Olhar cansado, rosto sério, rugas na face. Um papa melancólico passou nesta manhã a cinco metros de onde estava, à direita da basílica, na Praça de São Pedro. Por alguns instantes, todas as especulações sobre os motivos da renúncia de Bento XVI _ escândalos, pressões, corrupção – caíram por terra. Fui tomado de emoção – e quase também de uma certeza: sim, o Papa desistiu do trono de São Pedro porque está velho e cansado. Seu olhar me disse isso.
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Mais do que o seu olhar, na verdade. Sua fala pausada, em alguns momentos de difícil compreensão, passa a impressão de um homem em meio a um turbilhão psicológico e físico. Um Pontífice menos Deus diante de nós. Um Papa mais humano se apresentou pela última vez aos fiéis.
– Tomei a decisão consciente da gravidade. Mas não desisti da cruz _ fez questão de afirmar.
De perto, Bento XVI me pareceu mais velho do que seus 85 anos. Movimentos lentos até para aproximar seu rosto dos dois bebês que lhe foram alcançados para bênção, no meio do trajeto do papamóvel. Ao desembarcar do veículo e caminhar até o altar, a Praça de São Pedro inteira o seguia com os olhos. Na verdade, a praça inteira torcia para que ele conseguisse completar seu caminho, passo a passo, lentamente. Sem quedas, sem tropeços.
Foi uma multidão respeitosa a que se despediu do Papa. Mais do que respeitosa, foi uma multidão que, em alguns momentos, chorou pela imagem que viu. O sofrimento de Bento XVI é diferente do de João Paulo II. É interno, como se sua alma estivesse doente.
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Pela primeira vez, Bento XVI falou mais detidamente sobre seus motivos da renúncia: voltou a dizer que tomou a decisão livremente e que o fez não pensando em seu próprio bem, mas da Igreja. Em uma de suas manifestações em português, afirmou, com tom de desabafo:
– Em 19 de abril de 2005, eu sabia que o peso sobre minhas costas seria grande.