Situações degradantes das condições mínimas da pessoa humana com encarceramento em massa da população pobre e com ausência de perspectiva real de ressocialização. Esta foi uma das conclusões sobre o sistema prisional catarinense apontadas no relatório de inspeção da Força Nacional da Defensoria Pública em 12 unidades de oito cidades de SC, entre 9 e 23 de abril.

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O mutirão foi um dos auxílios do Ministério da Justiça ao Estado no combate à onda de atentados. A origem dos ataques criminosos que aterrorizaram a sociedade catarinense a partir de novembro de 2012 está nas sessões de tortura e maus tratos a que presos são submetidos no cárcere.

O objetivo da inspeção era fazer um raio-x do sistema catarinense para identificar os problemas e pensar uma solução. A ideia é ter prisões que cumpram a Lei de Execuções Penais (LEP) para que o detento depois de cumprir sua pena volte para a rua melhor do que quando entrou, e por consequência ter uma sociedade com mais paz e segurança.

– Quando se ignora a Lei de Execuções Penais, o preso volta à rua pior do que entrou. É uma idiotice do Estado soltar alguém assim. O sistema recolhe quem quebrou vidro, furtou, e o solta matando. Isto não é inteligente – observou o magistrado Júlio César Ferreira de Melo, juiz-auxiliar da Corregedoria Nacional da Justiça, na apresentação do relatório.

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O documento inédito foi concluído em 10 de maio e entregue no início de junho ao governo estadual, à Secretaria de Justiça e Cidadania, à Secretaria de Estado da Saúde, ao Poder Judicário, e à Defensoria Pública de SC com recomendações e prazos. As 225 páginas com fotos mostram que o Estado tem muito trabalho pela frente, até porque a problemática do sistema carcerário é histórica.

Num contexto geral, o documento aponta que os maiores problemas estão relacionados às más condições e à superlotação, que acontece também pela ausência quase que total de assistência jurídica aos presos.

Maioria dos agentes tem trabalho de excelência

Entre os pontos negativos estão a tensão no relacionamento entre agentes penitenciários e presos, a atuação dos agentes aparentemente voltada à repressão inclusive com uso não controlado de armas não letais, falta considerável de assistência material como cama para dormir.

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A precariedade no acesso à educação com falta de salas de aula e na assistência à saúde com poucos médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais e dentistas é identificada, assim como o tratamento desrespeitoso dos agentes com familiares de presos, inclusive com revistas vexatórias das partes íntimas.

O documento aponta agentes com pouco instrução e em número insuficiente que dificulta a concessão de direitos mínimos aos internos como banho de sol, visita dos familiares, escolta para ida ao setor de saúde e contato com o advogado. E denúncias de tortura que, segundo o relatório, devem merecer do Estado uma atenção especial para a responsabilização dos agentes envolvidos.

Entre os pontos positivos destacam-se o trabalho de excelência da grande maioria dos agentes penitenciários, avanços consideráveis na Execução Penal de Florianópolis e de São Pedro de Alcântara, o modelo exitoso de oferta de trabalho aos presos. Neste setor, consta recomendação para regularizar o pagamento do salário mínimo aos detentos.

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Preso tratado como lixo

O coordenador da Força Tarefa em SC, Gabriel Faria Oliveira, vê um sistema desumano, mas também percebe avanços.

– O preso é tratado como lixo humano. Até o ministro da Justiça disse que preferia morrer a ficar preso. Mas é um avanço o governo estadual abrir as portas para esta inspeção. O governador Raimundo Colombo e o Secretário da Casa Civil, Nelson Serpa estão dispostos a resolver os problemas do sistema – garantiu o coordenador.

Gabriel Oliveira também acha importante o governo ouvir mais os presos e suas famílias e não somente os agentes e os diretores.

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Para ele, a pior unidade do sistema catarinense é o Presídio de Blumenau, que considerou igual a uma masmorra.

Sobre a facção criminosa Primeiro Grupo Catarinense, autora dos ataques, Oliveira observou que está diretamente ligada à ausência do Estado.

– Sob o aspecto social, nosso Estado dá demonstração de que a ausência de perspectiva de ressocialização somada aos maus tratos ao cidadão, seja ele criminoso ou não, acabou por repercutir numa organização criminosa com assistencialismo aos presos e às suas famílias, justamente porque o Estado fechou as portas das cadeias e ficou do lado de fora. Não deu estudo nem saúde e permitiu que houvesse tortura por ausência de responsabilização – concluiu Gabriel Oliveira.

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