Bruno* celebrou a passagem para a vida adulta cumprindo medida socioeducativa. É assim chamada a pena para quem não tem idade suficiente para entrar no sistema prisional dos adultos. Ele responde com rapidez que em um mês e 20 dias estará em liberdade. Quer passar tempo com irmão de dois meses com quem pouco conviveu. Enquanto aguarda, “aproveita tudo”, diz ele. Está matriculado nas aulas de informática e do ensino básico que tinha interrompido no 9º ano. Há duas semanas passou a aprender também uma profissão no curso dedicado à auxiliar de construção civil. Além dele, outros 400 adolescentes terão a mesma oportunidade e vão terminar a medida com certificação. Passo importante para a ressocialização, que para Bruno já tem data para começar.

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As aulas que reúnem 10 menores em uma sala de aula no Centro Socioeducativo Regional de São José, na Grande Florianópolis, devem se estender até o começo de outubro e são oferecidas pelo Senai. A unidade já dispunha de atividades de educação para os internados. Eram ensinados a plantar e pintar, por exemplo. A diferença agora é que eles vão receber certificação pelo estudo. O que, segundo a diretora adjunta do Departamento de Administração Socioeducativa (Dease) Simone Rocha da Silva, faz toda a diferença para conseguirem um emprego ao deixar a unidade.

— Hoje a gente consegue atender aquele jovem que precisa ser reinserido no mercado de trabalho para a sua subsistência. É dar uma condição melhor para que esse adolescente consiga se orientar no término da medida — fala Simone.

A parceria com o Senai vai ensinar ainda costura, pintura e panificação para adolescentes que cumprem medidas socioeducativas em Criciúma, Chapecó, Florianópolis, Itajaí, Joinville, Lages, São José e São Miguel do Oeste.

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Na visão do coordenador do projeto no Senai, Rômulo Azevedo, as aulas ajudam a preencher uma lacuna que vem da indústria: a falta de mão de obra qualificada. Segundo ele, todos os cursos ofertados estão alinhados às demandas do mercado de trabalho.

— A gente está preparando esse jovem por meio da ressocialização, mas quando ele tiver reintegrado à sociedade que ele possa ter uma profissão e possa ter um futuro diferente. Para o Senai isso é mega satisfatório — comenta.

Importância da ressocialização

Sentado em uma das dez carteiras da sala de aula, Arthur* anota algumas das palavras-chave ditas pelo professor. Escreve que o que vê na tela branca é o telhado de uma casa. Registra também planta baixa, edificação e Rondônia, estado de origem do educador.

Aula de construção civil no Dease de São José
Aula de construção civil no Dease de São José (Foto: Catarine Duarte, divulgação)

— Isso aqui não é vida para ninguém — responde ao ser questionado sobre a vida encarcerado. 

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Ele participa de quase todas as aulas oferecidas na unidade, algo que é garantido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, o ECA.

Ressocialização nas cadeias de SC e o vínculo empregatício dos presos

O advogado criminalista e professor de Direito Penal, Guilherme Silva Araújo, explica que o ECA prevê que a escolarização e a profissionalização são direitos dos adolescentes privados de liberdade.

— Há previsão expressa de que o adolescente internado preserve todos os demais direitos, com exceção da liberdade em razão da privação temporária, justamente porque a medida socioeducativa deveria ser executada sob o viés pedagógico e não punitivo — explica.

A coordenadora da associação Gente da Gente, Claudia Lopes Costa, vê com bons olhos projetos como esse implementado em Santa Catarina. Contudo, ela avalia que é fundamental também a oferta de empregos para os que deixam o sistema prisional e socioeducativo.

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— Socialização para mim é o preso ter vaga de trabalho — diz Cláudia.

— Esse projeto de socialização dos presos é muito importante, mas ele tem que ser executado de acordo para atender realmente a questão prisional. Se o governo do Estado de Santa Catarina investir nesse projeto de fazer a melhor vaga de emprego — fala.

*Bruno e Arthur são nomes fictícios escolhidos para preservar os adolescentes

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