O mercado das criptomoedas está em alta, puxado principalmente pela valorização da Bitcoin (BTC) – primeira e mais popular das moedas digitais – que fechou o ano passado cotada em cerca de R$ 50 mil, um aumento de 1.366% em um ano. Criada em 2008, a criptomoeda alcançou a cotação máxima de R$ 70 mil e, hoje, oscila próximo aos R$ 30 mil. As cifras vêm chamando a atenção não só dos especialistas em tecnologia, mas também de investidores. Somente em Joinville, estima-se que ao menos mil pessoas já tenham apostado no setor e de 50 a 60 empreendimentos já aceitem pagamentos por meio da tecnologia.
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Embora complete dez anos em 2018, a criptomoeda ganha força na medida em que as transações financeiras virtuais estão se popularizando e é vista como alternativa ao sistema financeiro atual. A explicação para este crescimento (um Bitcoin custava R$ 60 em janeiro de 2013) decorre do aumento da oferta sobre a demanda das mais de mil moedas virtuais existentes.
O diferencial deste meio de troca é a utilização da tecnologia de blockchain e da criptografia para assegurar a validade das transações e a criação de novas moedas descentralizadas, que podem ser operadas no mundo todo sem o controle de um banco central ou intervenção dos governos.
Em Joinville, os entusiastas desse novo modelo econômico e digital têm perfil jovem e voltado à área tecnológica, além de pessoas que buscam investimentos diferentes dos tradicionais, como as aplicações bancárias, ou que já tiveram resultados negativos em bolsas de valores. Reflexo disso é que, hoje, especialistas apontam que o número de cidadãos que investem em bitcoins é o dobro do total de investidores na bolsa no País.
No entanto, conforme o consultor da Invest Brasil Joinville, Elton Guerra, entre os joinvilenses mais conservadores a moda ainda não pegou. A resistência, ele diz, acontece porque principalmente entre os empresários mais velhos, o tema ainda é pouco difundido e ainda são necessários investimentos em divulgação. O esforço agora é para dar o entendimento de que esse mercado não é mais uma perspectiva de futuro, mas uma realidade.
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– Os mais conservadores, por exemplo, têm medo porque o Bitcoin não é palpável às mãos e essa é a grande questão. Por outro lado, hoje, o município já têm investidores na faixa dos 70 anos de idade que compreendem como esse mercado funciona e procuram consultoria para ingressar neste mercado.
Investimento como fundo de reserva
Por servir como ativo financeiro, a maioria dos que investem nas moedas digitais fazem aplicações apenas para fundo de reserva. Depois, eles aguardam sua valorização para, no futuro, converterem os ganhos para moedas físicas vigentes. Outros atuam como “trades” e compram frações da moeda (cada uma tem até oito casas decimais) com fins de especulação. Há ainda os que investem em criptomoedas para outras aplicabilidades, como, por exemplo, a Ethereum, baseada na tecnologia de registro de contratos e documentos virtuais e que, somente no ano passado, teve valorização de 3,300%.
De acordo com o Jaison Carvalho, um dos pioneiros no investimento e incentivo ao setor em Joinville, existem três formas de obter criptomoedas atualmente: comprar diretamente de alguém que já tenha o recurso, adquirir fatias da moeda em sites de câmbio (Exchanges) ou minerar a moeda – processo que a rigor demanda maior custo por causa do gasto de energia, dos impostos, e gasto nos equipamentos necessários para a produção das moedas.
Outra possibilidade é o recebimento delas por meio de pagamentos. Esse é um processo já aceito por cerca de 50 empresas joinvilenses cadastradas no sistema “Bit Ofertas”, um aplicativo que permite ao lojista receber, em reais, pagamentos feitos via bitcoins. Entre as participantes estão empresas do ramo automobilístico, de alimentação, de contabilidade e de tecnologia.
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— O Bitcoin está em uma fase em que não se entende bem para o que ele serve, mas não há um limite para suas aplicações, o que o torna uma revolução fantástica. O algoritmo que determina a criação dos bitcoins é rígido e conhecido, então acredito que seu grande benefício é ser uma tecnologia que obedece à matemática e não às intenções políticas das pessoas, essa é a grande sacada — considera Jaison, investidor desde 2012.
