A comissão mista da Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc), criada para apurar o rompimento de um reservatório de água da Casan, responsabilizou fiscais da companhia e o engenheiro responsável pela obra pelo ocorrido, que causou pânico e destruição no bairro Monte Cristo, em Florianópolis. O relatório foi aprovado por unanimidade na manhã desta terça-feira (19). Por nota, a Casan afirmou que, assim que receber o documento, vai analisar os encaminhamentos. Já a empresa citada não se manifestou.

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Vale destacar que o relatório não tem poder de indiciamento, apenas pontua as possíveis causas e indica encaminhamentos para evitar desastres futuros. Por parte da Polícia Civil, o inquérito sobre o caso ainda não foi finalizado, de acordo com a delegada Michele Alves Rebelo, diretora de polícia da Grande Florianópolis.

Perícia aponta “falha clara” em reservatório da Casan no Monte Cristo, em Florianópolis

Composta pelos deputados Ivan Naatz (PL), presidente, Marquito (Psol), vice-presidente, Mário Motta (PSD), relator, Maurício Peixer (PL) e Antídio Lunelli (MDB), membros, a comissão atuou de 11 de outubro de 2023 a 19 de março de 2024, totalizando 119 dos 120 dias, com base no permitido pelo calendário legislativo.

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Foram realizadas, no total, 11 reuniões em que 10 testemunhas foram ouvidas e mais de 7 mil folhas analisadas, entre contratos, aditivos, plantas, diários de obra, relatórios fotográficos, memórias de cálculo, trocas de e-mails, entre outros.

Para analisar o que levou ao rompimento do reservatório R4, no dia 6 de setembro de 2023 na comunidade do Sapé, os deputados levaram em conta, ainda, os relatórios e perícias dos órgãos competentes, como do Tribunal de Contas de Santa Catarina (TCE-SC), Polícia Científica e de auditoria realizada pela própria Casan.

Durante a apresentação do relatório, conforme reportagem da NSC TV, o presidente da comissão colocou a Casan como “vítima de servidores que não fazem seu trabalho” e ainda foi reforçado que nenhum integrante da Gomes & Gomes, responsável pela obra, compareceu às oitivas.

Veja fotos dos estragos

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As causas e responsabilizações apontadas pela comissão

A comissão concluiu que a parede cedeu pela pressão gerada pela massa de água, pois os estribos, que deveriam assegurar que o pilar resistisse a tal esforço, acabaram se rompendo. O relatório cita “divergências” entre o que foi projetado e o que foi executado, principalmente entre as armaduras N15 das peças de aço, que não resistiram aos esforços transmitidos das paredes aos pilares.

Relatório aponta falhas na estrutura e de fiscalização que podem ter ocasionado incidente (Foto: Polícia Científica, Divulgação)

“Resultado do uso divergente da armadura transversal N15 (estribos) em relação ao seu diâmetro, passando de 10 mm projetados para 5 mm executados. Portanto, na prática, como a resistência é relacionada com a área do ferro, a estrutura implementada tinha cerca de 20% da resistência pretendida”, explica a comissão no documento.

O relatório ainda traz o resultado do laudo pericial contratado pela própria Casan, que constatou que os estribos da célula 1 também apresentaram divergência em relação ao diâmetro projetado (10 mm) e executado (6,3 mm).

“O conjunto de provas reunidas indica que tais irregularidades aparentemente recaem sobre o engenheiro responsável pela execução da obra. Isso se deve à alteração da estrutura originalmente projetada”, destaca o texto.

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Neste ponto, o grupo ainda pontua falta de informações em diários de obras e o não cumprimento de cláusulas contratuais “que evidenciam falhas no trabalho dos fiscais da Casan”, responsáveis por acompanhar o andamento da obra. Além disso, os deputados citam atrasos na construção e destacam que, desde o primeiro ao último dia de vigência, foram 2.585 dias — número quase sete vezes maior que o cronograma previsto inicialmente.

