Como educadores no curso de medicina, temos que lembrar que não estamos formando médicos só para Joinville. Formamos profissionais para todo o País. Mais de 80% dos alunos do curso de medicina na Univille não são da cidade. São alunos do Brasil inteiro, de Tocantins, Mato Grosso, Rio Grande do Sul, São Paulo, entre outros centros.

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Determinadas pelo governo federal, as Diretrizes Curriculares dos Cursos de Medicina apontam que o médico termine a faculdade com uma formação geral, capaz de atender às necessidades básicas de todas as pessoas, sejam elas doentes e que precisam recuperar suas funções, total ou parcialmente, sejam todas as pessoas que precisam ser orientadas sobre como evitar a doença. E são pessoas de todas as idades e de ambos os gêneros que necessitam esta atenção. O médico formado com estes conhecimentos, habilidades e atitudes vê o paciente como um todo e enxerga a pessoa dentro do seu contexto social e ambiental.

Esta formação engloba o que é necessário para manter a saúde, para detectar precocemente a doença, para retornar à saúde quando esta faltar e para minimizar os danos funcionais da doença quando ela não tiver uma cura definitiva.

Outro aspecto importante a ser ensinado ao aluno de medicina é o gerenciamento e planejamento da saúde quanto aos recursos técnicos, humanos e financeiros necessários para a atenção. O projeto de curso de medicina da Univille segue as Diretrizes Curriculares. Inserimos muito precocemente o aluno na comunidade, nas unidades básicas de saúde e na prática da atenção à saúde. Já nos primeiros anos, ele começa a visitar as unidades básicas de saúde, para que tenha noção, do ponto vista teórico e prático, de como é que está organizada e como é a realidade da saúde pública do Brasil.

Hoje, temos uma tendência à redução de natalidade e a um aumento da expectativa de vida das pessoas. É, portanto, inexorável que as pessoas vão apresentar doenças que antes não se manifestavam. No século 19, por exemplo, quando as pessoas tinham uma expectativa de vida menor, provavelmente era muito raro encontrar câncer de próstata, de mama e outros tipos de doenças neoplásicas, que se caracterizam por aparecer especialmente em idades mais avançadas, uma vez que estão associadas ao envelhecimento celular.

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São os novos procedimentos, novas drogas e novas tecnologias em saúde de modo geral que fazem com que algumas doenças que antes eram fatais agora se tornem doenças, se não curáveis, pelo menos amenizáveis. Nesse sentido, há um número maior de pessoas portadoras deste tipo de enfermidade (doenças crônicas). A pessoa não está curada, mas está estável e viva. É isto que os alunos vão encontrar nos consultórios do futuro: doenças crônicas.

Paralelamente, os médicos devem estar preparados para as doenças crônicas, como a hipertensão arterial, por exemplo, que são multifatoriais, o que o obriga a enxergar o paciente como um todo e, como já dissemos, dentro do seu contexto social e ambiental. É preciso entender o paciente em seu domicílio, como ele vive, onde e como trabalha, como se locomove, quais seus hábitos alimentares, quais são seus hábitos de lazer. Não se pode mais perguntar apenas onde dói, é preciso perguntar o que ele faz, como é a sua vida.

Entender o corpo de modo integral

É um desafio grande o nosso, de educadores da área da saúde, o de formar o aluno para que ele veja e compreenda o paciente como um ser biopsicossocial.

Fazemos todos os esforços possíveis para que ele continue, até o final do curso, procurando entender o corpo humano de modo integral e integrado. Não só um olho, uma perna, um dedo, um ombro. O aluno vai precisar deste modo de pensar para cuidar da maior parte das doenças, pois a maioria delas pode ser tratada por ele, um médico de formação geral.

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Se observarmos países com melhores condições de saúde para a população, como na Europa e na América do Norte, eles já se voltaram para esse tipo de formação do profissional médico há bastante tempo. A formação do general practice (GP) – difere da conseguimos por enquanto na maior parte das escolas médicas brasieiras. O GP faz três ou quatro anos de residência voltada a uma formação geral, não a específica de um especialista.

