Exemplo de ascensão no futebol brasileiro, subindo da Série D para a Série A do Campeonato Brasileiro em apenas cinco anos e ainda com uma final de Copa Sul-Americana, em 2016, a Chapecoense parece ter perdido o brilho. Nos últimos três meses, o Verdão do Oeste de Santa Catarina acumula derrotas. Caiu para a Série B nacional e, a quatro rodadas do fim da primeira fase do Catarinense, briga para não ser rebaixada.
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Com dois pontos na tabela e apenas um gol marcado em cinco jogos, a Chape ocupa a penúltima posição no Estadual. Está a três pontos do Tubarão, 8º colocado, e precisa vencer o Criciúma neste sábado (15), na Arena Condá, para fugir da disputa contra o rebaixamento, em dois jogos de mata-mata, que neste momento seriam contra o Concórdia.

O cenário remete ao início dos anos 2000, quando o clube chegou a ser rebaixado em 2001, mas acabou não disputando a Segundona devido a um Torneio Seletivo, em que se classificou para o Catarinense de 2002 ao vencer um mata-mata contra o Kindermann, de Caçador. A situação tem deixado indignados os torcedores, que estão em cada vez menor número na Arena Condá.
Lucas Marca, integrante de uma das torcidas organizadas, diz que os jogadores têm parcela de culpa pelo futebol que vêm apresentando e também pela falta de vínculo com a torcida. Ele diz que os atletas nem cumprimentam os torcedores nos jogos, seja em casa ou longe de Chapecó. Outro torcedor, Alessandro Vermelho, também reclama do atual elenco.
– Tem que enfrentar os adversários com mais humildade. Falta união e vontade. São cinco resultados negativos e o time não mostra evolução – lamenta o torcedor.
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Presidente do clube entre 2009 e 2010, Nei Mohr, o Nei Maidana, que chegou a ser vice-presidente de futebol em 2017, entende que a queda da Chapecoense tem a ver com má gestão do clube, tanto no aspecto financeiro, quanto de gestão do futebol.
– A gestão infelizmente foi problemática, pois perdemos a oportunidade de consolidar o clube. Foi aprovado um orçamento com receitas que não estavam certas que iriam vir, que não dava para contar. Agora, resta tentar equilibrar as dívidas que foram herdadas de 2019 – pondera Maidana.
Para o empresário Rafael Bitencourt, que acompanhou outras fases difíceis vividas pelo clube, a Chapecoense perdeu muito com o acidente aéreo. Além de ter abalado emocionalmente a cidade, o Verão perdeu diretores, comissão técnica e jogadores. Depois, houve um inchaço de funcionários, na avaliação dele.
– A tragédia é um ponto difícil de administrar. Depois teve as questões trabalhistas. Além disso, tinha muitos funcionários no clube – afirma.
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A Chape chegou a ter 231 funcionários. No final do ano passado, quando as dívidas começaram a acumular, o clube iniciou uma ação de redução do quadro de trabalhadores e também de renegociação dos contratos. Entre os demitidos estava o filho do ex-presidente, que gerenciava o departamento de marketing.
Presidente da Chape diz que dívidas atrapalham
O atual presidente da Chapecoense, Paulo Magro, foi um dos poucos que permaneceu para arrumar a casa. Para ele, a perspectiva de algumas receitas que não se concretizaram, como sobre transmissões internacionais, patrocínio de criptomoeda, além da redução de sócios pela má campanha e a queda para a Série B tiveram um impacto grande. O orçamento bateu em R$ 110 milhões, o que resultou num déficit próximo de R$ 25 milhões.
– Em 2019 tivemos muitos problemas financeiros, com até oito meses de atraso nos direitos de imagem. A gestão acabou não atendendo as expectativas. Quanto ao time, tivemos várias contusões, o time não encaixou, embora os jogadores tenham se esforçado e jogado no limite – pondera o comandante.
Mesmo assim ele não perde o otimismo e acredita na recuperação do time e no trabalho do técnico Hemerson Maria.
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– Ele tem o perfil da Chapecoense e tem trabalhado muito. Não tivemos lesão muscular. Mas como chegaram oito novos jogadores, o time ainda não encaixou. A gente sabe que precisa mais três a quatro contratações para a Série B. A gente esperava estar melhor na tabela. Mas temos mais dois jogos em casa e mais dois jogos fora para buscar oito pontos e classificar (no Estadual). Também queremos disputar uma Série B sem riscos de cair para a Série C – projeta o presidente.
O zagueiro Kadu, que estreou contra o Marcílio Dias, acredita que uma vitória diante do Criciúma vai mudar a situação. Ele diz que o grupo está trabalhando, mas ainda sente o peso da má fase na hora de definir.
– Mesmo quando não estava aqui acompanhei a Chapecoense e ela vem de um peso do ano passado. A direção está fazendo tudo certo, os jogadores e comissão técnica estão trabalhando, mas a gente precisa dos três pontos. Uma vitória muda tudo – destaca.
Reconstrução começou com bons resultados
O primeiro ano de gestão de Plínio Arlindo De Nes, que era presidente do Conselho Deliberativo e foi eleito para reconstruir o clube após um período de interinidade de Ivan Tozzo, foi de bons resultados dentro de campo. Ele trouxe Rui Costa para diretor-executivo de futebol, tendo João Carlos Maringá e Nivaldo também no departamento de futebol e Nei Maidana como vice.
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Com o auxílio de outros clubes que cederam jogadores pagando parte dos salários, a Chapecoense fez um bom time, treinado por Vagner Mancini. Venceu o Catarinense cinco meses após a tragédia, chegou a liderar o Campeonato Brasileiro e só não passou para a segunda fase da Libertadores pela escalação irregular do zagueiro Luiz Otávio. O Lanús, time argentino que estava da chave da Chape, chegou à final da competição.
