Nas quatro maiores cidades da Grande Florianópolis, o ano letivo começa com 8.535 crianças esperando vagas em creches e pré-escolas municipais. Na Capital, são 1.331 nomes na lista de espera. Em Biguaçu, 200. Em Palhoça e São José a situação é mais dramática: na primeira, são cerca de 3.800 crianças fora da escola, na segunda, 3.204. É o que apontam os levantamentos delas secretarias municipais de Educação.

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A Constituição determina que, a partir dos quatro anos de idade, é obrigatória a matrícula. Até os três, a vaga em creche é optativa, mas caso os pais tenham interesse e necessidade, o poder público deve fornecê-la.

“O maior gargalo está, em tese, nas creches (de 0 a 3 anos de idade), em razão de muitos gestores públicos entenderem que não se trata de um obrigatoriadade”, pontua, em nota, a 15ª Promotoria de Justiça da Capital, que tem atribuição para atuar nos casos que envolvam escolas municipais.

Jocimere Carla de Paula, de 30 anos, trabalha como diarista em Florianópolis para sustentar seus três filhos – Miguel, de um ano, Enzo, de cinco, e Caíque, de 12 anos. Atualmente, só Caíque está matriculado. Jocimere teme ser acionada pelo Conselho Tutelar.

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— Estou aguardando vaga e até agora nada. O Enzo tem cinco anos, idade obrigatória para estar na escola. Se alguém ver ele em casa e chamar o Conselho Tutelar, até a gente explicar que não tem vaga, já virou processo.

Enzo fica sob os cuidados de uma amiga de Jocimere, ao custo de R$ 200 por mês.

De acordo com a conselheira tutelar do norte da Ilha, Olga Iung, a falta de vagas acarreta muitos outros problemas, mas o foco não é prejudicar os pais que procuram uma vaga para os filhos.

— Não tendo escola, a criança fica sozinha ou com o irmão de 10 anos, por exemplo. É mais violação de direito. É muito risco só por não ter uma vaga na escola. Agora estamos pressionando a prefeitura, não os pais, porque a gente sabe que eles estão aqui buscando o direito dos filhos.

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Quando uma criança deixa de ingressar na educação infantil, ela pode ter mais dificuldades na alfabetização. O resultado, lá na frente, é uma maior possibilidade de evasão escolar. Por esse motivo, o professor Lourival José Martins Filho, que é especialista em educação básica e professor da Udesc, defende que a educação infantil é um direito da criança, independentemente de categorização.

— No mundo contemporâneo, o direito de viver a infância em ambientes educacionais saudáveis e que estimulem a pergunta e a curiosidade é fundamental. Não é apenas o trabalho de pais e mães que está em jogo, mas das crianças como seres humanos da aprendizagem — defende.

Mães sobrecarregadas

A vendedora Jéssica Espíndola, de 22 anos, e do pedreiro Émerson Carlos Schmied, 25, moradores do bairro Aririú, em Palhoça, esperam por uma vaga para o filho Enzo, de dois anos, há um ano e meio.

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— Por enquanto ele está com a minha sogra, que está desempregada. Mas eu tenho que achar uma vaga para ele, pra minha sogra poder trabalhar. Ela estava para conseguir um emprego em um mercado, mas teve que negar porque não tinha ninguém para ficar com ele — lamenta Jéssica.

Kele Fernando Sippel, de 30 anos, está grávida de seis meses. O primeiro filho, Érik, de três anos, até conseguiu uma vaga em creche de Florianópolis, mas a distância é um problema para a família. Há ainda o Lucas, de um ano e meio, que não conseguiu vaga.

— Quero uma creche para ele (Lucas) e tentar mudar o Érik para período integral ou, ao menos, mudar para a tarde, porque não tenho como levá-lo de manhã. A creche fica a dois quilômetros da minha casa, mas como já tenho que ficar em repouso, não consigo levá-lo. Meu marido só pode levá-lo à tarde, então está complicado.

