A divisão política na plateia da Câmara de Vereadores de Blumenau ficou clara quando o presidente da Câmara de Vereadores de Blumenau, Marcos da Rosa (DEM), chegou ao plenário. Mais da metade das cerca de 120 pessoas se levantaram e iniciaram uma sessão de aplausos e de gritos de “Me representa” por longos três minutos depois. O silêncio não tem vida longa em tempos de polarização. Assim que as vozes dos apoiadores do presidente calaram, foi a vez dos cerca de 40 manifestantes favoráveis à discussão de gêneros em escolas da cidade entoarem coro contra o presidente do Legislativo e exibirem cartazes com dizeres como “Vamos falar sobre gênero, sim” e “Lutar por igualdade não é ditadura”. Com movimentos rivais gritando e criticando lado a lado, houve quem comparasse, com alguma razão, o cenário a uma arena de UFC.
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O combustível que voltou a inflamar essa fogueira ideológica foi despejado na sessão de terça-feira, quando os vereadores aprovaram uma moção de repúdio a um festival de cinema da Escola Elza Pacheco, marcada para novembro, que contará com um ciclo de palestras sobre diversidade. Um curso oferecido por outra escola, a GPM Educacional, o famoso Pontinho Estudantil, também com o tema discussão de gênero, foi alvo de nova moção – que acabou sendo tirada da pauta pelos vereadores a pedido de um diretor da instituição. As manifestações revoltaram militantes do movimento LGBT e defensores das discussões sobre gênero nas escolas, que ontem decidiram ir até o Legislativo protestar durante a sessão. Como resposta, o Movimento Brasil Livre (MBL) também mobilizou apoiadores para ir até a Câmara ontem.
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Durante a sessão, o debate foi mais quente do que na terça-feira. Vereadores que votaram a favor da moção de repúdio, como Marcelo Lanzarin (PMDB) e Alexandre Caminha (PROS), reafirmaram a rejeição a discussões sobre gênero e orientação sexual nas escolas, mas contemporizaram dizendo respeitar as diferentes formas de família. Bruno Cunha (PSB), que havia votado contra a moção, foi enfático na defesa das diferentes formas de família e da necessidade de discutir o tema nas escolas para evitar problemas como a violência sofrida pela população LBGT. Professor Gilson (PSD) também adotou tom mais ameno e criticou o radicalismo e os extremismos dos dois lados da discussão.
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Ricardo Alba (PP), Almir Vieira (PP), Jovino Cardoso Neto (PSD) e Marcos da Rosa fizeram novamente os discursos mais duros contra as discussões de gênero nas escolas, sempre seguidas de muita reclamação da ala mais à esquerda e de aplausos do lado mais conservador. Alba bradou contra as feministas na tribuna e, no intervalo da sessão, voltou a defender que as escolas não devem promover discussões de gênero, nem mesmo em eventos como o idealizado pela Elza Pacheco, pelo fato de o Plano Municipal de Educação vetar esse tipo de conteúdo. Antes dos ânimos esfriarem na parte final da sessão, a fala de Marcos da Rosa, em que o presidente falou sobre o alto número de cirurgias de mudança de sexo, fez com que ao final da fala tudo terminasse como começou: com gritos de “me representa” de um lado e de “ignorante” no outro extremo do plenário. Muito semelhante ao que tem se resumido o debate político no Brasil.
Ao final da sessão ainda houve tempo para os vereadores aprovarem a criação da Quinzena Municipal da Cuca.

O que dizem os manifestantes
A travesti Luísa do Prado Souto, do coletivo Dama d’ Paus, que comandou a mobilização desta quinta-feira, considerou preconceituosas as falas da sessão de terça-feira. Ela participará do ciclo de palestras organizado pela escola Elza Pacheco que recebeu uma moção de repúdio da Câmara esta semana e diz que estava preparando uma fala sobre um tema que considera fundamental: a inclusão dos trans nas escolas.
– Hoje 35% da população trans abandona a escola, o Brasil é o país que mais mata transsexuais. Esses incomodados com a população trans acham que eles não devem estar na escola – pontuou ela, mencionando a luta que as trans precisam travar contra o estigma do preconceito e da prostituição e deixando claro que não dá palestras para crianças, mas apenas para adolescentes e adultos.
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Marilei Schreiner, do coletivo Batucada Feminista, reforçou o discurso contrário às manifestações dos vereadores na terça.
– Num momento em que as nossas mulheres estão sendo mortas, a Câmara quer impedir a discussão de gênero, que afeta todos nós, inclusive as mulheres – criticou.
O Movimento Brasil Livre (MBL) também levou um grande grupo de manifestantes para firmar posição contra a discussão de gênero nas escolas. Marcelo Mette, coordenador do MBL em Blumenau, defende que não há preconceito, mas apenas um desejo de que a chamada ideologia de gênero não esteja presente nas escolas, em cumprimento ao Plano Municipal de Educação. Sobre o evento na escola Elza Pacheco, ele argumenta que não haveria um debate, mas uma discussão de um lado só.
– Os palestrantes são conhecidos na nossa comunidade como doutrinadores esquerdistas, então não se está propiciando um ambiente para debate. E a gente também tem que observar a faixa etária, e ponderar, não adianta expor coisas muito pesadas para crianças de oito, nove ou 13 anos. Tudo tem o seu momento. Educação sexual começa em casa, a escola tem o seu papel sim, de orientar, mas a primeira abordagem tem que ser em casa – argumenta.
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