CORREÇÃO: o percentual de aumento de homicídios é de 1,47% e não de 5,2%. A informação foi corrigida no texto às 14h de 18 de agosto.

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O retrato da violência em Santa Catarina vive dois extremos: enquanto os números de latrocínio (roubo seguido de morte) apresentam queda, o Estado tem tido aumento nos indicadores de homicídio e letalidade policial. Nos primeiros sete meses do ano, houve aumento de 1,47% no número de assassinatos ao comparar com mesmo período em 2022. Porém, o índice mais preocupante está nas mortes em confronto: o Estado registrou 48 casos em 2023 — a quantidade já é maior do que o registrado em todo o ano passado, quando foram 43 ocorrências.

Para especialistas, o aumento está alinhado ao combate à criminalidade, que expõe o desafio de garantir a ordem pública sem o uso da força.

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Ao comparar como mesmo período do ano passado, o Estado teve crescimento de 118,18% na quantidade de ocorrências policiais que terminaram com a morte do suspeito, levando em conta números das polícias Militar e Civil. Em 2022, por exemplo, foram 22 casos até o fim de julho.

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A diferença também está no comparativo do mês. Enquanto em julho de 2022 foram duas mortes, este ano foram cinco — aumento de 150%. Outro exemplo são os dados de maio: enquanto no ano passado foram três mortes, o mesmo período registrou 10 ocorrências neste ano.

De acordo com o presidente da Comissão de Segurança Pública da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Santa Catarina, Guilherme Stinghen Gottardi, entre os motivos para o aumento, estão a mudança no crime organizado e o crescimento no número de operações. Isto porque, com armamento mais “pesado” por parte dos suspeitos, muitas vezes é necessário recorrer ao confronto, o que desencadeia na morte.

— Aí entra uma questão que é um dos desafios das forças de segurança pública: manter os índices de criminalidade ao mesmo tempo que reduz a necessidade de intervenções policiais que ocasionam os confrontos — diz.

Em Criciúma, no Sul do Estado, um suspeito foi morto após o furto de um notebook em 13 de agosto. No boletim de ocorrência informado pela Polícia Militar, ele “investiu contra as guarnições fazendo uso de instrumento similar a arma de fogo”.

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Neste momento, a polícia teria atirado contra o homem, que não resistiu aos ferimentos e morreu no local. No entanto, a PM confirmou que o armamento tratava-se de uma réplica. Ao NSC Total, a Polícia Militar de Criciúma informou que as circunstâncias que levaram à morte do suspeito serão investigadas.

O advogado Guilherme Stinghen Gottardi explica que, ao atender uma ocorrência, a polícia segue cinco etapas antes de chegar a foça letal: presença física, verbalização, controle de contato, controle físico e táticas defensivas não letais.

— O policial deve se adequar quanto ao emprego da força e utilizar essa ferramenta conforme a necessidade da situação. Contudo, avaliar qual tipo de força será necessária para conter ou neutralizar uma ação delituosa ou que colocaria a vida de pessoas em risco e, ainda, se de acordo com o cenário apresentado valeria a pena usar de todas as possibilidades para alcançar o seu objetivo final — salienta.

Sobre a situação em Criciúma, ele enfatiza que a alegação de uma possível investida contra a guarnição poderia ser comprovada caso a equipe usasse as câmeras corporais.

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— A alegação dos policiais de que a vítima teria investido contra os policiais para justificar o uso de força letal poderia ser comprovada se houvesse a utilização das câmeras corporais pelos policiais. Por isso da importância de tal equipamento pelas forças de segurança — finaliza.

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Mais de 30 casos são investigados

Em nota, a Polícia Militar de Santa Catarina informou que em caso de morte decorrente de intervenção policial, um inquérito policial militar é instaurado. Ao final de cada apuração, os autos são encaminhados ao Judiciário.

Atualmente, 37 inquéritos estão em andamento. O NSC Total questionou a PM sobre a quantidade de agentes e em quais casos o uso das câmeras corporais estão em análise. O órgão, no entanto, informou que os dados não poderiam ser repassados por se tratarem de processos sigilosos.

“O trabalho da Corregedoria da Polícia Militar analisa vários elementos e deve preservar as informações para melhor análise e transcorrência do Inquérito em todas as suas fases”, informou.

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Conforme o presidente da Comissão de Segurança Pública da OAB, Guilherme Stinghen Gottardi, o órgão tem acompanhado os dados que são divulgados, além de manter contato frequente com as forças de segurança.

Já o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) informou, em nota enviada ao g1 SC, que todos os casos são apurados “buscando a responsabilização dos agentes em eventuais casos de abuso”.

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Câmeras corporais são aliadas no combate a letalidade

Desde 2019, a Polícia Militar de Santa Catarina conta com o uso das câmeras corporais para o monitoramento das ocorrências. Na época, o investimento foi de R$ 3 milhões e teve com objetivo contribuir na efetividade para a análise criminal e aumentar a transparência e a fiscalização das ações policiais e o uso da força.

Conforme a PM, atualmente 2.245 câmeras estão em funcionamento no Estado. Isso significa que, em todos os turnos operacionais, pelo menos um dos dois policiais que fazem a guarnição está com o equipamento.

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Diferente do que ocorre em São Paulo, onde o acionamento da câmera corporal ocorre a partir do momento que o policial entra no plantão, em Santa Catarina o equipamento só é ligado quando a ocorrência inicia em si.

