O hospital de Tijucas pode parar de atender pelo SUS em maio. O de Anitápolis acredita que até o fim do ano pode chegar na mesma situação. Em Alfredo Wagner, a chance também é grande. Em Angelina é preciso de ‘jeitinhos’ para manter o Nossa Senhora da Conceição aberto. Já em São Bonifácio é preciso vender rifas e fazer jantares para garantir a saúde da população. Em Santo Amaro, a população também corre risco de ficar sem hospital.

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Com exceção da Capital, a Grande Florianópolis tem 11 hospitais para atender os 581 mil habitantes dos 20 municípios. São pequenas instituições que geralmente não têm serviços mais avançados e nem dinheiro para se manter. Não é preciso falar com um administrador para saber qual o problema da saúde. Qualquer um que atenda o telefone nestes hospitais sabe: “é que a tabela SUS está defasada”.

A tabela SUS é aquela que remunera os profissionais de saúde com base em cada trabalho que fazem. O dinheiro provem dos impostos pagos. Os hospitais citados acima correm risco de fechar porque não conseguem achar o equilíbrio entre o salário que os médicos pedem e o dinheiro que conseguem pagar. Na teoria, quem deveria pagar o profissional e remunerar a instituição é o SUS. O problema é que os valores de pagamento para procedimentos básicos (como consultas e partos) são os mesmo desde 1995. A título de comparação, naquela época, o salário mínimo era de R$ 100. Genir José Backes, diretor do hospital de São Bonifácio resume a questão:

– Se depender da tabela SUS, a gente nem abriria as portas – afirma Backes.

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Sobrevivendo de ‘jeitinhos’

O hospital de São Bonifácio ainda sobrevive porque cerca de 35% da sua manutenção é paga pela prefeitura. Outra parcela semelhante provém do SUS. O restante é na base do jeitinho. Uma rifa aqui, um jantarzinho beneficente ali, doações acolá.

A instituição possui apenas dois médicos que também trabalham no posto de saúde e têm o salário dividido entre o hospital e a prefeitura. Segundo o diretor Genir José Backes, seria impossível manter um profissional exclusivo.

A 64km dali, as freiras que cuidam do hospital de Angelina precisam de muita lábia para manter os médicos, que até ajudam na manutenção da instituição. As administradoras não recebem salários, senão teriam que fechar as portas. Mesmo com convênio onde cinco municípios pagam os plantões, a casa convive com um déficit mensal de R$ 35 mil.

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-Temos apenas 35% de ocupação dos leitos, se fosse 100%, estaríamos na grota. Temos ciência de que desse jeito não vamos longe – lamenta a Irmã Maria Heerdt, uma das administradores do hospital de Angelina.

Investimento pesado das prefeituras

Alfredo Wagner tem um hospital mantido por uma fundação assistencial de saúde de trabalhadores rurais e o presidente Antônio Carlos Thiesen Sobrinho diz que se os médicos não fizessem alguma caridade aqui e ali, a instituição já teria fechado.

O jeitinho não é apenas nos hospitais particulares e filantrópicos. Os municipais precisam investir pesado para cobrir o que o SUS não paga. Em Canelinha, a cada R$ 10 que o município arrecada, R$ 1 vai para o hospital. Os outros R$ 9 é preciso pagar os salários dos servidores, posto de saúde, impostos, escolas, creches, quadras esportivas, saneamento, incentivos para empresas, ambulâncias para que casos mais graves sejam levados até Florianópolis e manutenção de praças, ruas, etc. A culpa, revela a diretora do hospital local, Marilita Micheli Gonçalves, é novamente a tabela SUS. Na cidade vizinha, Nova Trento, o dinheiro que vêm pelo sistema Único de Saúde, paga o salário de apenas um médico. É quase nada, já que o hospital local tem 12 para funcionar.

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É difícil manter, mas construir e reformar é fácil

Em Tijucas o presidente da Câmara de Vereadores, Luiz Rogério da Silva (PMDB) revela que alguns de seus pares desconfiam da idoneidade das contas apresentadas pela Divina Providência, mantenedora do hospital local. Há um déficit de R$ 86 mil mensais, mas em dezembro uma cozinha nova foi inaugurada. Em Alfredo Wagner, os médicos fazem caridade, mas recentemente uma ala foi completamente reformada. Em Angelina, uma obra de R$ 100 mil refez a cobertura do Nossa Senhora da Conceição. Todos, porém, têm dificuldades para pagar os médicos ou achar profissionais que se sujeitem aos salários possíveis de serem pagos.

Tal caso não é visto apenas em hospitais do interior. No Joana de Gusmão, a comunidade conseguiu construir e equipar oito salas de cirurgia, mas, até o momento, apenas uma está funcionando. O problema é também a falta de profissionais.

