A lista tem 42 nomes. De um adolescente de 17 anos a um idoso com 65. Do extremo Sul da cidade, no Progresso, ao extremo Norte, na Itoupava Central. Seguindo a mesma tendência do Estado, Blumenau registrou no ano passado o recorde de homicídios desde 1996 – quando inicia a série histórica do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde –, motivado principalmente, conforme autoridades, pela ligação direta entre muitas das vítimas e o tráfico de drogas. Crimes passionais também estão no rol dos porquês para as mortes violentas. Segundo representantes das polícias Civil e Militar, o círculo que envolve o comércio de entorpecentes está diretamente ligado ao crescimento de assassinatos na cidade.
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Disputa por territórios para venda de drogas e desavenças que envolvem acordos entre grupos criminosos são, na avaliação das polícias, os pilares que sustentam a tese de que o comércio de entorpecentes é o motivador dos assassinatos ocorridos em Blumenau.
– São questões que envolvem drogas, acertos, em que uma pessoa mata a outra simplesmente para “queimar arquivo”. Há inúmeros motivos para tantos homicídios, mas os ligados ao crime organizado e como consequência ao tráfico são os principais – aponta o comandante do 10º Batalhão de Polícia Militar de Blumenau, o tenente-coronel Jefferson Schmidt.
O fato de os homicídios terem em grande parte um elo com grupos criminosos é o que complica ainda mais as investigações de mortes violentas no município, explica o delegado Bruno Effori, responsável pela Divisão de Investigação Criminal (DIC). Muito embora o percentual de resolução desses crimes tenha chegado a 71,7% em 2017, o número é comprometido pelo receio de testemunhas. Na avaliação de Effori, esse é o principal obstáculo gerado e que cria ainda mais entraves para a prisão de suspeitos.
– Nossa maior dificuldade hoje é de formalizar depoimentos, principalmente de testemunhas oculares nos autos dos processos que envolvem homicídios. Há o medo de sofrer represália por parte do autor. Quando envolve o tráfico de drogas e a disputa entre facções criminosas, é onde a dificuldade prevalece – argumenta o delegado.
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Metade das ocorrências foi registrada nos bairros Passo Manso, Progresso, Itoupava Central, Fortaleza e Escola Agrícola. No último, quatro foram na região conhecida como Coripós. Na avaliação do delegado Bruno Effori isso não significa que existam localidades no município em que haja um maior risco.
O comandante do 10º Batalhão de Polícia Militar, Jefferson Schmidt, também avalia que não há na cidade o que a PM chama de “zona vermelha”, e que a questão que envolve os homicídios locais ocorre por motivações que sem ligação a uma comunidade específica.
Polícia descarta que índice reflita em insegurança
Para Effori e Schmidt, não há conexão entre o aumento no número de homicídios em Blumenau e a sensação de insegurança. Embora o índice de 2017 dê essa impressão, o grupo que é vítima desse tipo de ocorrência é, de modo geral, específico. Não houve um latrocínio (caso de roubo seguido de morte) sequer, o que para a PM prova que a sociedade não está ameaçada.
– Se analisarmos os números friamente, como normalmente se faz, dá a impressão de aumento da violência, mas se olharmos com calma não é assim. Não há medo em sair na rua ou um assassino em série que desperte isso – avalia Schmidt.
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DIC vê 2018 com pessimismo
Nos primeiros minutos deste ano, detentos do Presídio Regional de Blumenau se aproveitaram do barulho dos fogos de artifício e dos rojões para cometer o primeiro homicídio de 2018 na cidade. Foi na galeria F1, que no momento tinha 11 presos, que Cristiano Schaadt dos Santos, 22 anos, foi morto com sinais de estrangulamento e perfurações no peito. Apesar de o crime ter sido dentro de uma unidade prisional, na opinião do delegado Bruno Effori, o homicídio no primeiro dia do ano reflete o quanto 2018 deve ser novamente de atenção à área da segurança pública:
– Isso se deve a diversos fatores, principalmente de prevenção. Não com a PM, mas em âmbito social. As pessoas que se envolvem nesses casos não possuem base educacional, assistência social e familiar para ter discernimento que essa atividade é equivocada. A taxa só tende a aumentar, sou pessimista com relação a isso.
Por outro lado, o delegado responsável pela DIC em Blumenau vê com bons olhos a manutenção da equipe responsável pelas investigações. Com policiais especializados direcionados para apurar assassinatos, é possível manter esse processo e, como consequência, encontrar e prender os suspeitos desses crimes.
– Com aumento de efetivo, aumentamos também a efetividade. Queremos fazer um bom serviço na comunidade, retirando de circulação o maior número de pessoas, seguindo o exemplo de 2014 em que fomos recordistas de prisões e apreensões em Santa Catarina – finaliza.
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Para especialista, falta planejamento a longo prazo
Ao contrário do que é apontado pelos órgãos de segurança, o mestre em ciência jurídica e especialista em segurança pública Juliano Keller do Valle vê o índice de homicídios como algo que aumenta a sensação de insegurança na cidade. Para ele, relativizar os crimes por ocorrerem em um grupo específico é um erro e até um ato de discriminação com as comunidades mais pobres.
– Há muitas “pessoas de bem” em comunidades pobres que trabalham honestamente. Negar a segurança para essa camada social, o que é feito há décadas, reflete hoje em dia quando invade zonas de conforto da classe média e alta – analisa.
Com a escalada de homicídios não só em Blumenau, mas também em Joinville e Florianópolis, o professor vê uma falta de planejamento a longo prazo do Estado. Para ele, o discurso dos governantes mudou ao colocar a segurança pública como prioridade, mas quase nada se faz no período de um governo, entre quatro e oito anos.
– Toda a questão que envolve a segurança pública deve ser tratada através de pilares: investimento, inteligência e planejamento. Investir não é repor o número de servidores, mas de acrescer. Inteligência impõe que a segurança precisa ser mais organizada que o crime organizado. Polícia Civil, Militar e demais órgãos historicamente não falam entre si. O crime sempre existirá, faz parte da natureza humana, mas há mecanismos de educação e inserção social que funcionam.
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