Maeive e Kemele não se desgrudavam. Aonde uma ia, a outra se deslocava atrás. As duas vestiam kimono. O de Maeive, 12 anos, era azul. O de Kemele, de 9 anos, branco. As amigas da Chico Mendes, que com outras comunidades forma o bairro Monte Cristo, na área continental de Florianópolis, tiveram um sábado especial. Elas iriam se enfrentar em uma das lutas do 1º Fight Geração da Chico, que ocorreu na quadra de esportes da comunidade.

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O evento beneficente, que ainda teve apresentações artísticas e culturais, além de uma festa junina que entrou a noite, foi de estímulo ao esporte e de solidariedade para que crianças da região tenham cada vez mais condições de praticar artes marciais e menos tempo ociosas pelas ruas.

Com ingressos a R$ 20, para depois os valores serem revertidos na compra de equipamentos para os treinos da garotada, como quimonos, luvas, bandagens, protetores bucais e capacetes, o evento reuniu gente de todas as idades que lotaram o interior do pequeno ginásio onde um octógono foi instalado para as lutas.

Fundadora e coordenadora do Geração da Chico, a psicóloga Ana Karolina Dias de Oliveira esperava que até 800 pessoas passassem pelos confrontos e a festa junina. Festa, aliás, que teve todos os ingredientes de comunitária, pois foram as pessoas da Chico Mendes que se mobilizaram para comprar os ingredientes e produzir pipocas, cachorros-quentes, doces e refrigerantes que fizeram a alegria dos presentes ao evento.

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— Foi tudo feito pelo pessoal da comunidade, não tem apoio de prefeitura, de vereador, de ninguém. Foi a gente da Chico que fez o evento para o povo da comunidade, e ainda bem que a chuva deu um tempo e o sol voltou — comemorava Komay MC, líder comunitário da Chico Mendes, lembrando das apresentações de dança de rua, rap e hip-hop, sempre com a participação de jovens moradores da comunidade.

Oportunidade de conhecer um esporte

E enquanto o som rugia no ginásio e o clima esquentava no octógono, lá estavam Maeive e Kemele aguardando pelo momento de lutarem pela primeira vez uma contra a outra. Mais experiente, já que pratica jiu-jitsu desde o início do projeto social Geração da Chico há três anos, Maeive destacava a força e velocidade da oponente Kemele, que só fizera três aulas de jiu-jitsu antes de competir contra a amiga do bairro.

Ambas admitiram um “friozinho na barriga” antes de entrarem no octógono, mas tiraram de letra a pressão para mostrar que o mais importante não era a vitória, mas sim a oportunidade de conhecer um esporte e através dele ganhar disciplina, organização e, acima de tudo, melhorar as notas na escola.

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— Eu treino jiu-jitsu e muay thay, e no projeto da professora Karol também faço aulas de teatro. Até na escola eu estou melhor porque a professora não deixa a gente treinar se as notas não estiverem boas — conta Maeive.

Jovem busca apoio para seguir competindo

Uma das melhores lutas do 1º Fight Geração da Chico foi entre Matheus Lamarque e Gabriel Assunção. Lamarque, 18, morador do bairro Dona Wanda, em São José, liquidou o combate até então equilibrado com um chute alto de canhota que derrubou o oponente. Após vencer e receber os cumprimentos de amigos e o treinador, já planejava os próximos compromissos da carreira que está começando: uma viagem a São Paulo para lutar em um evento nacional e outra luta em Alfredo Wagner, na Grande Florianópolis.

— Esses são meus dois próximos compromissos — resumiu, antes de dizer que a maior dificuldade não é encarar outros lutadores no octógono, mas conseguir dinheiro e apoio para seguir competindo e evoluir.

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Como outros jovens atletas que participaram do evento na Chico Mendes, Lamarque também não tem apoio de nenhum empresário e, muito menos, do poder público, no caso a prefeitura da Capital ou até o governo do Estado. Mesmo assim, Lamarque se considera um sortudo, já que sua mãe o ajuda como pode para ver o filho seguir em frente.

Sabe, contudo, que se recebesse mais apoio e condições de trabalho ele – e tantos outros jovens de comunidades carentes da região – poderiam alçar voos muito mais altos.

— É difícil seguir em frente sem apoio, mas a gente não desiste, segue correndo atrás e esperando que as coisas melhorem — ensina o jovem.

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