“As evidentes mudanças na estrutura ao longo da execução da obra traduzidas em alterações nas armaduras das paredes tiveram inúmeras oportunidades de verificação. Só em relação ao momento em que a parede da célula 2 começa a ser montada até a concretagem do seu último nível foram mais de 10 meses, ou seja, 322 dias de oportunidades de identificação dos erros. Nesse contexto, fica claro o exercício de fiscalização precária do fiscal responsável técnico pelo referido período”, ressalta o relatório.

Outros defeitos também foram apontados, como ausência da armadura N14 (16 mm) de ligação pilar-parede e alterações nos estribos (N15) e nas armaduras de ligação (N14), que fez com que a comissão entendesse que a estrutura contava com cerca de 10 toneladas a menos de aço. Ainda, uma terceira divergência encontrada remete às barras dos pilares (armadura longitudinal N19), que não estavam posicionadas conforme o projeto.

Danos, ressarcimentos e encaminhamentos

A partir das informações remetidas pelos órgãos envolvidos na recuperação da comunidade ao Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), foi possível concluir que a Casan teve um total de mais R$ 16 milhões de despesas pelos danos causados pelo acidente, incluindo o valor pago à construtora para a realização da obra (R$ 6.389.167,01), reconstrução do muro do 22º Batalhão da Polícia Militar (R$ 48.350,00), ressarcimento à Celesc devido aos estragos na rede elétrica (R$ 27.257,07), pagamento ao Município de Florianópolis pelos serviços de limpeza realizados pela Comcap (R$ 410.172,98) e indenizações à comunidade – até dezembro do ano passado foram R$ 9.544.684,78.

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A Comissão apontou, ainda, providências para que acidentes como o rompimento do reservatório não voltem a se repetir no Estado. Entre os encaminhamentos destacam-se:

  • Ao MPSC, em que sugere que junte inquéritos civis em curso com base nos autos da ação civil pública;
  • Ao Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (TCE-SC) para que seja juntado aos procedimentos autuados na Corte de Contas, para fins de subsídio técnico probatório, e que se instaure Procedimento de Acompanhamento;
  • À Controladoria-Geral do Estado de Santa Catarina sugere a realização de auditoria sobre o contrato firmado entre a Casan e a Construtora Gomes & Gomes Ltda para apuração das diversas irregularidades e/ou falhas evidenciadas durante a vigência do referido ato administrativo e auditoria para garantir as devidas indenizações aos atingidos, além de maior transparência ao processo;

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  • E, por fim, à Casan, que indica a instauração de Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD) em desfavor dos profissionais da Companhia envolvidos na construção da obra.

Também solicita a revisão do Manual de Contratações, contratação de serviço de empresa especializada para a inspeção das estruturas e avaliação das condições estruturais, de conservação e manutenção das estruturas da CASAN, entre outros.

Por fim, pede que seja estudada a viabilidade de oportunizar suporte técnico independente, seja por contratação direta em casos de desastres ou de competência da contratada, quando da aquisição de seguro para início de obras, especialmente em Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS), visando amenizar os impactos causados por situações de risco não programados e, por analogia, no que couber, aplicando-se a Lei n. 14.755/2023 nas ocorrências de sinistros com reservatórios de responsabilidade da Companhia.

Relembre o acidente

O rompimento de um reservatório de água da Casan, que causou pânico nos moradores da comunidade Sapé, ocorreu na madrugada de 6 de setembro de 2023. Na ocasião, carros foram arrastados e casas ficaram destruídas com o incidente. Duas pessoas ficaram feridas. Por conta do incidente, cerca de 100 pessoas precisaram de acolhimento e 85 casas foram atingidas.

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Segundo a companhia, o rompimento ocorreu às 2h na rua Luís Carlos Prestes, no bairro Monte Cristo após uma das paredes se deslocar. A via ficou alagada por cerca de 2 mil metros cúbicos e destruiu muros de casas e carros.

À época, a área foi evacuada e isolada, e a companhia fez o fechamento das entradas do reservatório para evitar o escoamento de água.

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