As décadas de experiência no mar são percebidas em cada ajuste na imensa rede sobre a areia. Com 65 anos de idade, mais da metade dedicada à pesca, seu João Manoel Rocha sabe que é hora de acelerar o minucioso trabalho. A safra da tainha no Sul e Sudeste do país começa oficialmente hoje, e ontem foi dia de deixar tudo em ordem no barracão na praia do Estaleiro, em Balneário Camboriú. Nativo da região e legítimo representante do modelo artesanal, voltado principalmente para o próprio consumo e para o pequeno comércio local, ele não tem dúvidas sobre o que esperar desta temporada de captura, que vai até 30 de julho:

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– Vai ser boa. Vai ser bem melhor que a do ano passado.

E João não está sozinho na esperança de recuperação em relação à safra anterior. As frotas industrial e artesanal – principalmente a artesanal – não prometem resultados históricos, mas acreditam em um desempenho razoavelmente superior ao registrado em 2013. A aposta é em boas condições climáticas, com frio e vento trazendo peixes em maior quantidade da Lagoa dos Patos, no Rio Grande do Sul (maior criadouro do Brasil), e do estuário do Rio do Prata, na divisa do Uruguai com a Argentina.

– Ano passado a meta da pesca artesanal era capturar 1,5 mil toneladas e fechamos com 1,2 mil toneladas. Para 2014 o objetivo já subiu para 1,8 mil toneladas, o que seria uma safra de razoável para boa – destaca o presidente da Federação de Pescadores do Estado de Santa Catarina (Fepesc), Ivo da Silva.

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Dificuldades

O setor industrial não trabalha com projeção em números, mas também aponta que a safra deve ser melhor em 2014. A expectativa é superar as estatísticas do ano passado, quando 1.227 mil toneladas de tainha foram capturadas, conforme dados consolidados do Grupo de Estudos Pesqueiros da Univali (GEP). As dificuldades para alcançar um saldo ainda melhor são semelhantes a de outras temporadas.

– A limitação de área para atuação dos barcos, a no mínimo 5 milhas (cerca de oito quilômetros) da costa, influencia muito a pesca industrial. Além disso, o número de apenas 60 licenças para a frota de todo o Sul e Sudeste também prejudica uma safra maior – explica o presidente do Sindicato dos Armadores e das Indústrias de Pesca de Itajaí e Região (Sindipi), Giovani Monteiro.

Conforme o Sindipi, 45 licenças tinham sido liberadas até a tarde de ontem e pelo menos mais 10 chegariam até a manhã de hoje. Os documentos restantes teriam apresentado problemas e um novo edital deve ser aberto para ocupar estas vagas. Na modalidade artesanal, a Fepesc informou que 77 das cerca de 300 licenças solicitadas em Santa Catarina faltavam ser expedidas até ontem.

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Falta de informações prejudica projeções e controle da safra

Embora as condições climáticas sejam cruciais para a safra da tainha, uma quantidade maior de informações sobre o peixe e as condições de reprodução e migração também seriam importantes para projetar e controlar melhor a captura. Essa é a avaliação do presidente do Sindipi, Giovani Monteiro. Para ele, a ausência de estatísticas e de um acompanhamento acadêmico e científico da tainha dificulta o planejamento.

– Infelizmente não se sabe o quanto de biomassa de tainha existe. O ideal seria fazer um estudo, um acompanhamento da safra com observadores indo junto com as frotas. A partir daí se estimaria o tamanho do cardume e o quanto poderíamos capturar sustentavelmente, estipulando cotas para a pesca, por exemplo – pondera.

Doutor em Ciências Naturais e pesquisador do Grupo de Estudos Pesqueiros da Univali (GEP), Paulo Ricardo Schwingel tem opinião semelhante. Ele comenta que a média histórica da pesca industrial da tainha é de 2,5 mil toneladas, mas que não é possível fazer uma projeção ano a ano por falta de análises da espécie.

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– Deveríamos saber quais as condições destes estuários da tainha, como a Lagoa dos Patos, mas não existem dados atuais – afirma.

Capturas dos últimos 10 anos na pesca industrial* – (Ano/Toneladas)

2004: 2.641

2005: 3.115

2006: 1.080

2007: 6.396

2008: 2.038

2009: 4.121

2010: 3.308

2011: 3.043

2012: 1.511

2013: 1.227**

Fonte: Grupo de Estudos Pesqueiros (GEP) da Univali

*A pesca artesanal não tem estatísticas oficiais

**Ainda faltam ser contabilizados alguns números para fechar este índice em 2013, mas segundo o GEP, o dado está muito próximo do que será o resultado final