Entre as muitas imagens chocantes produzidas pelas mudanças climáticas mundo afora está a foto produzida por satélite em que é possível ver a fumaça dos incêndios florestais no território brasileiro, cobrindo desde a Amazônia até a Região Sudeste. Há algumas semanas, a fumaça se espalha pelo mesmo trecho percorrido pelos chamados rios voadores, levando o pesquisador e biólogo Lucas Ferrante, da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) a afirmar que “nossos rios voadores foram transformados em rios de fumaça”. As informações são de O Globo.
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“Estamos vendo o início do fim do nosso modo de vida, que pode levar a desdobramentos graves, com colapso do agronegócio no Sul e no Sudeste, falta de água para a população e desastre ambiental”, acrescenta o pesquisador.
Os rios voadores são vitais para o clima da América do Sul, pois são formados pela umidade gerada pela evapotranspiração das árvores na maior floresta tropical do mundo, a Amazônia. Eles percorrem o território do Norte pelo Oeste do Brasil, empurrados por correntes de ar, e fazem chover em estados como Paraná, São Paulo e Minas Gerais, além de Argentina e Paraguai.
Rios voadores geram até 70% das chuvas no Sul e Sudeste
Para ter uma ideia da importância desses “rios”, estima-se que a vazão deles seja superior à do Rio Amazonas, o maior do mundo, com 200 mil metros cúbicos de água por segundo.
Conforme o pesquisador Lucas Ferrante, até 70% das chuvas no Sul e no Sudeste do país são geradas pelos rios voadores. Sem eles, o Paraná e o interior de São Paulo não seriam potências agrícolas.
Ferrante é autor de vários estudos sobre os prejuízos do desmatamento para a Bacia Amazônica e o país, e alerta sobre a perda de vazão dos rios voadores. Ele explica que algumas partes da Amazônia, por causa do desmatamento, já não são mais capazes de exportar água. Com isso, o regime de chuvas no Sul e no Sudeste está sendo afetado, gerando declínio na população de animais nativos da Mata Atlântica.
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Além disso, o setor agropecuário também está sendo afetado. No Norte e Noroeste do Paraná, áreas dentro da zona de atuação dos rios voadores, houve uma queda na produção de soja de até 25% no início deste ano e quebra de safra do milho, causadas pela estiagem na região.
“Pior vai ser quando o problema gerar desabastecimento de água para a própria população. O Sistema Cantareira, por exemplo, que abastece a Grande São Paulo, depende diretamente desse transporte de umidade da Amazônia. A parte mais vulnerável da população vai morrer de sede” , prevê.
Termo surgiu no início do século 21
O termo “rios voadores” surgiu de forma espontânea, quando o climatologista peruano José Marengo, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), conversava com o aviador e explorador inglês Gerard Moss, tentando explicar para ele como funcionava o transporte do vapor de água expelido da Amazônia para a parte de baixo do território nacional.
A partir daí, o termo se popularizou na ciência, e o piloto inglês radicado no Brasil criou o projeto Rios Voadores, em 2007. Conduzindo um monomotor, Moss seguia esse corredor aéreo de umidade da Amazônia até o Sudeste, coletando amostras para análise.
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Há mais de dez anos, por volta de 2014, pesquisadores alertavam que o desmatamento punha em risco a manutenção dos rios voadores para o regime de chuvas no Brasil. O cientista Antônio Nobre dizia naquela época que o desmatamento da floresta reduziria sua transpiração e agravaria a seca no país.
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