Robôs com inteligência altamente desenvolvida acessíveis à população e dirigíveis mais velozes do que aviões são conquistas tecnológicas não alcançadas no presente. No entanto, já foram comuns no passado – ao menos no passado descrito nas narrativas de três escritores de Santa Maria, cidade que se converteu em um dos polos mais ativos da literatura steampunk no Brasil.

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Estilo de ficção fantástica que combina avanço científico e técnico com cenários históricos, mais comumente do século 19, o termo steampunk faz referência ao cyberpunk, subgênero da ficção científica que fez sucesso no mercado editorial dos anos 1980. Na mesma década, começaram a aparecer publicações que, ao invés de explorar o desenvolvimento da cibernética no futuro, trabalhavam com a hipótese de hiperdesenvolvimento da tecnologia a vapor no passado, logo apelidadas de steampunk (algo como “vaporpunk”).

Autores de Santa Maria explicam o steampunk:

– Uma das grandes dificuldades de trabalhar com narrativas de história alternativa, como o steampunk, é pensar como o mundo seria se determinada tecnologia fosse possível ou se os rumos da história tivessem sido diferentes. Ao mesmo tempo, é esta dificuldade que motiva o autor. É como brincar de Deus. Você pode tentar responder perguntas como: “E se a França, e não a Inglaterra, fosse o motor da Revolução Industrial?” – explica André Zanki Cordenonsi, que explorou a questão no recém-lançado Le Chevalier e a Exposição Universal.

Apesar de ter convivido na infância com Nikelen Witter, foi só na idade adulta que ambos descobriram o interesse mútuo por literatura, quando a escritora já havia publicado contos com a estética steampunk. Juntos, começaram a organizar eventos a respeito do tema e logo foram descobertos por Enéias Tavares, que se agregou ao grupo. Desde 2014, os três mantêm a única loja do Conselho Steampunk no Rio Grande do Sul, organização criada em 2008 por leitores para divulgar o steampunk no Brasil, presente atualmente em 13 estados.

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– Não é uma loja física. É uma irmandade que organiza eventos e serve como referência para novos interessados – explica Tavares, autor de A Lição de Anatomia do Temível Dr. Louison.

Além de debates, piqueniques e outros encontros no Estado, o trio está presente em eventos nacionais sobre ficção fantástica e avisa: está trabalhando a seis mãos em uma narrativa, que deve chegar às livrarias no próximo ano.

Potência máxima

-Os santa-marienses André Zanki Cordenonsi, Enéias Tavares e Nikelen Witter estarão na SteamCon, convenção nacional de fãs de steampunk, em Paranapiacaba (SP). No dia 9 de agosto, o trio participa de um bate-papo sobre a produção steampunk brasileira.

-Cordenonsi e Tavares apresentarão o painel “A Ascenção do Steampunk” na ComiCon RS, em 22 de agosto, em Canoas. No encontro, os autores comentarão a estética steampunk nos quadrinhos.

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-O trio de escritores gaúchos está trabalhando em sua primeira criação coletiva. Com o título provisório de Guanabara Real, o livro apresentará uma agência de investigações no Rio de Janeiro do século 19, tendo como detetives uma ex-batedora de carteiras, um cientista e um dândi místico. A publicação deve sair no próximo ano, pela editora Avec.

CONHEÇA OS AUTORES

Enéias Tavares

Autor de 33 anos, estreou na literatura no ano passado com A Lição de Anatomia do Temível Dr. Louison (Casa da Palavra, 320 páginas,

R$ 34,90). A aventura se passa em Porto Alegre, no início do século 20, uma cidade com céus dominados por gigantescos dirigíveis e pelo vapor cinzento de fábricas e bondes. Professor de Letras na UFSM, Tavares usa personagens da literatura brasileira no seu livro, que deve ser seguido de mais quatro volumes e um guia de referência.

Nikelen Witter

Publica contos em coletâneas steampunk desde 2011, além de inserir elementos da mesma estética no romance infantojuvenil Territórios Invisíveis (Estronho, 368 páginas, R$ 49,90).

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– Como sou estudiosa do século 19, o steampunk acabou sendo uma forma confortável de escrever ficção científica, a partir de um outro ponto que não aquele das naves-espaciais ou da engenharia genética – explica Nikelen, 41 anos, historiadora e professora de Moda na Unifra.

André Zanki Cordenonsi

Acaba de publicar o livro Le Chevalier e a Exposiçao Universal (Avec, 192 páginas, R$ 29,90), ambientado na França do século 19, com autômatos inteligentes movidos a corda pululando entre a multidão, como robôs acessíveis à população.

– Comecei a ler steampunk com o álbum em quadrinhos A Liga Extraordinária, de Alan Moore. Flertava muito com coisas de que eu já gostava, como Julio Verne, H.G. Wells e Conan Doyle – conta Cordenonsi, 40 anos, professor de Arquivologia da UFSM.