Quarta-feira era dia de piquenique para as meninas do 5º ano do Centro Educacional Pedro Rizzi. A escola do bairro Cidade Nova, em Itajaí, era onde a pequena Thaynara Thalita Cidade Serpa, de 10 anos, estudava desde 2014. Nesses quatro anos a timidez e a introspecção da pequena foram dando lugar a uma personalidade mais segura, muito por causa das inseparáveis amigas de sala. Nesta quarta, a empolgação do recreio no pátio deu lugar a uma oração no início da aula. Parte da aula da turma 502 foi na biblioteca, para ajudar a distrair os alunos e esquecer a ausência de uma aluna em especial.
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Oito horas antes, Thaynara, o irmão mais velho Gabriel Lins Pereira, 15 anos, e a caçula Ana Vitória Cidade Serpa, 3, encontraram a morte de forma repentina. Durante o temporal que atingiu o Vale do Itajaí por volta das 5h de ontem, eles saíram da casa em que moravam, no bairro Carvalho, por medo de que o vendaval pudesse derrubar a moradia, em uma área de ocupação na entrada da cidade. Ao cruzarem a porta, foram eletrocutados após pisarem em uma poça d¿água onde um fio energizado estava caído.
Gabriel morreu na hora e as meninas chegaram a ser transportadas ao Hospital Pequeno Anjo, mas não resistiram. A mãe dos jovens, Tatiana Cidade, 34 anos, também havia saído de casa e foi atingida. Até a noite de ontem ela estava em recuperação no Hospital Marieta Konder Bornhausen. Tatiana está grávida de dois meses e, segundo informações do setor de Desenvolvimento Social, o bebê não teria sido afetado. O pai das duas meninas, Marcelo Serpa, 36, trabalha em uma empresa de coleta de lixo e não estava em casa no momento das mortes – ele havia saído às 5h para trabalhar.
– A gente tentou tirar os fios com madeira, jogamos uma escada perto para tentar encostar neles, mas quando a gente conseguia, levava choque. Tudo ali estava dando choque – contou Anderson, vizinho da família que foi um dos primeiros a encontrarem as crianças atingidas pelo choque, à reportagem da RBS TV.
A menina do laço
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A supervisora da escola Pedro Rizzi, Fernanda Opazo, lembra de Thaynara como uma menina que chegou à escola tímida e que se retraía por ter dificuldade para ler. Algo que mudou depois de um trabalho de reforço no espaço de alfabetização, que fez dela uma frequentadora assídua da biblioteca da escola. Cruzava todo dia de bicicleta os cerca de dois quilômetros para as aulas do período vespertino. Era carinhosa com as professoras e manifestava a vaidade em detalhes como um lacinho que sempre adornava os cabelos castanhos e compridos. Nos últimos meses, o aparelho ortodôntico foi outro motivo para sorrisos cada vez mais seguros a Thaynara.
– Depois das aulas de reforço ela perdeu um pouco da timidez e pegou mais segurança, também por causa das amigas que sempre andavam com ela. Ela despertou para a aprendizagem e, no ano passado, parece que ¿desabrochou¿ – conta a educadora.
O último registro de matrícula nas escolas de Itajaí do irmão Gabriel havia sido em 2015, à época no 6º ano do ensino fundamental. Todo dia de manhã era dele a missão de levar a irmã mais nova, Ana Vitória, à creche Prefeito Eduardo Dadinho Canziani, também no bairro Cidade Nova. No fim da tarde, era o pai Marcelo quem buscava a pequena.
– Os pais são pessoas simples, mas bem presentes, participavam sempre das reuniões. Ontem mesmo ele perguntou para a professora como ela estava – conta a diretora Josiane Evaristo.
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Da pequena a educadora se lembra de uma menina de cabelo castanho claro e que adorava se render a brincadeiras com fantasias nos cantinhos temáticos da sala do jardim, que dividia com outros 23 alunos. Cantos que desde ontem, como os piqueniques da escola Pedro Rizzi e a casa da família Serpa, terão um vazio e uma sofrida missão: superar as lembranças da última tempestade.
Os corpos dos três filhos de Tatiana e Marcelo foram velados desde ontem no Cemitério do bairro Fazenda, em Itajaí. O sepultamento está marcado para ocorrer às 16h desta quinta-feira.