Com mãos habilidosas que tecem parte da história de Florianópolis, as rendeiras de bilro de Santo Antônio de Lisboa receberam nesta semana um novo espaço para manter a cultura viva trabalhando e expondo seus bordados. Algumas das salas de um antigo casarão no distrito, que recentemente se tornou a Casa de Cultura Clara Manso de Avelar, vão funcionar como um espaço para aprendizado, intercâmbio e troca de experiências entre as rendeiras com exposição permanente dos trabalhos.
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Quem passar pela Casa de Cultura vai poder ver de perto a tradição que já esteve ameaçada de terminar pela falta de interesse das novas gerações, mas ganhou um novo fôlego com a abertura do Armazém da Renda no Mercado Público em 2015 e outros espaços de valorização.
Rose Maria de Andrade, 55, rendeira desde o cinco anos, é uma das responsáveis por difundir a tradição da renda de bilro da região pelo Brasil. Nativa do Sambaqui, Rose teve um sonho que estava trabalhando com sua almofada debaixo de uma árvore perto da praia em Santo Antônio, e com o passar do tempo ali surgiu a Feira das Alfaias. Graças ao seu trabalho como rendeira, Rose viajou para diversos lugares, participou de programas de televisão e teve sua arte exposta em Paris:
— Eu faço renda porque gosto, pois dá muito trabalho, os dedos chegam a ficar dormentes. Dou aula, vou em eventos, sempre para mostrar nossa renda daqui. Até o vestido de noiva da minha filha fiz. Agora vai ser bom que a gente pode ficar sempre na Casa, um espaço que chama a atenção dos turistas, muita gente pergunta e para pra olhar — conta.
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A rendeira destaca que é a quinta geração da família que faz renda de bilro, ensinou a técnica para sua filha e também para uma neta:
— Infelizmente muita gente não valoriza o trabalho manual, e depois que surgiram as máquinas ficou muito mais fácil. Mas eu fiz questão que elas aprendessem — conta.
Assim como Rose, a rendeira Ducemar da Cruz, 74 anos, se preocupa em manter a tradição:
— Aprendi quando era menina, com a minha mãe. Infelizmente na minha família ninguém quis aprender, mas eu pretendo fazer renda até que Deus me chame — fala.
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Tradição ameaçada
A iniciativa de um criar novos espaços de valorização do artesanato e referência cultural da cidade veio da Fundação Franklin Cascaes, que percebeu a ameça à tradição da renda de bilro, que foi muito difundida no séculos 18 e 19.
— Começaram a surgir muitas rendas industrializadas, pessoas que trazem caminhões do Nordeste para cá e muita gente compra achando que é a tradicional. Por isto começamos a resgatar a tradição, fazendo oficinas e criando espaços para as rendeiras — explica Margarida Simões de Almeida, coordenadora de Artesanato de Tradição e Referência Cultural da Fundação Franklin Cascaes.
Margarida explica que em Florianópolis existem atualmente cerca de 300 rendeiras, que estão tendo oportunidade de expôr seus trabalhos no Armazém da Renda e outros Centros de Valorização espalhados pela cidade.
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— Estamos fazendo um projeto para fortalecer esta cultura e para que as novas gerações não percam esse costume. Estes locais são uma vitrine para isso, e uma possibilidade de as rendeiras escoarem seus trabalhos — finaliza.
Pinturas ornamentais foram encontradas nas paredes da Casa de Cultura
Em julho de 2015, o casarão centenário que já sediou a intendência de Santo Antônio e uma base da Polícia Militar, foi cedido pela Prefeitura para a Associação de Moradores e então transformado em Casa de Cultura. Na última semana, enquanto fazia alguns reparos para a inauguração do espaço das rendeiras, o artista plástico Claudio Andrade encontrou pinturas ornamentais escondidas nas paredes:
— Fomos tirar os pregos que estavam na parede e nos surpreendemos com uma pintura por trás da tinta branca. Como o imóvel é tombado, entramos em contato com o Serviço de Patrimônio Histórico, Artístico e Natural do Município (Sephan), que vai fazer uma vistoria no dia 30 de março — disse.
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Segundo Claudio, os desenhos são típicos das casas açorianas. Ele explica que a casa foi construída em 1914 pela família Mansur, que veio do Líbano, mas foi passando por mudanças ao longo dos anos, quando não se existia uma preocupação com a preservação das características históricas:
— O intuito da Associação dos Moradores é que o local passe por uma restauração para abrigar exposições itinerantes, preservando a história da casa e do bairro — explica.