Depois de alguns maus resultados Mancini foi demitido. Vinícius Eutrópio foi contratado, mas não engrenou. Foi então que o clube trouxe Gilson Kleina, que terminou o Brasileiro na 8ª posição e classificou o clube novamente para a Libertadores.
A derrota em casa para o Figueirense na final do Catarinense de 2018, aliada à eliminação da Libertadores para o Nacional, do Uruguai, frustrou a torcida. Com a saída de Gilson Kleina na metade de 2018, também saiu Rui Costa. Veio Guto Ferreira, que afastou Wellington Paulista do time. Também não deu certo.
Faltando nove jogos e na zona de rebaixamento, a direção foi buscar Claudinei Oliveira, que recolocou Paulista no time e evitou o rebaixamento, com uma vitória sobre o São Paulo, por 1 a 0, na última rodada. Mas as rescisões de 2018 começaram a pesar no orçamento. Pela primeira vez na história do clube houve uma eleição com chapa de oposição.
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Cézar Dal Piva, o Mano Dal Piva, que gerenciava as categorias de base, montou uma chapa para enfrentar Plinio David De Nes. Mesmo assim este foi reeleito para um mandado de mais dois anos.
Nessa virada o departamento de futebol teve troca de diretor, com a saída de André Figueiredo e a chegada de Newton Drummond. Depois de uma boa largada no Estadual, foi eliminado da Copa Sul-Americana pelo Unión La Calera, do Chile. Ney Franco assumiu o comando, mas perdeu a final do Catarinense, nos pênaltis para o Avaí.
Começou mal no Brasileirão e acabou demitido, assim como Drummond. O auxiliar técnico Emerson Cris comandou alguns jogos e depois foi contratado Marquinhos Santos, que não conseguiu salvar o time da queda.
Como os bastidores contribuíram para a má fase em campo
Nesse contexto, os bastidores do clube também colaboraram para a queda. Os salários atrasaram, o presidente primeiro pediu licença por motivos de saúde e depois acabou saindo de forma definitiva. Com esse movimento, outros vice-presidentes também se afastaram. O vice de Administração, Paulo Magro, assumiu a presidência na reta final do ano.
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O presidente do Conselho Deliberativo, Rudimar Bortolotto, que assumiu o cargo em janeiro do ano passado, disse que percebendo os rumos que o clube estava tomando, foi nomeado um comitê de análise e posteriormente criado um comitê gestor para o clube. Para ele, a atual situação é reflexo de como tudo no clube foi conduzido após o acidente.
– Depois do acidente algumas pessoas acharam que a Chapecoense era uma vítima e que estava acima dos problemas de todos os clubes, que são receita, despesa e resultado de campo. O clube também poderia ter capitalizado melhor o período pós-comoção, além de ter adotado uma gestão mais rígida, mais franciscana, mais eficiente. Foi montado um time com valor muito alto e ruim – comenta.
O ex-candidato da oposição e que acabou sendo convidado para ser vice-presidente de futebol da Chapecoense, Cézar Dal Piva, após o rebaixamento do ano passado, disse em entrevista para a Rádio Oeste Capital que o alerta já havia sido dado em 2018.
– A queda já tinha se alinhado. Se olharmos, ano passado (2018), teve um aviso quando escapamos na última rodada. Não foi assimilado, planejado e estudado o que aconteceu – disse.
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Ex-presidente disse que divisão nos bastidores foi motivo da queda
O ex-presidente Plinio David De Nes Filho disse que a Chapecoense passa por um momento difícil mas que já passou por outros tempos complicados, como no rebaixamento do Catarinense de 2010, que não se efetivou pela desistência do Atlético Hermann Aichinger.
Ele justificou que o futebol é caro, que exige pessoas estratégicas e que isso custa dinheiro. Ele afirmou que não concorda com o “desmonte” que foi feito no clube, com a demissão de funcionários. Plínio de Nes disse que a Chapecoense ficou vulnerável depois do acidente, mas com o auxílio de muitas pessoas, clubes e empresas conseguiu se reerguer.
Afirmou que o clube investiu R$ 46 milhões em sua gestão, sendo R$ 19 milhões em jogadores, quatro milhões em melhorias na Arena Condá e R$ 21 milhões relativas a despesas ligadas ao acidente aéreo. Disse que sempre foi favorável aos acordos trabalhistas e que todas as despesas passavam pelo crivo de seus vices. Para ele a queda da Chapecoense foi fruto de divisões nos bastidores, que minaram a diretoria.

– Após a eleição de 2019 infelizmente não durou muito a tranquilidade e a serenidade de uns e de outros. Isso começou a gerar problemas para a presidência. O conceito adotado sobre as mudanças, algumas necessárias, outras não, foi de que deveríamos promover cortes nos gastos da Chapecoense. Não me opus e concordei, desde que me mostrassem antes, o que não aconteceu. Quando pedi licença médica por 60 dias devido a extremo cansaço físico e mental, eles inviabilizaram meu retorno à Chapecoense, bem como a própria Chapecoense – destacou.
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Inclusive disse que foi solicitado que não fosse mais ao vestiário. Ele avalia que o grupo que disputou o Campeonato Brasileiro sofreu com equívocos da arbitragem mas, mesmo assim, tinha condições de manter o time na Série A. Na sua avaliação foram as turbulências dos bastidores que acabaram sendo decisivos para a queda.
– O ambiente não era bom mas a Chapecoense jamais cairia, independentemente das dívidas. Não era isso o problema. Levaram para dentro do vestiário a imagem de uma diretoria dividida. E aí meu amigo, quando o vestiário não tem unidade, não existe quem segure- justificou Plinio De Nes.