Dentro de uma semana deve ser votado, em Comissão Especial da Câmara dos Deputados, um projeto que pode sacudir o meio jurídico brasileiro.
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É a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 37/2011, que autoriza apenas a Polícia Civil e a Polícia Federal a realizarem investigações criminais. Isso significaria, na prática, que o Ministério Público não poderá mais conduzir suas próprias investigações.
A proposta é do deputado Lourival Mendes (PTdoB-MA), delegado da Polícia Civil.
– É um estímulo à impunidade. Se isso passar, não só os promotores deixarão de fazer investigações, mas também o Coaf (órgão do Ministério da Fazenda) e as CPIs terão poderes limitados – diz o presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), César Mattar Jr., promotor público no Pará.
Mattar afirma que a maior parte dos casos em que se discute a legitimidade do MP para investigar envolve crimes praticados por policiais. Um dos exemplos citados é o dos Conselhos das Polícias Civis, que têm atribuição de julgar delitos cometidos por policiais. Uma ação que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) questiona a presença de promotores nesses julgamentos administrativos e, por isso, a cadeira do MP no Conselho do Rio Grande do Sul está vaga desde 2011. O presidente do Conamp acredita que há um movimento nacional para retirar poder dos promotores.
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A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) se alinha a favor do projeto que restringe aos policiais o poder de fazer investigações. Representante da entidade na comissão que analisa a PEC, Edson Smaniotto votou a favor do projeto e disse que hoje o Ministério Público investiga “sem controle superior e com riscos à cidadania”.
– A atividade do MP não tem controle de nenhuma autoridade superior e nem prazo para terminar. O Ministério Público acaba selecionando determinados casos, por repercussão na mídia ou por interesses que ele elege por si só – critica.
Smaniotto argumenta que os advogados podem tentar paralisar uma investigação policial abusiva por meio de habeas corpus. Mas esse e outros instrumentos jurídicos não podem ser usados no caso de uma investigação criminal do MP.
Dois experientes policiais gaúchos apoiam a restrição às investigações feitas pelo MP. O chefe de Polícia, delegado Ranolfo Vieira Junior, diz que a Constituição só autoriza as polícias judiciárias (PF e Civil) a investigar. Ele ressalta, porém, que não costumam ocorrer divergências, quando os promotores gaúchos decidem investigar.
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Posição semelhante tem o delegado aposentado Wilson Müller Rodrigues, presidente da Associação dos Delegados de Polícia (Asdep). Ele acredita que o alvo da PEC, que ele apoia, é interromper algo que se tornou um hábito: promotores requisitando PMs para fazerem investigações e cumprirem mandados judiciais.
– O MP pode requisitar investigações, mas cabe aos policiais civis investigar. Se tiverem dúvidas quanto à investigação de policiais por parte de colegas, que apelem aos chefes deles. Ou ao governador. Mas a prerrogativa é dos policiais civis e federais – conclui Müller.
Próximos passos
– Caso a comissão especial aprove a PEC 37/2011, a proposta será votada no plenário da Câmara dos Deputados (duas vezes) e também no do Senado (duas vezes).
– A aprovação em plenário requer maioria de dois terços.
Promotores x delegados
Casos que colocaram em lados opostos o MP e a Polícia Civil:
PORTO ALEGRE
Em fevereiro de 2010, o então secretário municipal da Saúde, Eliseu Santos, é assassinado a tiro no bairro Floresta. A Polícia Civil concluiu que o caso foi uma tentativa de assalto, mas dois promotores comandaram uma investigação à parte e apontaram homicídio premeditado, encomendado por pessoas prejudicadas em processo licitatório envolvendo a secretaria da Saúde.
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IJUÍ
O Tribunal de Justiça acaba de anular processo criminal contra uma suspeita de tráfico de drogas. O desembargador Nereu Giacomolli entendeu que foi ilegal o pedido do MP para que a BM cumprisse mandado de busca e apreensão em uma residência. Giacomolli mandou liberar a suspeita, por entender que o mandado só poderia ser cumprido pela Polícia Civil. Policiais civis cumpriram novo mandado, e a mulher voltou à prisão.
GRAVATAÍ
Em dezembro de 2011, a BM prendeu sete sete suspeitos de tráfico de drogas. Eles foram detidos durante o cumprimento de 32 mandados de busca e apreensão, expedidos pela Justiça, a pedido do MP. Considerando que houve abuso dos PMs que conduziram os presos para um sítio para identificação antes de levá-los à delegacia, o delegado plantonista Júlio Fernandes Neto decidiu não autuá-los em flagrante. Os suspeitos foram soltos.