O único hospital que respondeu ter dificuldades para captar dinheiro a fim de fazer reformas ou investimentos foi o São Francisco, em Santo Amaro da Imperatriz. Por e-mail, o presidente do conselho de administração, Ordival Enock Costa, afirma que a estrutura física necessita de melhorias:

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– Os recursos para melhorias são prometidos, só prometidos.

Mais um hospital

A novidade é o anúncio de R$ 940 mil para começar a construir um novo hospital em São João Batista. Será o quinto, em um raio de 16km do vale do rio Tijucas. Todos com os mesmos serviços. No total, se gasta R$ 41

Para a diretora do hospital em Canelinha, Marilita Micheli Gonçalves, era melhor ter um hospital grande, com especialidades em apenas um dos municípios do que ter quatro hospitais fazendo a mesma coisa. É também a opinião da Irmã Enedina Sacheti, administradora da Divina Providência, em Tijucas.

– Antes tinha maternidade somente em Tijucas, agora todo hospital fica pagando médico pra fazer o mesmo serviço e acaba ficando muito caro – opina a freira.

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Para nascer, só pagando

Na Maternidade Chiquinha Galloti atualmente só atende grávidas que pagam para ter seus filhos. Via SUS, não há dinheiro pagar pagar os médicos. Para uma cesariana, a tabela SUS dá R$ 545,73 para dividir entre o médico, o hospital, o enfermeiro e o anestesista. Valdinéia Blau Ribeiro, que teve seu filho recentemente, para fazer o mesmo procedimento pagou R$ 2.500. Ela teve que gastar com consultas particulares, mesmo já pagando os impostos e poder fazer uso do SUS. Ainda sim teve fila.

A baixa remuneração faz com que clínicos gerais (espécies de ‘médico-faz-tudo’) tenham que realizar os partos. Em Anitápolis, não há obstetra, apesar do hospital estar cadastrado também como maternidade. Em Canelinha mesmo com aportes de R$ 140 mil mensais da prefeitura, ninguém quer ser o responsável pelo nascimento de bebês.

Só em São João Batista

No Vale do Rio Tijucas, para ser atendido pelo SUS, a grávida deve fazer pelo menos seis consultas em São João Batista e ter o bebê nesta cidade. É o único hospital que possui este serviço entre as quatro instituições que existem no local.

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Com seu filho nos braços, Valdinéia resume a situação de tijuquenses, nova trentinos, canelinhenses e majorcinenses:

-Está bem difícil para todo mundo.

Situação dos Hospitais da Grande Florianópolis:

Alfredo Wagner – Corre risco de fechar. Médicos estão ‘fazendo caridade’ para o hospital funcionar. R$ 30 mil de déficit mensal. Teve reforma de R$ 150 mil recentemente.

Anitápolis – Pode fechar até o fim do ano e não consegue contratar obstetras. Tem déficit mensal de R$ 40 mil. Média de 30% dos leitos ocupados. Teve uma pequena reforma recentemente.

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Angelina – Há médicos mais antigos que aceitam trabalhar, mas se houver mudanças, a situação pode ficar bem difícil. R$ 35 mil de déficit mensal, 35% de ocupação dos leitos. Teve reforma recente de R$ 100 mil.

Canelinha – Não corre risco de fechar porque a prefeitura cobre o déficit de R$ 80 mil mensais. Não consegue arranjar obstetras e tem boa estrutura.

Nova Trento – Não tem obstetras pelo SUS e a prefeitura cobre todos os gastos. O dinheiro do SUS não dá de pagar nem um médico.

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Santo Amaro da Imperatriz – A direção afirma que corre risco de fechamento já que há R$ 32 mil de déficit mensal. Em média, por mês são feitas 1.260 procedimentos no Pronto Atendimento e 341 cirurgias.

São Bonifácio – Depende do dinheiro da comunidade. Faz rifas e jantares para pagar as dívidas. O salário dos médicos é dividido com a prefeitura. A ocupação média é de 50% dos leitos.

São João Batista – É uma autarquia municipal, ou seja, os déficits são pagos pela prefeitura. Atualmente é o único hospital do Vale do Tijucas que atende como maternidade pelo SUS.

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São José – O Hospital Regional divide com o Celso Ramos a responsabilidade de receber os pacientes de toda a região.

São Pedro de Alcântara – Hospital mantido pelo Estado que é especializado em doenças de pele.

Tijucas – O hospital de 71 anos ameaça parar de atender pelo SUS em 5 de maio. Não tem obstetras atendendo pelo SUS e possui um déficit de R$ 86 mil mensais.