Aos 54 anos, o ex-bancário Ricardo Freitas nega ser um sindicalista profissional, mas o histórico desmente. Sem nunca ter dirigido um ônibus ou trabalhado como cobrador, é assessor no Sindicato dos Trabalhadores em Transporte Urbano, Rodoviário, Turismo, Fretamento e Escolar (Sintraturb) desde maio de 1997. Apesar de oficialmente ter cargo secundário, é quem comanda a categoria nas paralisações e foi quem liderou o movimento que havia determinado o funcionamento dos ônibus das 7h às 19h de sexta, antes do acordo que estendeu o horário até as 23h. No currículo de sindicalista, ainda há a diretoria do Sindicato dos Bancários de Florianópolis (ocupou o cargo entre 1986 e 1996).

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Hoje, além da assessoria na Capital, também trabalha para a categoria em Araranguá e Blumenau. Tentou carreira política duas vezes, como vereador na Capital. Não conseguiu se eleger. Em 1996 e 2000, ficou como 2º suplente.

Confira os principais trechos da entrevista de pouco mais de 40 minutos, dada à reportagem do Diário Catarinense no início da noite de sexta-feira.

Diário Catarinense – Qual era o sentido da maior restrição aos horários dos ônibus justamente no momento em que eram ampliadas as escoltas?

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Ricardo Freitas – Para forçá-los a ter vergonha na cara e responsabilidade.

DC – De quem o senhor está falando?

Freitas – Principalmente do governo estadual. O secretário (Valdir) Cobalchini (Infraestrutura) teve a cara de pau de pedir um voto de confiança. Disse: “Façam o que nós estamos pedindo e depois faremos a nossa parte”. Mas não fizeram nada nesses 17 dias de ataques.

DC – Mas qual foi o objetivo de ampliar a restrição na quinta-feira?

Freitas – Não tinha escolta. 70% dos ônibus para Palhoça estavam sem escolta.

DC – Então o senhor alega que a escolta ocorria somente nas linhas da Ilha?

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Freitas – Nem sempre. Houve empresa colocando ônibus de madrugada para buscar o pessoal para trabalhar sem esperar a escolta. E daí rodava um ônibus com 60 companheiros, de madrugada, sem escolta nenhuma.

DC – Mas esse era o momento de parar a cidade e fazer esse movimento?

Freitas – Se nós não tivéssemos feito, nada teria sido resolvido. Como é que na quinta não tinha viatura e na sexta teve? Como é que o governo negava a presença da Força Nacional e ela está aqui? Se nós não tivéssemos feito o que fizemos não haveria essa escolta de 60 carros. A verdade é uma só: ninguém, a não ser nós, teve coragem de emparedar o (governador Raimundo) Colombo.

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DC – Mas isso não é oportunismo?

Freitas – Não mesmo!

DC – Mas esse é o melhor momento?

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Freitas – Se não fosse agora, num momento de crise, quando o Estado tem de se mostrar presente, seria quando? Os ataques de novembro pararam porque os bandidos mandaram parar. Não foi porque o Estado controlou a situação. E o que fizeram de lá para cá? Nada. Tanto é que estamos vivendo tudo outra vez. Se ninguém fizer nada, se ficar todo mundo dizendo que é assim mesmo, vai dar nisso.

DC – Mas o senhor não concorda que a população acaba ficando, mais uma vez, refém de decisões do sindicato?

Freitas – A população está refém da falta de segurança e não do Sintraturb. Nós causamos isso? Pedimos para tirar o ônibus do morro? É claro que não. Colocaram isso na nossa boca.

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DC – O Sintraturb não está piorando uma situação que já é complicada?

Freitas – Eu sou a população, eu ando de ônibus. Minha família depende de ônibus. Nós temos 400 companheiros que moram no Maciço do Morro do Cruz. Nós somos o povo.

DC – É o povo que sofre com a falta de ônibus.