Tecnologia é impulsionada por autodidatas
Em Joinville a cena ainda é restrita e as discussões em torno do tema acontecem em grupos pequenos, em geral formados por pessoas engajadas no potencial das criptomoedas. Aos 27 anos, os companheiros de trabalho e engenheiros de software, Lauro Gripa Neto e Renie Siqueira da Silva, escolheram investir em outras moedas, e iniciaram neste mercado há dois anos. Além deles, na ‘Magrathea Labs’, startup onde trabalham, cerca de 40% dos colegas seguem o mesmo caminho.
Lauro possui aplicações na Ethereum, uma plataforma descentralizada capaz de executar contratos inteligentes por meio da tecnologia blockchain. Já Renie tem investimentos na Dash, que consiste em pagamentos de forma fácil, instantânea e privada. Autodidatas, ambos ingressaram no mercado das criptomoedas para entender a tecnologia empregada e suas aplicações.
No começo, Lauro resistiu a investir porque, segundo ele, quando lançada a Bitcoin era guiada por uma política na qual ele não concordava (anarcocaptalista), além de ter sido utilizada como um território fértil para negócios ilegais. Porém, com a evolução da tecnologia e o emprego de novas utilidades. Desde que ele investiu, em meados de 2016, houve crescimento no valor do ether. À época custava US$ 7 a unidade, agora, chega a valer US$ 800.
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Na visão deles, no entanto, embora o mercado esteja em alta, a entrada de novos investidores deve ser pensada.
– Você precisa entender o que está acontecendo, estudar o potencial de crescimento e estar por dentro das discussões que acontecem na comunidade da moeda que você quer investir. Também deve ponderar os fatores externos que podem influenciar nos resultados da aplicação – diz Renie.
O engenheiro de computação Rodrigo Xavier possui aplicações na rede desde 2013 em dois tipos de criptomoedas e, segundo ele, em determinados períodos já chegou a atingir 1000% de valorização. No caso dele, o dinheiro investido seria aquele gasto de forma supérflua para não comprometer o orçamento se desse errado.
– Comprei no entusiasmo e a partir do investimento inicial, me comprometi com o negócio e continuo fazendo compra e venda de frações das moedas.
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Palestras e cursos ajudam a entender as moedas digitais
Joinville já recebeu pelo menos seis ‘Meetups’ sobre os conceitos que envolvem a tecnologia por trás das moedas digitais, colocando em contato direto cerca de 150 pessoas interessadas no potencial do serviço. Além desses encontros, cursos e palestras buscam aproximar e sanar dúvidas sobre as ofertas deste mercado.
No último dia 15 o setor empresarial pôde acompanhar na Associação Empresarial de Joinville (Acij), a palestra Tributação das Criptomoedas e Investimentos Digitais, ministrada pelo advogado Leandro Guerreiro Guimarães. O evento aconteceu no salão nobre da entidade e teve como objetivo promover um debate sobre as implicações jurídicas e tributárias do uso da tecnologia.
— Trata-se de uma discussão isenta que acontece devido a uma demanda ainda não muito elevada dos associados, que questionam o tema mais por curiosidade em torno da repercussão que as criptomoedas estão ganhando e, que, embora volátil, apresenta valorização. Então, o que promovemos é uma antecipação do debate para além da valorização e inovação, mas também as implicações das moedas digitais acerca da tributação — destaca Wilson de Mira Junior, presidente do Núcleo Jurídico da Acij.
Já no dia 14 de abril, o Fab Lab Joinville promove um curso de programação em blockchain, das 9h às 17h, para os interessados que saibam utilizar a programação em JavaScript. As vagas são limitadas ao custo de R$ 100 e são preenchidas mediante consulta.
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Em maio o tema volta à pauta na Expogestão 2018, entre os dias 8 e 10, no Complexo Expoville. Na ocasião, o especialista em criptomoedas Fernando Ulrich realiza a palestra Moedas Digitais – a democratização da inovação, na qual ele retrata o modelo como “uma invenção tecnológica disruptiva capaz de formar e sustentar sistemas de pagamentos globais, sem fronteiras, que funcionam em redes distribuídas e independentes dos sistemas financeiros tradicionais, com valores determinados livremente pela oferta e pela demanda”.
