Na próxima segunda-feira o Tribunal de Contas do Estado vai analisar a polêmica operação contábil do governo estadual que classificou como doações ao Fundo Social cerca de R$ 1 bilhão em impostos da Celesc. As chamadas “pedaladas” praticadas entre 2015 e 2016 serão alvo de um duro voto do relator do caso, o conselheiro substituto Gerson Sicca. Ele pedirá multa para o ex-secretário da Fazenda, Antonio Gavazzoni (PSD), e devolução de mais de R$ 200 milhões que deveriam ter sido repassados aos 295 municípios catarinenses.
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Com a operação, à época, o governo estadual deixou de repassar os recursos que cabem aos municípios (25%) e demais poderes e órgãos com orçamento vinculado à arrecadação (21,4%), criando folga no caixa. Revelada na análise das contas de 2015, em maio do ano passado, a transação foi questionada pela Federação Catarinense dos Municípios, Tribunal de Justiça e Ministério Público de Santa Catarina. Em dezembro, o governador Raimundo Colombo (PSD) enviou à Assembleia Legislativa um projeto de lei para regularizar a operação e definir, em acordo com os poderes, a devolução dos recursos não repassados. O projeto foi aprovado, mas a análise da questão continuou correndo no TCE.
A expectativa era a de que o processo fosse votado ontem, mas Gerson Sicca pediu o adiamento por duas sessões, o que deve levar a análise para segunda-feira. O Diário Catarinense teve acesso ao parecer do conselheiro substituto, que será votado pelo pleno do TCE. Sicca afasta o governador Raimundo Colombo de punição, por entender que a sanção deveria vir no julgamento das contas anuais, mas pede multa de R$ 14 mil para Gavazzoni.
Para o conselheiro substituto, foi de exclusiva responsabilidade do ex-secretário a “engenhosa interpretação” da resolução do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) autorizando o Estado a utilizar até 40% do imposto a ser pago pela Celesc como doação ao Fundo Social, assim como teriam partido dele as solicitações à estatal para o procedimento. “O convênio apenas autorizou o benefício tributário, cuja concessão dependia da observância da legislação estadual. O Confaz jamais pode subverter a autonomia estadual e a competência constitucional da Assembleia Legislativa”, diz Sicca em seu parecer.
Ele pede a devolução em até 180 dias de R$ 198,9 milhões que teria deixado de ser repassados aos municípios em 2015 e os valores correspondentes à continuidade da operação em 2016. Em ofício enviado ao TCE em abril e assinado por Colombo e Gavazzoni, o governo estadual comunicou que iniciaria a saldar a dívida total – calculada em R$ 248,7 milhões – a partir de julho, em 36 parcelas mensais, como determinou a lei aprovada em dezembro. O ofício não foi citado no relatório.
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O relatório de Sicca traz trechos da defesa de Gavazzoni. Além de citar a resolução do Confaz autorizando a operação, ele também diz que os procedimentos “tiveram por foco assegurar recursos imprescindíveis para a manutenção de serviços públicos essenciais, num contexto de grave crise financeira e de queda de arrecadação”. Em resposta, o conselheiro substituto disse que a crise não autoriza o Poder Executivo a aplicar “Estado de exceção” nas finanças e que a situação da economia “atingiu os mais variados setores e também abalou a arrecadação dos municípios”.
O voto de Sicca precisa ser aprovado pelos demais conselheiros do Tribunal de Contas. Caberá, ainda, recurso à decisão que for tomada. Há tendência no pleno de aceitar o ressarcimento aos municípios programado pelo governo estadual em vez do prazo de 180 dias para quitação total da dívida. O relator também determina a comunicação da decisão ao Ministério Público de Santa Catarina para averiguação da possibilidade de apresentar ação de improbidade administrativa contra Colombo e Gavazzoni.
Contraponto
A Secretaria de Estado da Fazenda destaca que as contribuições ao Fundosocial em questão têm previsão em convênio aprovado pelo Confaz, na Lei do FundoSocial e na legislação tributária referente ao ICMS. As contribuições ao Fundo também foram utilizadas por outros Estados da Federação e, em Santa Catarina, teve por escopo o fortalecimento de ações essenciais em saúde, educação e segurança pública.
Porém, com o objetivo de preservar a relação harmônica entre Executivo, poderes e municípios, o governo do Estado vai repassar em 36 parcelas a partir de julho de 2017 os valores dos municípios relativos aos anos de 2015 e 2016, ou seja, de todo o período da operação Confaz/FundoSocial. Os valores serão considerados como receita tributária. Já os valores equivalentes à compensação ao TJ e MP, serão feitos ao Fundo de Apoio aos Hospitais Filantrópicos de SC ou ao Fundo Estadual de Saúde, em montante equivalente a 0,17% da Receita Líquida Disponível. Para a Alesc e o TCE, a compensação se dará com as respectivas sobras orçamentárias e financeiras apuradas no final do exercício.
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O ex-secretário da Fazenda, Antonio Gavazzoni, não foi localizado pela reportagem na tarde e na noite desta segunda-feira.