Como alternativa no combate à violência contra a mulher, a Delegacia de Proteção a Criança, Adolescente, Mulher e Idoso (DPCAMI) de Joinville elaborou um projeto pioneiro em Santa Catarina. O programa de reflexão para os homens é o primeiro do Estado sendo idealizado por uma delegacia especializada. O projeto consiste em realizar encontros com grupos de homens em que as mulheres já tenham procurado a delegacia e denunciado agressões.

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— Além da investigação dos crimes, a delegacia especializada ainda trabalha com o acolhimento das mulheres que foram vítimas, encaminhamento para assistência jurídica. Agora, temos mais uma alternativa no enfrentamento da violência domestica que é este grupo para os homens — explica a delegada da DPCAMI, Geórgia Bastos.

O projeto consiste em reuniões semanais com grupos de homens. A intenção é promover reflexões sobre as condutas violentas aplicadas as companheiras. Rever estes comportamentos é mais caminho para prevenir futuras agressões, por meio de uma mudança de comportamento, cultura e educação destes e, assim, barrando o ciclo de violência contra as mulheres.

O projeto surgiu em decorrência ao programa “PC por Elas”, lançado pela Polícia Civil em março deste ano, onde grupos de conversas sobre o empoderamento feminino, por exemplo, começaram a ser realizados nas delegacias do Estado. Na Lei Maria da Pena há dois artigos que preveem a criação de centros de educação e de reabilitação para agressores ou ainda o juiz pode determinar, no cumprimento da pena, o comparecimento obrigatório a programas de recuperação.

Ideia surgiu de vivência

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A ideia dos grupos com homens na especializada partiu da experiência vivenciada pela delegada e pela psicóloga policial, Márcia Santos, no acolhimento de vítimas de violência domestica. O dia a dia demonstrou que o atendimento de apenas um lado da dinâmica da violência pode ser insuficiente para prevenir futuras ações. A psicóloga explica que a prática meramente punitiva do Direito Penal e a aplicação de medidas protetivas de urgência não tem sido suficientes para coibir a reincidência desta violência.

De acordo com Márcia, mesmo com estas medidas, as mulheres retornam à delegacia para relatar situações de violência vivenciadas em casa. Com o grupo, a ideia é que este homem reveja suas condutas e deixem de enxergar a mulher como propriedade. A psicóloga ainda explica que a intenção é, com os debates no grupo, eles sejam provocados a refletir sobre as questões de gênero, os direitos da mulher e caminhos para desconstruir a masculinidade agressiva.

— O homem também sofre com essa violência de gênero. Mas ele, sofrendo ou não, ele não pode agredir a mulher ou acreditar que ela é propriedade dele. É preciso, portanto, trabalhar a responsabilização dos seus atos. Hipotetizamos que cuidar deles é proteger futuras vítimas e futuras reincidências — esclarece Márcia.

O projeto já começou em meados de maio, com entrevistas preliminares com os homens que praticaram agressões contra as mulheres. Com essa conversa será possível investigar a ansiedade deste homem, dados sociodemográficos e o histórico de violência contra a mulher. Depois disso, o homem é convidado a participar do grupo que deve ter nove encontros com temas específicos, disparadores de reflexões.

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— Essa reflexão é desde o ciclo de violência até o ensinamento de técnicas especificas para reduzir a agressividade, a identificação do gatilho dessas situações de conflito e dos sinais que antecedem a perda do controle — explica a psicóloga policial.

A mulher em situação de violência é que autoriza a equipe da DPCAMI a ligar para o companheiro e convidá-lo a participar do grupo. O cuidado ocorre porque muitas vítimas procuram a delegacia para relatar as agressões sem o conhecimento do marido, porque elas têm medo que isso gere outra agressão. Apesar do projeto ainda estar em construção aqui em Joinville, a delegada acredita que é um caminho possível no enfrentamento à violência doméstica.

— Nós acreditamos que é um caminho, que vai fazer com que haja algum tipo de tratamento também na vida deste homem. Esse trabalho ainda está em construção, mas a gente entende que é um ponto de partida — conclui a delegada.