Um projeto de lei aprovado pela Assembleia Legislativa em dezembro cria mecanismos de “estabilidade financeira” para servidores do Ministério Público de Santa Catarina (MP-SC) e nivela cargos de nível básico e médio, inchando a folha de pagamento do órgão em aproximadamente R$ 3 milhões ao ano.
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A Procuradoria Geral do Estado (PGE), que analisou a proposta, afirma que a medida quebra o princípio da igualdade entre servidores dos três poderes e recomenda que o governador Raimundo Colombo (PSD) vete o texto. A interlocutores, o chefe do Executivo manifestou-se disposto a vetá-lo. O procurador-geral de Justiça, Lio Marcos Marin, minimiza o impacto:
– A aprovação representaria 1% da folha, que gira em torno de R$ 30 milhões por mês. É um gasto que, pela motivação e envolvimento que proporciona, está dentro das possibilidades financeiras.
Se a proposta virar lei, funcionários aprovados em concurso podem ter adicionados aos salários valores que chegam a 40% do que ganhavam por exercer função comissionada, e 100% caso tenham exercido função gratificada. A justificativa para a chamada “incorporação” é impedir que o servidor tenha uma queda salarial após deixar um cargo de confiança.
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A regra passaria a valer a partir de abril de 1991 – servidores que tenham exercido cargos comissionados ou gratificados durante estes 23 anos teriam acesso às incorporações, mas só a partir dos próximos salários, e não de forma retroativa.
A incorporação só será considerada para quem passou, no mínimo, cinco anos no cargo, e começa a valer a partir do sexto. Ou seja, os cinco primeiros anos não contam para agregar valor ao salário.
Segundo o MP-SC, servidores da Assembleia, do Judiciário e do Tribunal de Contas do Estado já são contemplados pela estabilidade financeira. O projeto também prevê que auxiliares técnicos I e II – cargos de nível básico – alcancem a remuneração de técnicos do MP, cargo de nível médio.
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Para o órgão, os dois cargos já exercem as mesmas funções, mas com discrepâncias salariais. Se for vetado pelo governador, o projeto volta à Assembleia e os deputados podem manter o veto ou derrubá-lo.
“Existe reconhecimento do STF para essa lei”, diz procurador-geral de Justiça (MP-SC)
Autor da proposta encaminhada à Assembleia, Lio Marcos Marin defende que há limites no projeto para não criar supersalários e que o objetivo é garantir uma estabilidade financeira.
Há diferenças entre a legislação antiga (anterior a 1991) e o projeto proposto pelo MP-SC?
Estabelecemos o teto justamente para não se chegar aos “supersalários”. Incorporamos somente uma diferença entre os salários do cargo original e do cargo que ele executa ou já executou. A cada ano – e somente após cinco anos -, ele vai agregando um pouquinho. Tem limites, trata-se unicamente de uma estabilidade financeira.
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Que tipo de limites? Como impedir que servidores voltem ao cargo original recebendo salários muito maiores que os originais?
O servidor não vai simplesmente acumulando valores incorporados ao seu salário, como acontecia antigamente. Ele só recebe o benefício se ficar mais de cinco anos na mesma função, e apenas parte da diferença entre os dois salários. É uma modalidade diferente, e por isso já existe o reconhecimento do STF destas leis como constitucionais.
Há defasagem nos salários dos servidores do MP-SC?
Não. Mas existem funções que exigem mais capacidade, responsabilidade e tempo de dedicação ao serviço, e por isso a remuneração é diferenciada. O que esse projeto estabelece é que o servidor, após passar muito tempo em um cargo de confiança ou comissionado, consiga agregar algum valor ao seu salário original e possa alcançar uma estabilidade. Assim, ele não fica anos exercendo uma função específica só para “perder” esse tempo depois.
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“Entendemos que há inconstitucionalidade”, diz procurador-geral do Estado (Executivo)
Autor do parecer que recomenda o veto da proposta, João dos Passos Martins Neto diz que texto não respeita igualdade entre servidores de diferentes poderes.
Por que a PGE recomenda o veto ao projeto de lei complementar?
Entendemos que há inconstitucionalidade no projeto porque, no texto, há uma quebra do regime único previsto pelo artigo 39 da Constituição Federal. Todos os servidores, de todos os poderes, devem ter o mesmo tratamento.
Mas a Justiça, TCE e Alesc recebem benefícios semelhantes.
Um erro não justifica o outro. Se alguma decisão anterior quebrou a unidade do regime, a PGE deve manter sua coerência. Nosso entendimento nestes outros casos já foi o mesmo – tanto que o parecer ao projeto do MP-SC praticamente reproduz a avaliação que fizemos do benefício pedido pelo Tribunal de Contas do Estado em 2009. Na época, recomendamos o veto e o governador acatou, mas a decisão foi derrubada depois.
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Este projeto contradiz o fim da incorporação de servidores públicos em 1991?
O estatuto dos servidores públicos previa um tratamento único para servidores dos três poderes. Então, quando a agregação de valores ao salário foi extinta da legislação, em 1991, ela acabou para todos ao mesmo tempo. Entretanto, nos últimos anos isso tem sido recriado setorialmente, um órgão de cada vez. A PGE tem entendido que essas ações são inconstitucionais.