Rogério Ferrari é um especialista em registrar minorias que são maiorias. Andarilho do projeto Existências-Resistências, já fotografou o cotidiano de palestinos, curdos, sem-terra, zapatistas e do povo do Saara Ocidental. Agora, faz uma visita à infância com o livro Ciganos, que será lançado hoje, às 19h, na Fundação Cultural Badesc em Florianópolis.
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O fotógrafo tem uma ligação muito forte com o povo cigano. Foi na Céu de Estrelas, loja de tecidos dos pais, que era o ponto de encontro dos amigos na pequena Ipiaú, no sul da Bahia, que se deu conta da existência deles. O povo de dentes dourados e roupa colorida que quando chegam numa cidade despertavam medo, desconfiança e até encantamento dos moradores sempre esteve muito perto dele.
Sempre houve e até hoje há um certo descontentamento na vizinhança quando começa a montagem de um acampamento de ciganos. Não são poucas as lendas em torno deles: que roubam crianças, enfeitiçam mocinhas, dão golpes e se as mulheres não são remuneradas com dinheiro ou presentes, ao ler a mão de algum incauto, é azar na certa.
Ferrari diz que foi salvo pelo pai: aprendeu a olhar os ciganos sem preconceito. Esse jeito transparente de respeitar as diferenças é quase uma filosofia de vida. Ele chega perto o suficiente para fotografar, mas mantém distância para não interferir.
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É isso que o livro revela. A seleção de imagens recolhidas em três meses, num exercício de nomadismo por 40 municípios da Bahia, mostra que os ciganos que ainda circulam pela região são os mais pobres, que vivem de favores dos prefeitos que autorizam o uso de um terreno por um determinado período.
Mas quem é essa tribo que age de acordo com as suas regras, rituais, dificuldades e que fala uma língua própria? É isso que Rogério interpreta nas cenas que capturou.
No passeio pelas imagens o fotógrafo mostra ao leitor detalhes da cultura cigana, como a divisão entre o puro e o impuro. Isto se reflete no interior das barracas, onde há organização e as panelas estão sempre brilhando. Do lado de fora, não há nenhuma preocupação com o lixo.
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O fotógrafo acredita que, apesar da longa presença histórica desse povo no Brasil, a visão que se tem dele ainda é marcada pela intolerância e baseada em estereótipos. Com o intuito de desconstruir o preconceito, Ferrari fez um trabalho fotográfico que “parece incorporar princípios tipicamente ciganos de estar e lidar com o mundo”, segundo escreve a antropóloga Florencia Ferrari, autora do prefácio.
Rogério Ferrari nasceu em 1965, e desde os anos 1980 tem viajado para zonas de conflito territorial no mundo. É formado em Antropologia pela Universidade Federal da Bahia, trabalhou para veículos nacionais e internacionais como Veja, Carta Capital, Áccion e Reuters.
O livro traz um mapa e texto do autor sobre as condições em que vivem os ciganos e como expressam e mantêm a identidade própria. Para o Espaço Fernando Beck, da Fundação Badesc, Ferrari escolheu 24 imagens que ficam expostas para visitação do público até o dia 10 de março.
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Ciganos, de Rogério Ferrari, Projeto gráfico Flávia Bomfim, Editorial Movimento Contínuo, 196 págs., R$ 70
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O quê: lançamento do livro Ciganos, de Rogério Ferrari, e exposição de 24 imagens da obra
Onde: Fundação Cultural Badesc
(Rua Visconde de Ouro Preto, 216, Centro, Florianópolis)
Quando: lançamento hoje, às 19h. A exposição segue até 10 de março