Renasce, de repente, devidamente adaptado para conviver com o meio ambiente, um projeto de uma marina para uma ilha que, estranhamente, dava suas costas ao mar.

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Sairá do papel? Ao nosso mar falta o dinamismo dos mares rendilhados por trapiches, nervuras vasculares que ligam os seres humanos ao mundo. Mistério: vigora aqui um inexplicável descompasso, um sinal “trocado” entre a relação “pessoas/automóvel” e “pessoas/barco”, nesta que é uma ilha de 42 praias bem contadas.

Já somos a segunda cidade brasileira na penosa relação “carro por habitante”, passando rapidamente da atual marca de um carro para cada 1,8 morador, rumo a delirantes “um por um”. E quantos barcos teremos “por pessoa”, nesta que é uma ilha, como todas, cercada de água por todos os lados?

Nem se diga que navegar é um esporte caro. Navega-se até sobre uma daquelas boias antigas, câmeras de pneu. E não somente a bordo de embarcações suntuosas. O mar aceita com boa vontade qualquer caíque flutuante – troncos ocos, cascas de palmeiras, bateras, batelões, canoas açorianas, escunas, lanchas voadeiras, ou até um corpo humano de barriga cheia em tarde de sol e calor.

A histórica “Retirada de Dunquerque” – episódio que pode ter determinado, ainda no seu início, o desfecho da II Grande Guerra – foi consumada a bordo de qualquer “tábua” que sustentasse um soldado inglês na travessia do Canal da Mancha.

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Até parece que o ilhéu herdou certos pânicos dos arquipélagos açorianos, associados às erupções vulcânicas do Atlântico Norte. E, com esse sentimento na alma, acabou nutrindo pelo mar mais temores do que amores…

É um espanto que, numa ilha de 47km x 12 km, o homem “rode” sobre seu dorso num asfalto ralo e cansado, ignorando a líquida via que a acaricia há milhões de anos, desde o Big Bang.

Só pescadores de águas turvas acham o “estacionamento” de barcos um equipamento elitista. O transporte marítimo é popular nas cidades marinhas de todo o mundo e uma canoa açoriana pode muito bem amarrar esse pangaré do mar num “quintal” flutuante: é só criar uma “reserva” para embarcações da espécie.

O mar é muito mais generoso do que essa turma que gosta de ser contra tudo.

Leia as crônicas de Sérgio da Costa Ramos