Sanjay Surana
Após pedalar menos de um quilômetro por uma pista de lama no meio de um corredor de seringueiras, seguido por uma libélula vermelho-cheguei e arcos de bambu que criavam um dossel, fui sair perto de um laguinho barrento. Havia um píer destruído que se estendia para dentro da água, com um barco de pesca verde-claro amarrado nele, e uma placa de madeira pintada de branco, cheia de farpas, pregada a uma uva-da-praia que dizia “bebidas frias”.
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Porém, não havia uma viva alma à vista, apenas um cachorro cochilando que acordou, momentaneamente, com a minha presença. Prazeres simples e solitários de Pulau Ubin.
Essa ilha de 10,4 quilômetros quadrados, uma vez adornada pelas pedreiras de granito (“Pulau Ubin” significa “ilha do granito” em malaio) fica há apenas um passeio de barco de 10 minutos da cidade-estado de Singapura, mas o abismo entre eles não pode ser maior.
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Enquanto a Cidade do Leão, que comemorou seu 48º aniversário de independência em dezembro vem crescendo rapidamente nas últimas cinco décadas, Pulau Ubin, que não tem energia elétrica nem água corrente, parece uma terra esquecida pelo tempo, presa à década de 60, quando a recém-independente Singapura só tinha aldeias dispersas de palafitas baixas. E por isso, muitos singapurenses são gratos.
Comparada aos arranha-céus cobertos de vidro, os shopping centers com ar- condicionado e as vias expressas congestionadas em horários de pico de Singapura, Pulau Ubin é um antídoto para a existência urbana. E a julgar pelas chegadas – cerca de 2 mil todo fim de semana, mais um punhado de famílias francesas, mochileiros britânicos e jovens singapurenses que querem mudar de paisagem em dias de semana – de quem vem experimentar uma Singapura esquecida há muito tempo, esse é o atrativo de Pulau Ubin.
Do cais de Ubin, destino de barcos de madeira chamados bumboats e uma pequenina aldeia principal, umas poucas estradas pavimentadas levam até áreas para camping de praia, caminhos de terra, lagos de lótus ou lindos pantanais. A constante mais marcante é o silêncio.
Além do esquisito barulho abafado do pouso de um 777 em Singapura, o barulho limita-se ao cacarejar de galinhas, o cantar dos bicos-de-chumbo malhados, dos pega-rabudas e dos martins-pescadores, e o vento chacoalhando folhas de nogueiras-de-iguape, jambeiros-vermelho e palmeiras.
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Mas apesar de Pulau Ubin ser intocada, há uma grande preocupação por parte dos moradores, que defendem obstinadamente o estilo de vida retrógrado da ilha. Em janeiro, o governo publicou “O jornal branco da população: uma população sustentável para uma Singapura dinâmica”, projetando que a população da cidade-estado poderia chegar aos 6,9 milhões em 2030 (hoje em dia já é de 5,3 milhões), e pedindo 64,7 quilômetros quadrados de terra adicional, em um país de apenas três vezes e meia o tamanho de Washington D.C., possivelmente com o desenvolvimento de “algumas das nossas terras de reserva”.
Dois meses depois, os chefes de família da ilha receberam uma carta de um organismo de habitação pública do governo, com o título ameaçador “Esquema de desapropriação: desapropriação de imóveis adquiridos para o desenvolvimento do Adventure Park em Pulau Ubin”, novamente despertando o fantasma do desenvolvimento. Em julho, o governo acabou com os rumores afirmando que “atualmente não há nenhum plano de desenvolvimento para Pulau Ubin. Nossa intenção é manter Pulau Ubin em seu estado rústico pelo maior tempo possível, como um playground para os singapurenses”, que a carta mandada era de uma notificação de um censo e não uma ordem de despejo, e que “ela devia ter sido escrita mais cuidadosamente”.
Após a agitação de Singapura, a natureza intocada de Pulau Ubin é um alívio. Eu pedalei até Chek Jawa Wetlands, na costa sudeste de Ubin, uma reserva que possui seis tipos de ecossistemas (incluindo cascalho marinho, uma floresta costeira e manguezais, tudo visível do calçadão). Também é lar do calau-de-face-branca de voz penetrante, um centro de visitantes em uma casa de estilo Tudor e uma torre de observação de 21,3 metros que, depois de escalada, faz o visitante se sentir o rei da selva.
Pedalando a oeste, vi um casal de idosos perambulando do lado de fora de sua casa de telhado de lata. Ahmad Benkasim e Sapia Bentitayeb são casados há 50 anos. Benkasim (70) morou na ilha durante toda sua vida, e o amor deles por Ubin é evidente.
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“Aqui temos tudo, borracha, durião e jaca”, disse Benkasim. “Em Singapura, tem o quê, aço? Lá é quente e barulhento. Aqui, tem paz, as noites são frescas. Temos três filhos em Singapura que ainda gostariam de estar aqui. Aqui é nossa casa”.