamados para renegociação. Alguns serviços foram reduzidos para que o valor também diminuísse. É o caso do contrato de limpeza e conservação, por exemplo. A frequência de limpeza dos banheiros, por exemplo, foi mantida, mas nas salas de aula foi reduzida. A mudança resultou em 11% de diminuição no custo do serviço, que custa à UFSC R$ 1,2 milhão ao ano.

No total, quatro contratos foram revistos pela comissão: limpeza e conservação, vigilância, portaria e cozinha. Com demanda menor, no entanto, as terceirizadas devem demitir. A UFSC estima o desligamento de 80 profissionais por causa das mudanças.

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No segundo semestre, a comissão pretende avançar a revisão para contratos de menos de R$ 500 mil ao ano.

– Cobrança para lavadores de carros

A permissão para que lavadores de carro trabalhem na instituição começou como um projeto social para auxiliar pessoas de baixa renda. No entanto, hoje, segundo o diretor-geral da reitoria, Alvaro Rojas Lezana, a iniciativa se desvirtuou e acaba gerando custos de água e energia. Por isso, a comissão estuda mudanças na resolução que trata sobre os lavadores de carros na instituição. A intenção é fazer com que esses prestadores de serviço paguem um valor para trabalhar na instituição.

Ministério da Educação diz não haver previsão para liberações

A reportagem entrou em contato com o Ministério da Educação para questionar se há alguma previsão de liberação dos recursos bloqueados para a universidade. Por telefone, a assessoria de imprensa informou apenas que ainda não haveria novidades e que a expectativa é por uma melhora na situação fiscal do país para que o Ministério da Economia decida sobre eventuais liberações.

Em seguida, por nota, afirmou que o decreto do contingenciamento visa o equilíbrio econômico-financeiro do governo federal e aponta que "no decorrer do exercício podem ocorrer revisões bimestrais das projeções de receitas e despesas, resultando em alterações nos limites estabelecidos pelo Decreto, com a possibilidade de, futuramente, ocorrer o desbloqueio dos orçamentos".

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Com a continuação do impasse, também o planejamento da universidade fica prejudicado. A própria adesão ao Future-se, programa lançado pelo governo federal como promessa de geração de receitas para universidades públicas federais, ainda não foi definida pela UFSC. Uma comissão interna avalia detalhes do programa e deve divulgar um posicionamento da instituição no dia 15.

— Esse problema acaba enfraquecendo a universidade. Porque como você vai planejar o futuro se não sabe como vai pagar as contas do mês seguinte? — questiona Lezana.

Entenda a polêmica dos cortes para as universidades federais:

R$ 45 milhões a menos

– Nas contas da UFSC, dos R$ 150 milhões que a universidade catarinense dispunha originalmente para as chamadas despesas discricionárias, de custeio, para pagar serviços como limpeza, energia elétrica e manutenção, e também para investir em obras e equipamentos, 30% foi retido pelo governo federal em maio. O percentual representa cerca de R$ 45 milhões que saíram do orçamento da universidade.

Emendas também pendentes

– A UFSC contabiliza ainda um valor de R$ 15 milhões de emendas parlamentares também contingenciados no início do ano, o que elevaria o bloqueio para R$ 60,1 milhões.

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Gastos obrigatórios

– Nas contas do governo, a contabilidade inclui também as chamadas despesas obrigatórias, como pagamentos de salários e benefícios de servidores inativos. Essa parte é gerida pelo governo federal, não está sob gestão dos reitores e não sofreu cortes. Por considerar também essas despesas obrigatórias, a União defende que o corte representaria apenas 3% do orçamento total das universidades, em vez dos 30% informados pelas instituições.

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