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Freitas – Então você acredita que nós tiramos o ônibus da nossa própria família?

DC – Mas o senhor deve concordar que a decisão prejudicou o usuário?

Freitas – A grande maioria precisa de ônibus. E os que não precisam e não fazem nada? Tenho de arriscar minha vida por causa disso? Se não tivéssemos feito o que fizemos não teríamos essas 60 viaturas para dar segurança.

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DC – Então o senhor atribui ao sindicato esse aumento no número de escoltas?

Freitas – Eu não sou dono da verdade…

DC – Mas o senhor disse que se o sindicato não tivesse tomado a decisão na quinta-feira não haveria mais escolta…

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Freitas – Estou dizendo que a ação do sindicato foi de cobrança. O que o governo está fazendo agora nada mais é do que obrigação. Na quarta, houve uma reunião. Apresentaram um plano que previa 20 viaturas a mais do que o normal. Já estávamos cobrando deles e ameaçando parar porque com as 25 viaturas não havia a segurança necessária.

DC – Desde quando havia a cobrança?

Freitas – Desde o segundo dia de ataques. Na quarta, o (Valdir) Cobalchini disse que queria um voto de confiança, mas não tinha um plano. Se não tivessem apresentado as mudanças, nós não iríamos trabalhar depois das 19h. Vocês conhecem a categoria.

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DC – E vocês iriam parar a cidade…

Freitas – Não iria parar a cidade. Ninguém estava desavisado.

DC – Avisado ou não, sem ônibus a cidade acaba parando. E como faz?

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Freitas – Mas o responsável pelos ônibus na cidade não sou eu, é o prefeito, o governador.

DC – Mas quem coordena a paralisação é o sindicato.

Freitas – Só estamos fazendo isso devido a uma situação de risco.

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DC – Não há outra maneira de se posicionar?

Freitas – Se você me disser como…

DC – O senhor é o líder do movimento…

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Freitas – Eu estou te dizendo: faz 15 dias que não tenho família, faz 15 dias que não faço outra coisa. Faz 15 dias que estamos suplicando e as coisas não acontecem. Agora, viramos bandidos porque nós decidimos tomar uma posição de força? Claro que não.

DC – O senhor assessora o Sintraturb há quanto tempo?

Freitas – Há 15 anos, desde maio de 1997.

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DC – Qual sua relação com a categoria?

Freitas – Eu tenho carteira de habilitação categoria E (carretas e transporte de passageiros) e nunca dirigi um ônibus nem um caminhão. Escrevo jornais para vários sindicatos e nunca fiz jornalismo como você. Não preciso ser motorista para saber qual é o drama de um motorista. Eu não preciso ser jornalista para saber do drama do teu salário, que é menor do que o de um motorista. Eu não preciso ser funcionário da RBS para saber disso. Eu tenho cérebro, eu leio, eu penso, me informo.

DC – Mas de onde surgiu a relação do senhor com a categoria?

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Freitas – Do meu trabalho. Eu trabalho com assessoramento sindical, só trabalho para sindicato de trabalhadores.

DC – O senhor tem filiação partidária?

Freitas – Não.

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DC – Mas o senhor foi candidato a vereador em 1996 e 2000 pelo PT…

Freitas – Sim. Fui filiado ao PT. Me desfiliei quando o PT deixou de ser um partido decente. Hoje não tenho filiação partidária.

DC – O senhor desistiu de ser político?

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Freitas – Nunca fiz carreira política. Só me candidatei para ajudar a construir o partido. Moro de aluguel e tenho um Golzinho financiado, 2007. Todo ano me acusam nas negociações de ganhar dois, três carros, mas nada disso é verdade.

DC – O senhor se considera um sindicalista profissional?

Freitas – Não. Não sou sindicalista, só assessoro um sindicato, que é o Sintraturb. Eu sou economista, estou estudando Direito. Eu não sou dirigente, não voto nas decisões. Sou um profissional como outro qualquer.

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