Estudar muito e sonhar alto estão entre as principais recomendações do psicanalista italiano doutor em psicologia clínica e escritor Contardo Calligaris para os vestibulandos. No início de abril, ele participou do 3° Fórum ESPM de Educação, com o tema Educar Para a Autonomia: Vivenciando a Adolescência, em São Paulo. Dois dias depois do encontro, o psicanalista conversou, por telefone, com o Vestibular e deu as diretrizes do que acredita ser o caminho para um bom futuro profissional.

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Diário Catarinense: Existe algum meio de não se frustrar na escolha da profissão?

Contardo Calligaris: É impossível evitar todas as frustrações, elas são parte integrante da vida. Mesmo as pessoas que tiveram a impressão de escolher a profissão que queriam ou sonharam provavelmente vão se perguntar “era só isso?”. Tem maneiras de se frustrar mais ou menos. Aconselho a sonhar alto. Se alguém tem um projeto de profissão e um projeto de vida, não deve levar em conta questões como a grande competição para entrar. Escolher um curso porque tem poucos candidatos é uma forma de entrar com o pé esquerdo na profissão, por ser uma renúncia a alguma coisa que se queria.

DC: Sabemos que muitos estudantes trocam os cursos de graduação. Isso tem sido mais frequente?

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Calligaris: Sempre existiu a troca de cursos. Eu mesmo fiz a pós-graduação em uma linha diferente da graduação e não lamento isso, acho que foi ótimo. Não está escrito que deve se manter a escolha do curso para a vida inteira. Tenho amigos juízes que começaram Medicina com 50 anos e viram que queriam seguir a pesquisa. O campo de coisas que se pode fazer na vida é sempre muito mais vasto do que a capacidade de inventar ou sonhar a vida adulta quando somos adolescentes ou do que os pais podem imaginar. Claro que informação e experiência vão ajudar nessas escolhas.

DC: Como o senhor analisa a questão dos vestibulares no Brasil?

Calligaris: Sou a favor da supressão do vestibular porque se estudam matérias muito frequentemente inúteis para a escola futura, não se pensa tanto em uma cultura geral. Existem muitos jovens que podem ser péssimos alunos e entrando na faculdade, eles ficam muito melhores. Hoje, a faculdade os perde porque o vestibular os barra. O fato de se sair mal no vestibular não significa que a pessoa não possa ser um profissional de sucesso.

DC: O que é preciso para ser um profissional de sucesso?

Calligaris: Se diz que “precisa ter paixão pelo que faz”, isso é uma grande mentira. Para ser alguém competente, precisa fazer jornada de 10 horas de trabalho, inclusive nos finais de semana. Só paixão não é suficiente. Acreditamos em disposições e predisposições. Mas o bom profissional faz um esforço danado para adquirir competência. Talento é resultado de grande esforço. Quem fala de talento é muito preguiçoso.

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DC: Existe alguma fórmula para se passar no vestibular?

Calligaris: Não tem outro meio além do esforço. Se for possível estudar e ter uma rotina de esporte e sono regulado, melhor. Mas é preciso se esforçar.

Para seu Pai ler

DC: O que os pais podem fazer para ajudar os filhos na fase pré-vestibular?

Calligaris: Os pais devem encorajar os filhos a fazer o necessário para passar e ter o maior respeito possível pelas eventuais invenções dos filhos. Os pais devem encorajá-los a sonhar, é muito cedo ainda para os estudantes se resignarem na vida. É preciso dar chances para eles conhecerem pelas práticas de vida a diversidade de vidas possível. De um modo geral, eles chegam jovens ao vestibular, com 17 anos, e só sabem a fundo o trabalho dos pais.

DC: Como os estudantes podem ser incentivados a ler bastante?

Calligaris: A escola no Brasil é muito pouco exigente. Para se chegar a um vestibulando ao equivalente europeu, é preciso ter desde a escola primária a ideia de jornada de estudo não de cinco horas, mas oito, 10 horas no colégio. Os jovens que se formam em um secundário dito puxado são muito diferentes e adquirem hábito de leitura.

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DC: Os pais não podem ajudar nesses trabalhos?

Calligaris: Não é possível os jovens terem real apreço pelo trabalho e pelo esforço se os pais não conseguiram transmitir isso pelo próprio exemplo. Se os pais passam toda a infância dizendo que a única coisa que importa é chegar o final de semana, fica mais difícil explicar como é importante ler.

Currículo do entrevistado

Contardo Calligaris atuou como docente na New School de Nova York e na Universidade da Califórnia em Berkeley, nos Estados Unidos. É psicanalista, doutor em psicologia clínica e escritor. Escreveu diversos livros, entre eles: “A adolescência”, “Cartas a um Jovem Terapeuta”, “Crônicas do Individualismo Cotidiano”, abordando educação, modernidade, comportamento.

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