Indo direto ao ponto: meu desejo para 2015 é que nós consigamos compreender melhor a nossa responsabilidade nos processos políticos dos quais fazemos parte todo o tempo. Vejam bem, estou falando na primeira pessoa do plural: nós.
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Quando discutimos sobre política, seja na mesa de bar, nas redes sociais ou mesmo em contextos formais, é curioso perceber o quanto atribuímos a um único sujeito a culpa ou a honraria. “Dilma vai diminuir os direitos do trabalhador”, “FHC aumentou a inflação”, “Não foi o Lula quem melhorou a situação da Cultura, foi o Gil quando ministro”. Como é difícil entender que estamos falando de governos e não de pessoas. É claro que existem pessoas que fazem grande diferença em seus cargos, especialmente em ministérios, secretarias, departamentos e outras instâncias que possuem menos subalternos no “guarda-chuva” do poder. Mas quando o cara é o líder, parece que serão de sua responsabilidade todas as dores e delícias da nação, Estado, cidade… Parece bonito e heroico quando o resultado é satisfatório, mas é bastante cruel quando todo o processo degringola. Numa democracia (gostemos dela ou não), pouca coisa se decide sozinho, certo? Então, por que o líder é quem arca com o ônus e o bônus?
O quadro que aqui está, e que aqui sempre esteve, é fruto da nossa atuação (ou omissão) como cidadãos também. Alguns votam para manter emprego, outros porque o seu setor vai bem. Tem gente que vota porque não quer ver pobre indo para a universidade, tem gente que vota porque tem saudade da exclusividade das viagens para a Europa, tem gente que vota porque recebe uma bolsa que lhe permite comer, tem gente que faz escolhas porque lhe prometeram um milhão de coisas ou porque lhe prometeram as coisas mais básicas.
Quem promete tudo isso é um(a) candidato(a) falando na primeira pessoa do plural: nós vamos acabar com o desemprego, nós vamos diminuir as taxas, nós vamos fazer isso, aquilo e etc. A primeira pessoa do plural sempre dá o ar da graça no discurso que promete coisas variadas em troca de votos. Portanto, não é Dilma, Raimundo, Collor, Aécio, Marina ou quem quer que seja que vai melhorar isso ou aquilo. São os governos liderados por eles. Entre uma pessoa no singular e outra no plural existe um abismo de possibilidades. As alianças partidárias empacam a eficiência de um plano de governo? Sim! As nomeações de cargos são promessas rateadas entre esses partidos coligados que nós escolhemos? Claro! Hoje em dia quase ninguém tenta esconder isso. No entanto, parece necessário que lembremos que nós não fazemos política APENAS quando vamos à urna. Confirmar nosso voto no botão verde é pouco. É quase nada.
É preciso que repensemos todo o nosso sistema político – e isso não é uma conversa nova, todos sabemos. Mas, onde começa o movimento? É neces- sário que nos façamos presentes nos processos de (re)construção das políticas públicas. É a única solução que eu consigo vislumbrar. Se cada cidadão participasse regularmente de algum conselho, fórum ou qualquer outro desses mecanismos de manutenção da “polis”, as coisas andariam melhor. Importante ainda seria ampliar nossa participação nesses âmbitos. Por que eu, produtor cultural, não acompanho também as lutas políticas da saúde, por exemplo, em vez de me “satisfazer” com minha atuação nas lutas do meu setor ou de me satisfazer em ter escolhido um bom candidato e apertado o botão verde?
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O processo democrático permite (ou pelo menos nos dá brechas) para construirmos uma sociedade baseada em diálogos (alguns mais pacíficos, outros aos berros, mas são diálogos). Nós (na primeira pessoa do plural) elegemos políticos corruptos, regidos pela democracia da qual fazemos parte. Sejam esses corruptos senadores, deputados, governadores, prefeitos, vereadores. São eles, nossos eleitos do executivo, junto aos representantes dos outros poderes, que deverão lutar por nós? O ideal seria esse, afinal cada um ganha seu ordenado para cuidar de sua função. Mas, ao escolhermos nossos representantes, temos esta insuportável mania de nos abstermos do restante do processo. E, infelizmente, não podemos, ainda, nos dar a esse luxo.
Seria perfeito, não?! Colocamos o nosso voto na urna (tendo feito uma boa “pesquisa de voto”, é claro), e o candidato eleito é quem vai resolver os problemas da nação. É cômodo. Nós gostamos de uma “mãezinha”. Ela põe o café na mesa e, se a louça não estiver limpa, é só reclamar com ela. Mas as coisas não são como deveriam ser. Temos esse vício maluco de apontar o dedo e de “tirar o nosso da reta”.
Meu desejo para este ano é que a gente aprenda a conjugar melhor os verbos. “Nós” é a primeira pessoa do plural. É preciso sempre lembrar disso. Quando a terceira pessoa do plural é o sujeito, o restante do diálogo pode ser mais generoso, e talvez aprendamos que política está nas menores e maiores esferas do nosso convívio. Estamos meio necessitados disso, não? Que seja um 2015 generoso para todos nós.
*Ator, diretor e produtor teatral. Integra a Cia. Experimentus desde 1999 e é Presidente da Rede Itajaiense de Teatro
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