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O Ministério Público de Santa Catarina tem acompanhado a situação de Kele e tantas outras mães da região metropolitana de Florianópolis. A 15ª Promotoria de Justiça da Capital confirma que a grande problemática da rede pública de ensino está nas creches, apesar de ser notória a qualidade do serviço em comparação a outras cidades brasileiras.

“O MP tem ingressado com ações civis públicas, a fim de que o município disponibilize vaga em creches. Caso a determinação judicial não seja atendida, poderá ser aplicado o sequestro de valores para custear os estudos numa unidade educacional particular”, informou a promotoria.

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O que dizem as prefeituras

Maurício da Silva, secretário de Educação de Floripa

A obrigatoriedade por lei é dos quatro aos 17 anos. Não existe uma única criança na fila na pré-escola. A fila é na creche, aquilo que a legislação não coloca como obrigação. No entanto, entendemos que se uma criança quer estudar temos que ter um esforço para que essa criança esteja na unidade educativa. É importante reconhecer o esforço que estamos fazendo, não podemos só falar no dado objetivo, de 1.300 crianças fora da escola. Tem (municípios) vizinhos nossos que são muito menores e a fila é muito maior. O que acontece em Florianópolis? Como a educação infantil é de qualidade, as pessoas não pagam unidade particular. Então sempre vai ter fila. Vamos inaugurar novas unidades em 2018, com quase 2 mil novas vagas. São 11 unidades em construção, sendo 10 de educação infantil, mas nem todas ficarão prontas neste ano.

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Shirley Scharf, secretária de Educação de Palhoça

A maior dificuldade é a demanda crescente de crianças na lista de espera da educação infantil, um problema agravado pelo crescimento populacional em Palhoça e a crise econômica no Brasil. Neste momento, buscar o serviço público deixou de ser uma escolha e passou a ser uma necessidade. Um exemplo é que há quatro anos tínhamos 2,2 mil crianças à espera por uma vaga. Criamos 2 mil novas vagas, deveriam faltar apenas 200, mas hoje a fila está em uma crescente e supera 3 mil crianças. Os municípios estão pagando o alto preço pela dificuldade financeira que todos enfrentam. São as prefeituras que oferecem os atendimentos básicos. As demandas em relação à lista de espera da educação infantil podem ser encaminhadas diretamente no Centro de Educação Infantil mais próximo da residência. Cinco novos centros de educação estão em fase de conclusão e serão entregues ainda nesse primeiro semestre. Três deles eram obras do governo federal com repasse em atraso e a prefeitura retomou as obras por meio de parceria público-privada.

Lilian Boeing, secretária de Educação de São José

A busca por uma educação de qualidade é contínua, portanto, os desafios são constantes. Dentre eles, podemos destacar três aspectos fundamentais: manutenção, ampliação e adequação da estrutura física, ampliação da oferta de vagas e melhora na qualidade do ensino. O município de São José vem recebendo todos os dias um fluxo migratório intenso. Essas pessoas buscam por oportunidades e a educação representa o foco principal desse processo. Sendo assim, a ampliação da nossa rede é nosso principal ponto a ser melhorado. Estamos trabalhando nisso. A prefeitura entregou obras de reforma e ampliação de duas unidades – o CEI Vila Formosa (Forquilhas) e o CEI Nossa Senhora das Graças (Bela Vista). Além disso, estão sendo construídas três novas unidades para atender as comunidades de Potecas, do Luar (Serraria) e do Loteamento San Marino (Forquilhas), que devem ser concluídas até o final deste ano, possibilitando a abertura de cerca de 850 novas vagas.

Kátia Bichels, secretária de Educação de Biguaçu

A meta é melhorar a infraestrutura dos espaços das unidades escolares. A maior dificuldade é administrar uma grande demanda com poucos recursos. A rede é constituída de 20 espaços educativos, quatro polos da Educação de Jovens e Adultos, três polos de atendimento educacional especializado, um núcleo de educação interdisciplinar e um Centro de Ensino Profissionalizante onde as demandas de problemas aparecem diariamente. Apesar dos problemas enfrentados nos municípios brasileiros, no que se refere à questão financeira, nosso município vem se empenhando em manter a qualidade do atendimento e dar melhorias necessárias para o bom andamento da rede municipal.

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