Os estudantes têm que aprender a valorizar mais esse tipo de formação, que em hipótese alguma pode ser considerada menor. É preciso incentivar o crescimento e o aperfeiçoamento das residências médicas em saúde da família.

Os pacientes precisam ter acesso a locais atraentes para atendimento. Locais onde terão seu estado de saúde avaliado no momento de sua chegada, com a finalidade de identificar a gravidade e a cronicidade ou não do mal que os atinge. Evitaremos o excesso de procura aos serviços de emergência e urgência e os paciente que necessitarem serão encaminhados para um acompanhamento pessoal ou a distância (e eventualmente domiciliar) que tenha como objetivo aumentar o grau com que as recomendações de saúde sejam seguidas e o risco de agravamento do seu estado de saúde seja minimizado.

Num médio prazo, com esta iniciativa, teríamos muito menos pessoas procurando por prontos-socorros e postos de atenção.

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Na medida em que os profissionais da saúde, mais especificamente o médico, se interessam mais por seus pacientes, a resposta recíproca vem sob a forma de maior obediência às recomendações, e o resultado é o que todos esperam: mais saúde.

Assim, ao poucos, vamos colocando o paciente “certo” no lugar certo e com o médico certo. Esse é o caminho do ideal. Deveríamos em Joinville fazer uma experiência concreta deste modo, e sua íntegra, e a Univille está disposta e pronta para ser parceira do governo municipal.

O relacionamento médico/paciente

Atualmente, o curso de medicina da Univille tem uma unidade ambulatorial no Centro de Joinville que atende a mais de 7 mil pacientes do SUS por ano nas mais variadas especialidades, agendados via Secretaria Municipal da Saúde. É um local agradável, não há demora, e os pacientes são bem atendidos pelos acadêmicos supervisionados por professores, médicos especialistas.

O local de atendimento à saúde deve ser um lugar de alta resolutividade, em que o paciente vá com uma determinada queixa e saia do consultório já com seus exames ou procedimentos agendados. Não é realmente nada complicado de ser implantado com os recursos de informática disponíveis. O paciente se acostuma com aquele local no qual os problemas de sua saúde e os de sua família são resolvidos de modo eficiente e retorna. O relacionamento acaba sendo o que dele se espera: parceria e cumplicidade entre pessoas que buscam uma vida melhor.

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O médico consegue atender a mais gente porque ele não está trabalhando sozinho.

Isso é trabalhar, do ponto de vista de gerenciamento da saúde, de maneira organizada na forma de processos, como se faz nas grandes empresas. É um processo que diminui a probabilidade de dar errado em relação à atenção à saúde em todos os níveis.

Em Joinville, há muitos pacientes em filas de especialistas, mas boa parte deles talvez não precisasse se a estrutura toda fosse mais resolutiva e contasse com mais organização nos processos. É importante a percepção do ponto de corte exato, o momento em que isso sai da minha mão como generalista e passa para a do especialista. O foco tem que ser o paciente. Nem a doença, nem o médico, nem a instituição. O que eu, como pessoa/paciente, gostaria de ter como atenção médica? O que não me faz mais ser um “impaciente” quando procuro atenção à minha saúde?

O curso de medicina da Univille procura “contaminar” os professores, para que eles passem para os alunos a importância do bom relacionamento médico-paciente. A importância da empatia: eu procurando entender como o outro se sente para tratá-lo como eu gostaria de ser tratado.

Os alunos, agora com cerca de vinte anos de idade, viverão mais três vezes esta idade como médicos (mais 60 anos, talvez), portanto é preciso que eles gostem do que vão fazer quando se formarem, e eu devo confessar, isto não é nada difícil, pois ser médico, cuidar e relacionar-se com pessoas procurando o melhor para cada uma dela é algo realmente apaixonante. Ensinar a ser médico, então, nem se fala!

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CARLOS AUGUSTO CARDIM DE OLIVEIRA:: Dr. Carlos Augusto Cardim de Oliveira, pediatra e neonatologista, é médico formado pela faculdade de medicina da USP. Doutor em medicina pela USP, é atualmente chefe do departamento de medicina da Univille e professor de fisiologia e epidemiologia.

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