A Receita Federal intimou o ex-ministro das Minas e Energia Bento Albuquerque a explicar a entrada do segundo estojo de joias trazido ao Brasil e entregue ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
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Além do conjunto de joias e relógio avaliado em R$ 16,5 milhões, este retido no aeroporto de Guarulhos, outro pacote, que inclui relógio, caneta, abotoaduras, anel e um tipo de rosário, todos da marca suíça de diamantes Chopard, estava na bagagem de um dos integrantes da comitiva e não foi interceptado pela Receita, como mostrou a Folha de S.Paulo.
Os auditores em Guarulhos querem saber por que a comitiva de Albuquerque não seguiu o roteiro tradicional, pelo regime de importação, voltado a casos de incorporação de bens públicos. Na avaliação deles, se um presente foi dado com esta finalidade não haveria a possibilidade de declará-lo como bem próprio.
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O caso das joias, tanto as interceptadas quanto as que passaram despercebidas, é considerado atípico do começo ao fim.
Há situações, por exemplo, de professores que voltam com doações para universidades. Mas no caso do governo a praxe é que os materiais venham como bagagem diplomática e o pedido de incorporação ao patrimônio deve ser feito via Secretaria-Geral da Presidência.
Normalmente, para agilizar o processo de importação, a Receita é avisada com alguma antecedência. O material, necessariamente, seria retido por algumas horas, mas geralmente a liberação ocorre no mesmo dia.
— Eu nunca participei de um caso [de presente] que tenha vindo com o passageiro. Em geral, vem como bagagem diplomática, pela própria embaixada. Para ser sincero, também nunca peguei algo de valor tão elevado. Então, não é o comum. Agora, não é proibido. Se ele fizesse certo, não seria proibido. A questão foi a forma que foi feita — afirma Mario de Marco, delegado da Alfândega do Aeroporto de Guarulhos.
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Ele não deu detalhes específicos da investigação. Mas, falando genericamente, disse que não é cabível alegar desconhecimento das normas. Ainda mais quando se trata de autoridades, com assessoria à disposição.
No caso da comitiva de Bento Albuquerque, como ocorre rotineiramente, a abordagem não ocorre de maneira casual. É feito um cruzamento de 50 pontos para que a decisão seja tomada.
— Independentemente do passageiro, quer seja autoridade quer não seja, existe um conjunto de fatores que podem chamar a atenção. Teoricamente é de se esperar que uma autoridade ofereça menos risco aduaneiro que outro passageiro — diz De Marco.
Dependendo da situação, casos de objetos não declarados podem ser uma infração punida com multa ou crime de tentativa de descaminho, explicam auditores.
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— Se tiver no conceito de bagagem, é uma infração, um ilícito tributário. Você paga a multa e encerrou, a Receita não vai fazer representação, você não vai ser preso em flagrante. Diferente se você traz uma mala de iPhone, não é para você, não tem conceito de bagagem e não tem multa para liberar — diz o delegado Adjunto da Alfândega do Aeroporto de Guarulhos, André Martins.
No caso em questão, como se tratava de uma comitiva oficial, a princípio o assunto não foi tratado como um caso que envolveria prisão em flagrante por descaminho.
Isso não significa que, conforme as investigações avancem, o quadro não possa mudar, agravado principalmente pelo segundo pacote de joias que entrou no país sem declaração.
As joias interceptadas foram encontradas com o ex-assessor da pasta Marcos André Soeiro e retidas porque bens adquiridos no exterior com valor superior a US$ 1.000 precisam ser declarados à Receita. O caso foi revelado pelo jornal O Estado de S. Paulo.
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Documentos posteriores à apreensão mostram que o ministério de Minas e Energia tentou, entre outubro e novembro de 2021, reaver as joias, argumentando que elas seriam analisadas para incorporação “ao acervo privado do Presidente da República ou ao acervo público da Presidência da República”. A cúpula da Receita passou a ter acesso dessas tentativas de pressão.
Uma vez que a situação não foi regularizada, a Receita determinou o perdimento daquele bem. As joias iriam a leilão, mas, como o caso veio à tona, se tornaram provas em inquéritos sobre o assunto.
Ainda não se sabe qual será o destino das joias, que ainda devem passar por perícia. Segundo os auditores, quem define o destino delas, em um caso de vulto como esse, normalmente seria o próprio ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), por chefiar a pasta à qual a Receita é subordinada.
O caso também é investigado pela Polícia Federal, no qual Albuquerque e um ex-assessor flagrado com as joias foram intimados.
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Sobre o segundo pacote que entrou no país com a comitiva sem passar pela Receita, Bolsonaro confirmou que ele foi incorporado ao acervo privado dele, mas negou ilegalidades.
Soeiro não se manifestou sobre o caso. Vargas afirma ter retornado ao Brasil carregando apenas artigos pessoais e que, ao desembarcar no aeroporto de Guarulhos (SP), não portava itens oferecidos como presentes oficiais ao governo Bolsonaro.
Ao jornal O Estado de S. Paulo Bento Albuquerque disse que a remessa retida pela Receita era um presente para Michelle, mas afirmou desconhecer o conteúdo do estojo de joias. Procurado posteriormente pela reportagem, negou que sua equipe tenha tentado trazer presentes caros destinados a Bolsonaro e a Michelle.
*Por Artur Rodrigues e Camila Mattoso, de São Paulo, para Folhapress
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