Não é possível precisar quantas cidades cabem dentro de Florianópolis. Isso porque cada um dos 574.200 habitantes (dado da prévia do Censo 2023 divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE) consome Florianópolis de uma forma diferente. Tem quem sempre morou na Lagoa da Conceição, Leste da Ilha, e nunca pisou nas praias do Norte. Há milhares que moram em morros como o da Mariquinha, do Céu e da Caixa e que encontram menos comodidade do que os que moram no asfalto. Outros que vivem no Sertão do Ribeirão ou em Ratones e desfrutam de uma Floripa ainda com estrada de terra em certos pontos. 

Continua depois da publicidade

Receba notícias de Santa Catarina pelo WhatsApp

Leia todas as reportagens do especial Floripa 350 anos

Existe a cidade dos que vivem em áreas mais nobres como Jurerê Internacional (ou In) e em parte do Centro. Para esses a cidade é arborizada, tem calçadas largas, é cheia de supermercados e manicures que cobram R$ 100 por pé e mão. Tem que viva nos Ingleses e ache que Florianópolis é outro município, já que o bairro dispõe de agências de quase todos os bancos, lojinhas de tudo que é utensílio e farmácias em quase todas as esquina. Quando tiver um cinema certamente o pedido de emancipação será encaminhado à Câmara de Vereadores em regime de urgência. 

Os universitários consomem a Florianópolis dos arredores da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Se espalham pelos bairros Carvoeira, Pantanal, Córrego Grande, Saco dos Limões e Trindade onde encontram uma dezena de bares que vendem cerveja de litrão (uma raridade já que em outros cantos da Ilha só se vende long neck). A cidade para eles é ainda a praça do Pida, o shopping e os ônibus quase sempre lotados em horário de pico mesmo que circulem de 10 em 10 minutos.

Continua depois da publicidade

Tem quem esqueça, mas Florianópolis também é formada por uma área no Continente. Os moradores da parte que não é cercada em sua totalidade pelo mar consomem uma cidade que tem um parque enorme com área pet, uma via gastronômica com restaurantes de frutos do mar, hamburguerias e bares com drinks esquisitos. Na área continental é possível encontrar também uma escola de samba (Viva Coloninha!), o estádio do Figueirense e lojas improvisadas em tudo que é espaço que pode virar ponto comercial. 

No Sul da Ilha, a cidade é outra. Parece interior em alguns pontos como na rua que leva aos Açores e a Costa de Dentro. A lógica de funcionamento é outra. Quem administra os famosos restaurantes, compra o peixe ali mesmo na peixaria à frente. Não precisa ir até o Mercado Público, no Centro. 

Os moradores dali consomem o mar gelado, a praia sem barulho de caixa de som, fazem trilha para chegar em uma cachoeira, fazem armadilhas não para os ladrões, mas sim para que os gatos de rua não comam tudo que plantam em suas hortas. 

O IBGE tem mapeado todo o Brasil no último ano para saber quantas pessoas moram em cada um dos 5 mil municípios do país. Esse levantamento é fundamental para sabermos o que mudou de 2010 — quando foi feito o último levantamento —  para cá. O que temos de números são estimativas que em relação a Florianópolis apontam um crescimento bastante significativo. 

Continua depois da publicidade

Em 2010, o número de pessoas que viviam aqui era de 421.240 pessoas. Como o Censo destrincha os dados, é possível saber que 69% eram catarinenses. Alésio dos Passos está neste montante. O manezinho da Ilha, nascido e criado na Lagoa da Conceição, é testemunha das mudanças que a cidade sofre há 73 anos. 

Viu a luz elétrica chegar aqui, a água da Lagoa da Conceição passar por assoreamento e se tornar imprópria para banho em alguns pontos. O bairro cresceu e virou point de turistas, principalmente estrangeiros, enquanto ele casou, teve duas filhas e se tornou especialista em plantas medicinais. Cultiva no jardim que mantém mais de 700 espécies e sabe o nome, origem e para que cada uma delas serve. É uma enciclopédia viva. 

A população que o IBGE encontrou em 2010 também era formada por gaúchos. Eram 53.476 mil. A violinista Iva Giracca era uma entre eles. Veio para cá pela música — para tocar junto a Camerata — e não saiu mais, nem do grupo musical, nem da cidade. 

Quem vai ser computado pelo próximo censo como morador da Capital, é o chef de cozinha Igor Krupp. O cozinheiro veio para cá há três anos e se diz um apaixonado pela abundância culinária da capital. Se encantou também pela pesca e de vez em quando acompanha a pesca dos cardumes no trecho de praia que engloba um pouco de Canasvieiras e Jurerê. 

Continua depois da publicidade

A multicultural Florianópolis de 12 anos atrás também era formada por paranaenses. Dos 22.363 mil, um deles era Silvio Y. Sato. Hoje professor de Biologia em dois colégios tradicionais da cidade, ele chegou aqui calouro da UFSC há 30 anos. O também “agitador cultural” lembra que Florianópolis antiga não tinha filas, era tranquila. Já a atual, o faz correr para o Paraná no verão, época em que todas as estradas ficam engarrafadas independente do clima (o fluxo é para praias nos dias de sol e para os shoppings nos dias de chuva).

