O casamento civil de casais homossexuais tem sido barrado por manifestações da 13ª Promotoria de Justiça de Florianópolis. O direito à união legal é garantido por uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) desde 2011 e por uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) desde 2013.

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Apesar disso, o promotor Henrique Limongi, titular da 13ª Promotoria, costuma impugnar as solicitações de casamento civil homoafetivo usando como justificativa a Constituição Federal de 1988.

Um levantamento do portal G1 Santa Catarina, da jornalista Carolina Holland, mostra que entre as promotorias das outras capitais brasileiras e do Distrito Federal, a maioria não diferencia casamentos homoafetivos e heterossexuais.

Segundo o portal G1-SC, somente Florianópolis e São Luis (MA) costumam contestar enlaces de pessoas do mesmo sexo. Os Ministérios Públicos do Acre e de Sergipe não responderam os questionamentos da reportagem.

A 13ª Promotoria de Justiça de Florianópolis tentou barrar 57 habilitações de casamentos homoafetivos entre 2017 e 2019, segundo o G1-SC. Desses, 46 foram somente no ano passado. Os dados são do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) e do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC). Todas as tentativas de impugnação foram recusadas judicialmente.

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O promotor Henrique Limongi é servidor do MPSC desde 1981. A reportagem do portal G1-SC procurou-o para falar sobre o assunto. A assessoria de imprensa enviou uma nota afirmando que o promotor não concede entrevista, que se manifesta somente nos autos, que é "devoto do Estado de Direito" e que a Resolução do CNJ sobre casamentos homoafetivos não poderia se sobrepor à CF/88.

O promotor se refere ao parágrafo 3º do artigo 226 da Constituição Federal, cuja redação é: "Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento".

“No caso em tela, a Carta da República (…) é de solar clareza: no Brasil, casamento somente existe entre homem e mulher. E Resolução – nº 175 do CNJ, que autorizou o enlace entre pessoas do mesmo sexo não pode, jamais, se sobrepor à Lei, notadamente à Lex Maxima. Daí, e somente daí, as impugnações que oferta. Daí os recursos que interpõe", diz a nota.

Contestações do MP-SC adiam união de casais

As manifestações contrárias do MP-SC dificultam o acesso ao casamento civil de casais como o consultor de gestão de pessoas Alexandre Bogas Fraga Gastaldi e o mestrando em Teatro Fabrício Bogas Gastaldi. Os dois precisaram recorrer à Justiça depois de terem a união contestada por recurso do MPSC, que foi contrário ao casamento em Florianópolis.

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Os dois deram entrada ao pedido de casamento em janeiro de 2014. Em maio, após o MP-SC negar o pedido, o juiz julgou o caso e considerou procedente a união matrimonial dos dois. Ainda assim, eles enfrentaram uma batalha nos últimos anos contra as contestações do MP-SC. Somente dois meses atrás do MP-SC retirou a negativa e aceitou o casamento.

Membro da OAB/SC critica postura do promotor

A presidente da Comissão de Direito Homoafetivo e Gênero da Ordem dos Advogados do Brasil em Santa Catarina (OAB/SC), Margareth Hernandes, criticou a conduta do MPSC.

– Isso não ocorre em capital nenhuma, só Florianópolis. É uma vergonha – disse ela, que também é secretária-adjunta da Comissão da Diversidade Sexual e Gênero da OAB Nacional.

A respeito da argumentação do promotor citando a Constituição, a advogada explica que o entendimento do STF sobre o artigo é outro.

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– A norma não é proibitiva, ela deixa uma lacuna de interpretação, fala que casamento é entre homem e mulher, mas não diz que é somente entre homem e mulher. O STF entendeu usando a teoria de Kelsen, quando a norma não proíbe é porque é permitido. E decidiu em cima do princípio da dignidade da pessoa humana – detalhou.

Margareth diz que uma representação contra o promotor já foi aberta em 2013, na Corregedoria do MPSC, mas ela foi indeferida com o argumento de que Limongi atuaria dentro da independência funcional. Agora, a advogada fala que pretende acionar o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

A norma do CNJ sobre o assunto estabelece que juízes e tabeliães ficam proibidos de se recusarem a registrar a união.