—O ideal seria seguir esse modelo [de São Paulo], mas ter uma central de monitoramento e um local para armazenamento, tudo isso acarreta em custo, que envolve o poder público — diz o advogado Guilherme Stinghen Gottardi.

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O especialista salienta, ainda, que os equipamentos ajudam não só para a transparência das operações, mas também a segurança do cidadão que está sendo abordado e do policial.

No entanto, um projeto de lei protocolado na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc) quer acabar com a obrigatoriedade do uso. De autoria do deputado Jessé Lopes (PL), o PL 0056/2022 garante “ao agente de segurança pública autonomia para ativar ou não dispositivo de gravação de ocorrência”.

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Na justificativa, o deputado alega que as câmeras não são capazes de capturar o contexto da ação, o que deixa o agente “em estado de vulnerabilidade, pois uma análise parcial do que fora gravado, pode expor o agente a acusações criminais, tanto na esfera administrativa quanto judicial”.

“Nobres Colegas, policiais não são cinegrafistas, sendo assim, a captura das imagens por meio dessas câmeras, podem trazer versões distorcidas do que realmente ocorreu no momento da ocorrência, o que representa um sério risco, tanto para os policiais, quanto para a sociedade”, diz o texto.

Atualmente, o PL está na Comissão de Constituição e Justiça e ainda não tem prazo para ser apreciado. Porém, a OAB/SC emitiu um ofício pedindo a participação na discussão do projeto, justificando que dados apontam que o uso dos equipamentos junto as fardas ajudam não só no monitoramento da conduta do agente, mas também no aperfeiçoamento de protocolos.

— Existe uma sindicância muito grande em ver a câmera como um aliado. O policial que age dentro da legalidade vai ver como aliada — pontua o advogado Guilherme Stinghen Gottardi.

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Contraponto

Em nota, a Polícia Militar, em conjunto com a Secretaria de Estado de Segurança Pública de Santa Catarina (SSP), informou que das as mortes decorrentes de confrontos são apuradas e que os agentes são reconhecidos “pela alta capacitação técnica e doutrinadas para o uso moderado e progressivo da força”.

O órgão diz, ainda, que tem intensificado ações com o objetivo de combater o crime organizado, com ações na área da inteligência e mesmo intervenções armadas, “que resultam em muitas prisões e apreensões de armas e entorpecentes”.

Confira a nota na íntegra:

“Sobre o aumento das mortes em confronto policial em Santa Catarina, a Polícia Militar de Santa Catarina, em conjunto com a Secretaria de Estado da Segurança Pública de Santa Catarina (SSP-SC) e as demais Forças de Segurança, informa que todas as mortes são apuradas em inquérito policial, peça investigatória que segue seu curso perante o Ministério Público e na sequência, segue o regular trâmite Judicial. As Polícias de Santa Catarina são reconhecidas pela alta capacitação técnica e doutrinadas para o uso moderado e progressivo da força.

Um outro aspecto é que as forças de Segurança Pública do Estado têm intensificado ações de prevenção e repressão aos grupos criminosos que lutam para se instalar em Santa Catarina e aumentado o número de cumprimento de mandados de prisão, assim como o monitoramento dos grupos criminosos em trabalhos de inteligência, haja vista a ocorrência de mortes violentas registradas entre disputas de facções do crime organizado, principalmente no Norte do Estado, nos primeiros meses deste ano.

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Em que pese os confrontos no âmbito do crime organizado, toda a estrutura de Segurança Pública do Estado vem mantendo operações contínuas de combate a estes grupos criminosos através de ações na área da inteligência e mesmo intervenções armadas, que resultam em muitas prisões e apreensões de armas e entorpecentes.

A SSP-SC informa ainda que a grande parte dos indicadores de criminalidade em Santa Catarina, que sempre preocuparam a sociedade, se mantém em queda. Tais como, o número de latrocínios, o qual diminuiu 70% no Estado no primeiro semestre de 2023 em comparação com mesmo período do ano passado. Também o número de roubos, que diminuiu 18,4% no primeiro semestre de 2023 em comparação com o mesmo período do ano passado.

Salientamos que, nos primeiros meses de 2023, o governo de Santa Catarina já investiu mais de R$ 80 milhões em equipamentos para a segurança pública catarinense e autorizou abertura de concurso público para reforçar os efetivos das Polícias Militar e Civil“.

SC tem queda nos latrocínios, mas homicídios crescem

Dados do Monitor da Violência do g1 mostram que o número de assassinatos em Santa Catarina cresceu 5,2% no primeiro semestre de 2023. Ao todo foram 321 mortes, contra 305 nos primeiros seis meses do ano passado.

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O único indicador que apresentou queda foi o latrocínio (roubo seguido de morte). Neste ano, foram três casos no primeiro semestre, enquanto em 2022 foram 10 no mesmo período — uma redução de 70%.

Além disso, Santa Catarina registrou um aumento de 3% nos feminicídios. Ao todo, foram 30 mortes nos primeiros seis meses do ano, enquanto no ano passado foram 29 no mesmo período.

Por fim, em relação ao crime de homicídio doloso (quando há intenção de matar) o crescimento foi de 6,5%: passou de 288, no ano passado, para 307 em 2023.

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