Uma outra porção de brasileiros que formava Florianópolis há 12 anos era de paulistas (19.624). Fernanda Marcondes, que chegou aqui em 2019, será computada pelo Censo mais atualizado, mas se sente manezinha de nascença, já que aqui renasceu. A cidade fortaleceu a artista que fotografa e também produz placas esotéricas. Uma delas, indicando um ponto de abdução, virou ponto turístico para quem se aventura na trilha da Lagoinha do Leste. 

Mais de 7 mil fluminenses moravam em Florianópolis. Na época, Athenè Tamisier, que chegou em 2006, já tinha criado raízes aqui. A mais forte delas talvez seja a escola de dança certificada internacionalmente e que resistiu à pandemia. É nela que a bailarina e professora passa boa parte dos dias. A cidade de 675,4 km² de área tem para ela o tamanho de dois sala de dança, um de troca, um banheiro e uma lojinha. 

O IBGE também mostrou que a população tinha ainda estrangeiros. Sem especificar o país de origem, o instituto trouxe o número de 4.622 mil. Mouayad Faruk chegou depois do Censo. Era 2015, quando o sírio se apaixonou pela cidade no instante em que a viu pela janela do avião. Agradeceu a Deus por trazê-lo para cá. Aqui construiu sua vida, um restaurante e já trouxe o irmão e uma cunhada para também morar em Florianópolis. 

Continua depois da publicidade

O Censo de 2010 mostra ainda que a população da Capital do Estado era formada por mineiros (3.442), baianos (2.872), sul-mato-grossense (1.768), brasiliense (1.205), pernambucanos (1.118) e cearenses (1.024). Havia mais moradores de outros estados, mas o número não chegava a casa dos mil (amapaense, por exemplo, eram 53). 

Até que seja divulgado o Censo 2023 em sua totalidade, o que temos de dados sobre a população é baseado em estimativas feitas anualmente pelo IBGE. Elas, no entanto, não detalham os dados. A previsão é que o novo levantamento seja divulgado em abril.

Cidade ganhou 89 mil habitantes em 12 anos. Elas cabem aqui? 

Entre 2010 e 2022, Florianópolis ganhou pelo menos 89 mil novos habitantes. É como se nesse período 35 pessoas resolvessem mudar para cá todos os dias. Entre várias mudanças que a cidade sofreu (bairros ganharam novas ruas improvisadas, mais prédios foram construídos) até mesmo a forma como as pessoas chegam aqui mudou. 

Para chegar à Ilha por terra em 2010, a Ponte Pedro Ivo era a principal e única opção. Agora, o caminho pode ser feito pela Ponte Hercílio Luz, inaugurada em dezembro de 2019. 

Continua depois da publicidade

Mudou também a forma de embarcar em aviões ao chegar ou deixar a cidade. Um novo aeroporto foi inaugurado com mais voos anunciados (mais linhas internacionais até mesmo fora de temporada). 

Mas toda essa gente que chegou precisou de casa para morar, escola para os filhos, transporte público para se locomover. O arquiteto, professor aposentado da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e ex-secretário de Urbanismo e Meio Ambiente de Florianópolis, César Floriano, avalia como inevitável o crescimento da cidade.

Floriano explica que a forma como Santa Catarina cresceu como um todo afeta Florianópolis. Um dos fatores são os pólos de desenvolvimento fora da Capital ((Joinville, Blumenau, Criciúma, por exemplo). Isso explica o porquê da cidade enquanto capital não ter habitantes na casa de 1 milhão. 

Contudo, o boom populacional que a cidade enfrenta hoje, em sua análise, é consequência do plano de desenvolvimento conduzido na década de 60. Onde foram pensadas estruturas físicas para receber novos moradores. 

Continua depois da publicidade

— Se em um primeiro momento houve um planejamento de aterrar, construir a Avenida Beira-Mar, toda a estrutura para receber esse desenvolvimento, agora isso de alguma maneira parou — diz César. 

Os principais gargalos atuais, em sua análise, são a falta de moradia adequada e a mobilidade urbana na cidade. Ele defende que seja feito um novo plano estratégico na cidade com foco nessas duas áreas. Cita que a construção de um BRT que ligue o Centro ao Norte da Ilha, pode ser uma alternativa. 

Em nota, a prefeitura de Florianópolis disse que tem direcionado esforços para identificar zonas críticas em relação à mobilidade urbana. Uma das respostas previstas, segundo a administração, é a operação do binário na região dos bairros Pantanal e Carvoeira. 

“Além de trazer maior dinamismo ao fluxo de veículos da região, também irá contribuir para a mobilidade ativa (com ampliação da malha cicloviária) e para o transporte coletivo”, escreveu a nota.

Continua depois da publicidade

Além disso, foi feito incentivo ao uso do transporte coletivo com iniciativas como transporte gratuito ao final de semana na alta temporada, que a prefeitura avalia como positivo e vai manter para o ano que vem. 

Veja vídeo sobre os personagens que escolheram Florianópolis como lar

Leia também

Imigrante sírio venceu a barreira da língua para viver em SC: “Abracei Floripa”

De família de investidores, chef gaúcho enaltece culinária manezinha da qual é fã

Violinista gaúcha adotou Florianópolis como lar e destaca efervescência cultural da cidade

Manezinho mantém viva a cultura de Florianópolis a partir da resistência

Paranaense escolheu Florianópolis como lar há 30 anos: “Adoro minha vida aqui”

Bailarina carioca escolheu Florianópolis para seguir na dança