Os riscos
A possibilidade de o mercado das criptomoedas se configurar como uma bolha especulativa gera controvérsia entre os entusiastas do setor. Para alguns, o valor atual de uma Bitcoin atinge hoje uma cotação estável, enquanto outros apontam que é difícil dizer se a tecnologia vai justificar o valor que tem atualmente ou se mais adiante vai provocar um “estouro da bolha”.
Em contrapartida, existe o consenso de que, como qualquer investimento que envolva recursos financeiros, há riscos inerentes, entre eles, a volatilidade das moedas, o mercado não regulado e a possibilidade de hackeamento de contas. Para quem investe, a dica é utilizar formas mais seguras de guardar a chave de segurança das criptomoedas, como os dispositivos físicos (off-line) e as carteiras de papel (piper wallet).
O futuro
O denominador comum entre os investidores joinvilenses é que devido a uma série de fatores não é possível cravar se o negócio será rentável no futuro. Por ainda estar em fase especulativa e de reserva de valor a dificuldade em mensurar como o setor vai se comportar tende a ser maior.
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— É difícil afirmar e o que se tem é um monte de gurus tentando acertar (o futuro das criptomoedas). E existe hoje um patamar que, vendo notícias de dois meses atrás, eles erraram feio. Então, pode haver crescimento porque a Bitcoin tem um número limitado perto das pessoas que podem entrar neste mercado, mas até onde as regulações de governos podem influenciar, é difícil afirmar — resume Rodrigo Xavier.
A regulamentação
No Brasil, o Congresso Nacional chegou a iniciar no ano passado discussões para a regulamentação do Bitcoin, mas ainda não há resultados efetivos a respeito do tema. Entre os principais pontos a serem debatidos está a questão fiscal que envolve as transações realizadas por meio da tecnologia blockchain.
Apesar de não haver regulação no País, a Receita Federal já prevê, desde 2014, a declaração dos rendimentos a partir das criptomoedas no Imposto de Renda – uma vez que são equiparadas a um ativo financeiro.
Glossário
Criptomoedas: Segundo Marcelo Eisele, cofundador da Blockchain Academy, as criptomoedas são um dos ativos financeiros que mais têm se valorizado nos últimos anos. Apesar do nome, não é possível considerar esses ativos oficialmente como moedas, já que eles não são emitidos por um órgão oficial, como o Banco Central.
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Bitcoin: A primeira criptomoeda criada, que foi desenvolvida entre 2008 e 2009 por uma pessoa (ou grupo) com o pseudônimo Satoshi Nakamoto. A Bitcoin não é apenas uma moeda, é também um protocolo e um software que possibilita transações instantâneas, sem envolver intermediários, e pagamentos em termos mundiais.
Blockchain: É o livro razão público de todas as transações com criptomoedas já realizadas, no qual, até hoje, não há registro de fraudes. As pessoas são identificadas através de um código numérico e um QR Code que identifica sua carteira, que fica registrado na blockchain. Dessa forma, é possível rastrear as transações realizadas, ao contrário das transações em papel. Este livro razão é chamado blockchain pelo fato de ser uma cadeia de blocos de transações/registros. A rede Bitcoin usa o blockchain para distinguir transações de bitcoins legítimas de tentativas de reuso de moedas, ou seja, moedas que já foram gastas em outra transação.
Mineração: É o processo de adicionar registros de transações ao livro público, que armazena transações passadas. Minerar é também um mecanismo usado para introduzir moedas no sistema: mineradores recebem taxas e um subsídio de novas moedas criadas. Ambos servem com o propósito de disseminar novas moedas de uma maneira descentralizada bem como motivar pessoas a prover segurança ao sistema. É chamada assim porque se assemelha com a mineração de outros commodities, já que requer esforço e de forma lenta faz com que uma nova moeda esteja disponível a uma taxa que se assemelha ao ritmo dos commodities minerados do solo.
Exchanges: São empresas que negociam criptomoedas. É possível transformar bitcoins em reais ou dólares, mas uma taxa é cobrada, dependendo da exchange escolhida. Elas disponibilizam aplicativos onde é possível acompanhar a variação do valor das criptomoedas e realizar as negociações. Todas as exchanges exigem documentação com foto dos usuários cadastrados e há uma grande preocupação com lavagem de dinheiro nesse meio.
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