O bilionário brasileiro que venceu o governo na eleição para o conselho de administração da Petrobras é recluso, considerado um investidor conservador e gosta de dizer que os donos das empresas têm que fazer parte do colegiado que define os seus rumos.

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Listado pela revista Forbes como a 15ª maior fortuna do Brasil, João José Abdalla Filho, 76, é chamado de “o bilionário mais desconhecido do Brasil”. Não costuma frequentar colunas sociais, eventos públicos e não dá entrevistas.

É dono do Banco Clássico e tem um patrimônio estimado em US$ 2,8 bilhões (cerca de R$ 13 bilhões, pela cotação atual), resultado da aplicação de recursos herdados de seu pai, o industrial paulista José João Abdalla, morto em 1988.

Conhecido como Juca Abdalla, o bilionário obteve há duas semanas duas cadeiras no conselho de administração da Petrobras, avançando sobre uma vaga tradicionalmente ocupada por indicados da União.

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Ele próprio ocupará uma delas. O Banco Clássico, um dos maiores acionistas individuais da estatal, aprovou também a nomeação do advogado Marcelo Gasparino, que costuma representar Abdalla em conselhos de empresas.

O avanço do banqueiro é alvo de críticas de sindicatos, que veem na movimentação um reforço na defesa pela privatização da companhia, já defendida pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) e pelo ministro da Economia, Paulo Guedes.

O Banco Clássico é grande acionista em algumas das maiores empresas brasileiras, como Petrobras, Vale, Eletrobras e Cemig, e se vale do peso de suas participações para garantir voz nos conselhos de administração das companhias.

Também tem participações relevantes em empresas privadas como a companhia elétrica Engie e a distribuidora de gás Naturgy, geralmente empresas que operam com concessões reguladas pelos governos federal e estaduais.

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Sua estratégia de investimento é vista pelo mercado como conservadora e de longo prazo, com preferência por empresas garantidas pelos governos, que têm menos risco de quebrar.

Abdalla não quis falar com a reportagem. Seu advogado, Leonardo Antonelli, confirma a percepção. “Ele não é um especulador de mercado”, diz. Sua aposta em estatais seria explicada pela possibilidade de destravar valor com melhor governança ou até com privatizações.

O banqueiro gosta de repetir que o “dono” de uma empresa tem que integrar seu conselho de administração. A eleição na Petrobras, diz Antonelli, “é uma estratégia alinhada ao pensamento dele e que está se provando eficaz para a defesa do melhor interesse dos acionistas e na vigilância da governança”.

Na assembleia do último dia 13, os acionistas privados conseguiram 4 das 11 cadeiras do colegiado– seis ficaram com indicados da União e uma pertence a representante dos trabalhadores. É a composição com menor número de representantes do acionista controlador.

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O avanço já havia sido ensaiado, sem sucesso, em 2021. Desta vez, Abdalla conseguiu mudar o modelo de votação para que os acionistas pudessem votar individualmente nos candidatos e não em uma chapa previamente estabelecida.

Com o peso de suas ações e apoio de outros investidores, o banco Clássico dobrou sua participação no colegiado. Para Antonelli, o apoio de outros acionistas “demonstra a confiança do investidor, especialmente estrangeiro, no trabalho que vinha sendo desenvolvido nos últimos anos”.

Abdalla já era conselheiro da Cemig, mas ainda não havia ocupado o colegiado de uma das duas estatais da União em que tem participação relevante. Na Eletrobras, o banco Clássico é representado por Gasparino, que também é conselheiro na Vale.

Com foco na gestão de recursos de Abdalla, o banco Clássico tinha ativos de R$ 14,5 bilhões ao fim do terceiro trimestre de 2021, segundo os dados mais recentes do Banco Central. Naquele período, registrou lucro de R$ 80,4 milhões.

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Os recursos que deram início ao banco foram gerados pelo conglomerado de empresas de seu pai, conhecido como JJ Abdalla, nos ramos de cimentos, metalurgia, tecelagem e cana-de-açúcar, entre outros.

E engordados pela desapropriação de um terreno onde hoje está o Parque Villa Lobos, em São Paulo. Foi a maior indenização paga até então pela desapropriação de um terreno, de R$ 2,5 bilhões, em processo bastante questionado na época.

JJ Abdalla teve passagem pela política e foi alvo de cerca de 500 processos judiciais, segundo relato do Centro de Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da FGV (Fundação Getúlio Vargas).

Chegou a ser preso duas vezes entre o fim dos anos 1960 e o início dos anos 1970, por desrespeito a leis trabalhistas.

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Abdalla Filho tentou também entrar na política, lançando-se candidato a suplente de senador por Roraima em 2006. Na época, declarou ter um patrimônio de R$ 379,2 mil, o equivalente hoje a R$ 920,2 mil.

Sua trajetória também tem problemas na Justiça: em 2019, ele foi denunciado pelo Ministério Público Federal por sonegação de impostos e em 2020, por corrupção passiva e peculato, em caso de subornos a juiz para a liberação de precatórios.

Os dois casos ainda estão em tramitação na Justiça.